Migalhas Quentes

O CPP traz a marca da desatualização? Especialistas respondem

Ao Migalhas, operadores do Direito avaliam que a lei, em vários aspectos, está em descompasso com as necessidades contemporâneas da sociedade brasileira.

2/2/2022

Considerado por muitos como uma norma ultrapassada, o Código de Processo Penal, de 1941, pode estar com seus dias contados. Com efeito, tramita na Câmara dos Deputados, o PL 8.045/10, mais conhecido como novo CPP. O projeto de lei propõe inúmeras mudanças, tais como, ritos processuais e recursos dentro do processo penal. 

Migalhas conversou com especialistas que discorerram acerca das mudanças que a proposta pode trazer, bem como analisaram como o Código se apresenta diante da sociedade atual após oito longas décadas.

Especialistas analisam os 80 anos do CPP.(Imagem: Tenor)

A necessidade de atualização do CPP já foi assunto no STJ quando, em 2020, o ministro Rogerio Schietti, ao proferir um voto, afirmou que o Código, que já tem 80 anos, "deveria ter sido compulsoriamente aposentado, mas está aí, ainda que com algumas atualizações, regendo o nosso sistema jurídico criminal".

Concordando com a fala do ministro Schietti, o promotor de Justiça, Paulo César Corrêa Borges, de Franca/SP, analisou a longevidade da norma afirmando que o referido Código "traz a marca da desatualização”.

"Depois de ter passado por quatro sucessivos e distintos regimes constitucionais, tendo sofrido inúmeras alterações a pretexto de atualização, que foram apenas pontuais e insuficientes, o CPP de 1941 traz a marca da desatualização"

No mesmo sentido, a advogada Paloma Gurgel de Oliveira Cerqueira Bandeira, especialista em Direito Criminal e sócia do escritório Paloma Gurgel Sociedade Individual de Advocacia, reiterou a desatualização da norma sustentando que se tivesse que resumir o CPP/41 em uma palavra, seria: “ultrapassado”.

"Há claramente um conflito de posicionamentos entre aquela que deveria ser o guia do ordenamento jurídico – a Constituição – e aquele que dita às regras do jogo – o processo penal."

Tribunal do Júri

Uma das alterações que a proposta apresenta é acerca do Tribunal do Júri. No Código atual é expresso que dentro do rito deve ser mantida a incomunicabilidade dos jurados. A advogada Paloma Bandeira explica que o projeto muda essa regra e propõe aos jurados romperem a incomunicabilidade. “No Tribunal do Júri, passa a ser permitida a comunicação entre os jurados, salvo durante a instrução e os debates”, destacou a especialista. 

O trecho sobre o tema ficará assim, se aprovado:

Art. 398 "Não havendo dúvida a ser esclarecida, os jurados deverão se reunir reservadamento em sala especial, por até uma hora, a fim de deliberarem sobre a votação." 

Embargos de declaração

Outra alteração que merece destaque é referente aos embargos de declaração. O CPP estabelece que o recurso deve ser oposto no prazo de dois dias contados da sua publicação, quando houver na sentença ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. O texto apresentado no PL traz mudanças relevantes referente a esse tema, uma vez que, diferentemente do Código atual, limita o recurso a uma única vez no prazo de cinco dias. 

A especialista Paloma avalia essa alteração como a mais drástica da proposta. “Considero que tal regramento, como se encontra, fere o direito de ação constitucionalmente assegurado, uma vez que limita injustificadamente a interposição de medidas processuais cabíveis", relatou a especialista. 

Tramitação

PL 8.045 foi criado em 2010, mas apenas 6 anos depois foi constituída uma "Comissão Especial" para análise da proposta que tramita na Câmara dos Deputados. A Comissão, todavia, foi extinta pelo presidente Arthur Lira em junho de 2021 e atualmente, o projeto aguarda a criação de Comissão Temporária pela MESA. 

O promotor Paulo Borges sustentou que, neste momento, é quase impossível prever quais mudanças ocorrerão no curso do rito processual. Ele esclarece que, tendo em vista que as inúmeras alterações incorporadas na Câmara dos Deputados, tornará obrigatória a volta do projeto ao Senado Federal.

“Pode-se ter claro que ainda levará tempo a aprovação definitiva do novo CPP e, por isso, não se pode afirmar quais serão as mudanças, apenas que o CPP/41 chegou na fase consensual de que precisa ser substituído”, concluiu o especialista. 

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