O STF irá decidir se o Estado é obrigado a informar ao preso o direito ao silêncio no momento da abordagem policial, e não somente no interrogatório formal, sob pena de ilicitude da prova, considerados os princípios da não auto-incriminação e do devido processo legal. A matéria, que será julgada no RE 1.177.984, teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.185), em votação unânime realizada no plenário virtual.
O recurso foi interposto por um casal preso em flagrante por policiais militares que encontraram, em sua residência, uma pistola e uma espingarda e munições (cartuchos e diversos projéteis) com registros vencidos.
Durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido pela vara Criminal da comarca de Brodowski/SP, a acusada, ao ser indagada por um dos policiais, teria admitido, de forma voluntária e informal, a posse da pistola encontrada em seu quarto, o que poderia configurar a confissão da prática do delito de posse ilegal de arma de fogo (art. 12 do Estatuto do Desarmamento – lei 10.826/03) ou ser considerado como elemento de prova testemunhal.
Confissão informal
No recurso, o casal questiona decisão do TJ/SP que entendeu que, no momento da abordagem, os policiais não são obrigados a advertir os acusados em relação ao direito de permanecerem calados. Segundo os advogados, a confissão informal de sua cliente foi realizada no momento da prisão em flagrante, durante a abordagem policial, e sem a necessária advertência prévia do direito constitucional ao silêncio, contrariando o art. 5°, inciso LXIII, da CF/88. Eles sustentam que a advertência deve ser realizada não apenas antes do interrogatório formal do indiciado ou acusado, mas também em eventual interrogatório informal por policiais militares ainda no momento da abordagem e da voz de prisão em flagrante.
Jurisprudência e Constituição
Em artigo publicado no Estadão, os advogados Alberto Zacharias Toron e Renato Marques Martins ponderaram algumas observações sobre o tema.
Os juristas discorreram sobre o caso “Miranda versus Arizona” que ocorreu em 1966 quando a Suprema Corte Americana absolveu o acusado que havia sido condenado com base em confissão obtida sem que tivesse sido informado de seu direito a ser assistido por um advogado e permanecer em silêncio.
Os advogados recordam que a partir desse fato consolidou-se nos EUA o dever de os agentes policiais, no ato da prisão, comunicar ao acusado sobre o seu direito de não responder e de ser assistido por um defensor, bem como o de que tudo que disser poderá ser usado contra si.
Toron e Martins sustentaram que no Brasil, apesar de importantes ensinamentos doutrinários, a jurisprudência vem, embora com oscilações, reconhecendo inexistir o dever de o policial, no momento do flagrante, ou da realização a operação, ou mesmo na sequência desta, quando se leva alguém para a delegacia, de se avisar ao investigado seu direito ao silêncio.
Para os juristas, apesar do posicionamento jurisprudencial citado, a Constituição é clara no que se refere ao direito do preso, e não apenas o interrogado formalmente, em ser informado sobre seu direito ao silêncio.
“Será um grande passo na afirmação dos direitos individuais e na contenção dos agentes estatais incumbidos da repressão ao crime se o STF afirmar a obrigatoriedade do ‘Aviso de Miranda’ no ato da prisão e não só no interrogatório formal. A verdade não pode ser obtida a qualquer custo; ela é formalizada e deve obedecer às garantias constitucionais.”, concluíram os juristas Toron e Martins.
- Processo: RE 1.177.984
Informações: STF.