Não se aplica o tema 280, do STF, para declarar a nulidade o ato de ingresso de policiais, sem mandado judicial, em prédio comercial fechado ao público (galpão), diante de suspeita plausível de tráfico de drogas. Foi esta a conclusão do Gemam - Grupo de Estudos das Escolas da Magistratura de Mato Grosso (ESMAGIS e EMAM) em estudo de caso sobre tráfico de drogas em domicílio comercial.
Em artigo desenvolvido pelo grupo, concluiu-se que a proteção constitucional reconhecida pelo STF recai sobre casa ou residência domiciliar e não de pontos destinados a atividades comerciais, a exemplo de um galpão, após apreensão expressiva de quantidade de cocaína.
O grupo de estudos é composto pelos magistrados Helícia Vitti Lourenço, Valter Fabrício Simioni Silva e Moacir Rogério Tortato, sob orientação do desembargador Marcos Machado.
Foi utilizado para estudo de caso o julgamento de HC (5001069-18.2022.4.02.0000) realizado pelo TRF da 2ª região, o qual tratou de apreensão de entorpecentes em galpão. No caso, foi concedida parcialmente a ordem para declarar ilegais a apreensão realizada no galpão e a prisão em flagrante dos pacientes, com a revogação da prisão preventiva e a determinação que o juízo de 1º grau se pronuncie sobre o reconhecimento de demais provas ilícitas por derivação.
O estudo tratou sobre a inviolabilidade do domicílio protegida pela CF/88 e a colisão interpretativa entre o precedente jurisprudencial invocado pelo STF no tema 280. Observe-se o que disposto na Constituição:
Art. 5º, XI: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Segundo os juízes, essa inviolabilidade foi ampliada pela jurisprudência do STF para alcançar não apenas a proteção da moradia, "mas de 'qualquer compartimento habitado e privado não aberto ao público onde alguém exerça profissão ou outra atividade pessoal lícita', tais como consultórios médicos, escritórios profissionais, dentre o gênero".
Na hipótese d tráfico de drogas, a Suprema Corte desenvolveu a proteção constitucional em casos de flagrantes no interior da residência, para exigir coexistência de fundadas razões que justifiquem o ingresso por agentes policiais e, consequentemente, a validade dos atos ou diligências realizadas.
O tema 280 do STF diz o seguinte:
"A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados."
De acordo com o estudo, o depósito de quantidade de entorpecente, para fins de mercancia, num espaço de "fachada" não está sob o amparo constitucional da inviolabilidade do domicilio comercial. Já em casos de ingresso policial em locais cujas circunstâncias exigem ação repreensiva, há de se ponderar a "limitabilidade" dos direitos fundamentais em conflito. No caso, caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito prevalecerá. "É este o ponto elementar a ser analisado".
“Não é, pois, de todo impensável que o Estado possa intervir mitigando o direito fundamental do infrator, a fim de preservar direitos fundamentais daqueles que obedecem ao ordenamento jurídico, atentando para a necessária relação de proporcionalidade entre a força da intervenção estatal e a intensidade com a qual a afronta criminosa investia contra os direitos fundamentais dos cidadãos."
Para o grupo, considerando o fato descrito no julgamento em estudo, não se visualiza aplicável o tema 280 do STF para declarar a nulidade do ato de ingresso de agentes policiais sem mandado em prédio comercial fechado ao público diante de suspeita plausível de tráfico de drogas, visto que a proteção constitucional reconhecida pelo STF "recai sobre casa ou residência" e não de pontos destinados a atividades comerciais, a exemplo de um galpão, após a apreensão de expressiva quantidade de cocaína, com alta precificação econômica.