Migalhas Quentes

STF derruba honorários de sucumbência em caso de justiça gratuita

A Corte julgou um dos pontos mais polêmicos da reforma trabalhista sob o entendimento de que é inconstitucional obstaculizar o acesso à Justiça do Trabalho pelos hipossuficientes.

20/10/2021

Nesta quarta-feira, 20, o plenário do STF decidiu que são inconstitucionais dispositivos da reforma trabalhista, que fixam o pagamento de honorários periciais e sucumbenciais pela parte derrotada, mesmo que ela seja beneficiária da justiça gratuita.

O colegiado, no entanto, manteve a validade do pagamento de custas pelo beneficiário que faltar injustificadamente à audiência inicial.

A foto mostra um homem segurando uma CTPS. (Imagem: Eduardo Matysiak | Futura Press | Folhapress)

A ação foi proposta em 2017 pelo então PGR Rodrigo Janot contra as alterações que a reforma trabalhista trouxe. A PGR impugnou os seguintes aspectos:

Leia abaixo os dispositivos impugnados:

"Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.

§ 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo." (NR)

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% ([...]) e o máximo de 15% ([...]) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. [...]

§ 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

Art. 844.

§2º Na hipótese de ausência do reclamante, este será condenado ao pagamento das custas calculadas na forma do art. 789 desta Consolidação, ainda que beneficiário da justiça gratuita, salvo se comprovar, no prazo de quinze dias, que a ausência ocorreu por motivo legalmente justificável."

No entendimento da Procuradoria, as alterações impõem "restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, na Justiça do Trabalho".

Em 2018, o caso começou a ser julgado pelo plenário. Naquela oportunidade, o ministro Luís Roberto Barroso, relator, entendeu que não há desproporcionalidade nas regras questionadas, uma vez que a limitação tem como objetivo restringir a judicialização excessiva das relações de trabalho.

Barroso explicou que essa "sobreutilização" do Judiciário leva à piora dos serviços prestados pela Justiça e prejudica os próprios empregados, dado que a morosidade incentiva os maus empregadores a faltarem com suas obrigações, buscando acordos favoráveis no futuro. "O Estado tem o poder e dever de administrar o nível de litigância para que permaneça em níveis razoáveis", afirmou.

O relator, então, fixou seu entendimento nas seguintes teses:

1. O direito à gratuidade de justiça pode ser regulado de forma a desincentivar a litigância abusiva, inclusive por meio da cobrança de custas e de honorários a seus beneficiários.

2. A cobrança de honorários sucumbenciais do hipossuficiente poderá incidir: (i) sobre verbas não alimentares, a exemplo de indenizações por danos morais, em sua integralidade; e (ii) sobre o percentual de até 30% do valor que exceder ao teto do Regime Geral de Previdência Social, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias.

3. É legítima a cobrança de custas judiciais, em razão da ausência do reclamante à audiência, mediante prévia intimação pessoal para que tenha a oportunidade de justificar o não comparecimento.

Os ministros Luiz FuxNunes Marques e Gilmar Mendes acompanharam o entendimento do relator na tarde de hoje. 

Edson Fachin, por outro lado, votou no sentido de julgar a ação totalmente procedente e, por consequência, declarar as alterações inconstitucionais

O ministro sustentou que os dispositivos questionados mitigaram o direito fundamental à assistência judicial gratuita e o direito fundamental ao acesso à Justiça. Para Fachin, as restrições impostas trazem como consequência o esvaziamento do interesse dos trabalhadores em demandar na Justiça do Trabalho, tendo em vista a pouca perspectiva de retorno. 

“Mesmo que os interesses contrapostos a justificar as restrições impostas pela legislação impugnada sejam assegurar um maior compromisso com a litigância para a defesa dos direitos sociais trabalhistas, verifica-se, a partir de tais restrições, uma possibilidade de negar-se direitos fundamentais dos trabalhadores."

Este entendimento foi seguido pelo ministro Lewandowski e pela ministra Rosa Weber.

Para Alexandre de Moraes, não são razoáveis e, por isso, são inconstitucionais, os arts. 790-B, e § 4º, e 791-A, § 4º (sobre a responsabilidade dos honorários periciais e sucumbenciais pela parte vencida).

Para o ministro, não é porque a parte ganhou algum outro processo que ela se torna autossuficiente. “Simplesmente entender que, por ser vencedor em um outro processo, já o tornou autossuficiente, seria uma presunção absoluta da lei, que fere a razoabilidade", asseverou.

Alexandre de Moraes afirmou que a reforma trabalhista, nestes aspectos, estipulou restrições inconstitucionais. “[a parte] Comprovou a insuficiência de recursos, foi tida como hipossuficiente, obteve a gratuidade, mas, mesmo assim, vai ter que pagar?!”, questionou o ministro.

Porém, o ministro entendeu ser razoável e constitucional o dispositivo do 844, §2º (aquele que impõe o pagamento de custas pelo beneficiário que faltar injustificadamente à audiência inicial). 

A ministra Cármen Lúcia e o ministro Dias Toffoli acompanharam tal entendimento. 

Resumo do julgamento

A favor: Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Nunes Marques e Gilmar Mendes

Contra: Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.

A favor: Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Nunes Marques e Gilmar Mendes

Contra: Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.

A favor: Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Nunes Marques e Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.

Contra: Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. 

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Leia mais

Migalhas Quentes

Toffoli: Justiça do Trabalho é, infelizmente, necessária

20/10/2021
Migalhas Quentes

Fux vota por limitar gratuidade de justiça em causas trabalhistas

14/10/2021
Migalhas Quentes

Barroso mantém regra da reforma trabalhista; Fachin diverge e Fux pede vista

10/5/2018

Notícias Mais Lidas

“Que merda de diferença faz?”, diz juíza a advogada em audiência

29/8/2024

Elon Musk responde intimação do STF e critica Moraes: "quebrou leis"

29/8/2024

Advogado de 25 anos é morto a tiros em Taubaté, interior de SP

29/8/2024

A mando de Moraes, STF intima Elon Musk em post no "X"

28/8/2024

Memes: Internet reage à intimação de Moraes a Elon Musk no "X"

29/8/2024

Artigos Mais Lidos

Consensualismo e Dispute Boards: O que a experiência recente da ANTT pode sinalizar de tendência para o futuro?

29/8/2024

A reforma tributária e a extinção do PIS/Cofins - Quais os pontos de atenção até 2026?

29/8/2024

Por que o seguro de vida não é a melhor opção para a sucessão: Análise comparativa com a holding familiar

30/8/2024

Condomínio urbano simples – Adequação social – Essencial direito fundamental de moradia contemporânea – A luz da legalidade

30/8/2024

Estrutura de formação dos cálculos trabalhistas

29/8/2024