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STJ: Gravadora não terá de devolver originais de João Gilberto

O Tribunal manteve decisão do TJ/RJ e considerou que as gravações foram entregues pelo artista à gravadora por meio de contrato válido.

9/3/2022

A 3ª turma do STJ, por unanimidade, negou o pedido do espólio do músico João Gilberto para que a gravadora EMI devolvesse aos herdeiros os masters originais de suas canções. O colegiado manteve decisão do TJ/RJ.

Para a Corte, as gravações foram entregues pelo artista à gravadora por meio de contrato válido. Além disso, a turma considerou que a EMI ainda tem o direito contratual de produzir novos discos de vinil (LPs) com as canções originais, já que decisões anteriores do próprio STJ apenas impediram a gravadora de reproduzir as obras de João Gilberto em outros formatos não previstos em contrato, como CDs.

STJ: Gravadora não terá de devolver originais de João Gilberto.(Imagem: João Wainer | Folhapress)

A discussão teve origem em 1997, quando João Gilberto (falecido em 2019) moveu ação contra a EMI. O processo foi analisado em recurso especial pelo STJ, que reconheceu o direito do artista à indenização por danos morais, em razão da remasterização não autorizada de músicas em CDs.

Na fase de cumprimento de sentença, questionou-se a decisão firmada no recurso especial, se também teria vedado a reprodução e a venda da obra musical de João Gilberto pela EMI. A questão chegou novamente ao STJ, que confirmou essa vedação.

TJ/RJ garantiu o acesso aos fonogramas, mas não a devolução das mídias

Em 2013, João Gilberto moveu nova ação contra a EMI, buscando a extinção dos contratos celebrados com a gravadora e a devolução das fitas masters de vários LPs, entre eles “Chega de Saudade” e “O Amor”, o “Sorriso e a Flor”. De forma subsidiária, ele pleiteou o acesso irrestrito às matrizes de seu repertório original.

Após sentença de improcedência do pedido, o TJ/RJ deu provimento à apelação para garantir ao artista apenas o acesso aos fonogramas originais, mas sem a sua devolução definitiva. Para a Corte estadual, permaneceriam válidos os contratos celebrados entre as partes na década de 1960, de modo que a EMI poderia continuar reproduzindo e comercializando a obra do artista em vinil – estando vedada, exclusivamente, a remasterizarão das canções e a comercialização em formatos não previstos nos contratos.

Em recurso especial, o compositor (e, posteriormente, o espólio) alegou que, nos termos da lei 9.610/98, o direito do artista não alcançaria apenas a dimensão imaterial de sua obra, mas, igualmente, o suporte físico em que ela foi gravada. Também foi apontada suposta ofensa à coisa julgada formada no STJ.

Memória

O ministro Moura Ribeiro, relator do recurso, reforçou que, nas decisões anteriores, o STJ apenas proibiu a confecção de novos CDs contendo a obra remasterizada sem autorização. Em consequência, explicou, não foi estabelecido obstáculo à fabricação e comercialização de LPs com as canções originais do artista.

Ainda segundo o magistrado, a obra de João Gilberto, por estar vinculada à identidade e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, constitui um verdadeiro patrimônio cultural do país, enquadrando-se no conceito de direito coletivo.

"O direito moral do autor, intangível e imprescritível, não pode suplantar o direito da sociedade de usufruir das manifestações das culturas populares tão caras a qualquer nação. Triste a cultura mundial se não pudesse desfrutar das obras de Mozart, Bach ou Villa-Lobos, gênios, qualificação em que também se insere o nome de João Gilberto."

Masters não pertencem, necessariamente, ao autor das obras musicais

Em seu voto, Moura Ribeiro apresentou uma evolução histórica dos dispositivos físicos de gravação, chegando à conclusão de que os masters, ao concretizarem um registro sonoro em meio físico, se constituem como um fonograma.

Entretanto, o ministro apontou que, considerando as caraterísticas de produção e extração de cópias a partir da matriz física; ou seja, uma forma de apresentação do fonograma, não seria razoável afirmar que ele pertence, necessariamente, ao autor da obra musical.

Nesse sentido, o magistrado entendeu que não há fundamento jurídico para afirmar que os direitos morais do autor teriam a capacidade de garantir a posse e a propriedade do meio físico no qual foi gravada a criação imaterial.

"Se o compositor/intérprete de uma canção não pode reivindicar a posse/propriedade de um vinil já comercializado com fundamento em uma suposta transmutação operada pelo direito moral de autor, tampouco pode fazê-lo em relação aos masters, uma vez que estes são apenas uma forma diferenciada de apresentação do mesmo fonograma."

Informações: STJ.

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