A 4ª turma do STJ considerou que não há juízo de retratação em decisão que condenou a Globo por danos morais devido a documentário exibido no Linha Direta sobre a Chacina da Candelária. Os ministros consideraram que o caso se enquadra na segunda parte da tese do STF, de que eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso.
Em 1993, perto da igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, oito jovens moradores de rua foram assassinados. Em 2006, o programa Linha Direta – Justiça, da TV Globo, apresentou um documentário sobre o caso e expôs o nome e a imagem do serralheiro, que ajuizou ação indenizatória. O STJ manteve a condenação da emissora a pagar R$ 50 mil como reparação pela ofensa à sua dignidade.
A Globo recorre da decisão alegando que apresentou apenas fatos e que o programa mostrou inclusive que o autor da ação foi absolvido. Foi acolhida a tese de que o autor teria "direito ao esquecimento", que sobrepujaria o direito de informar da emissora.
Após a definição do STF pelo Tema 786, que concluiu que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal, a Globo recorre novamente para que seja realizado juízo de retratação.
Situação abusiva
Em seu voto, o ministro Luis Felipe Salomão reafirmou a conclusão de que o revolvimento de acontecimentos que abalaram a honra e a convivência social do autor da ação representam uma situação abusiva e violadora de seus direitos fundamentais.
"Permitir nova veiculação do fato, com a indicação precisa do nome e imagem do autor, significaria a permissão de uma segunda ofensa à sua dignidade, só porque a primeira já ocorrera no passado, uma vez que, além do crime em si, o inquérito policial consubstanciou uma reconhecida vergonha nacional à parte", declarou o relator, relembrando seu voto no julgamento original.
De acordo com Salomão, o acórdão não está em choque com o Tema 786 do STF, pois não guarda relação com essa primeira parte do que foi decidido na repercussão geral, em relação ao direito ao esquecimento, mas sim com a segunda parte da tese:
"Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e das expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível."
Salomão concluiu que não há motivo para se falar em retratação, pois, no julgamento de 2013, a 4ª turma constatou justamente a situação abusiva a que se referiu o STF.
Os ministros Isabel Gallotti, Antonio Carlos e Marco Buzzi seguiram o relator.
Divergência
Ao proferir voto nesta terça-feira, o ministro Ral Araujo, considerou que não houve nenhum excesso. Ao contrário, foi reconhecido pelas instâncias ordinárias não haver abuso do direito, bem como que a recorrente não faltou com a verdade ao narrar os fatos, nem se reportou ao recorrido de maneira desrespeitosa.
“O próprio recorrido afirmou que a causa de pedir consiste apenas na veiculação dos fatos ocorrido sem sua autorização, com graves consequências para sua pessoa, tendo sido até ameaçado de morte.”
Para Raul, a decisão deu maior peso ao direito a imagem e vida privada em detrimento à liberdade de expressão.
Diante disso, deu provimento ao recurso especial, a fim de julgar improcedente o pedido e exercer a retratação.
- Processo: REsp 1.334.097