Os ministros do STF começaram a julgar leis do Mato Grosso que criaram cadastros estaduais contendo nomes de pessoas suspeitas, indiciadas ou já condenadas por pedofilia e por crimes de violência contra a mulher.
Até o momento do pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, o relator, ministro Alexandre de Moraes, proferiu voto no sentido de manter as leis. Já o ministro Barroso divergiu possibilitando a divulgação do cadastro instituído pela referida lei tão somente em relação às pessoas cuja condenação tenha transitado em julgado.
Cadastro de pessoas
As leis 10.315/15 e 10.915/19 criam cadastros estaduais contendo nomes de pessoas suspeitas, indiciadas ou já condenadas por pedofilia e por crimes de violência contra a mulher.
A disponibilização das informações constantes nos cadastros fica restrita aos órgãos públicos, a critério da secretaria estadual em seu sítio eletrônico, até que sobrevenha a condenação penal dos réus, no caso dos crimes contra crianças e adolescentes, ou o trânsito em julgado da sentença condenatória, na hipótese de violência de gênero, momento em que o acesso passa a ser aberto ao público geral.
Segundo o governador do Estado, Mauro Mendes, as normas estaduais criam um efeito da condenação criminal, além dos já previstos no Código Penal e em outras leis criminais.
O governador alegou que somente lei Federal, aprovada pelo Congresso, com sanção do presidente da República, pode dispor sobre matéria penal. Segundo ele, as leis estaduais, de iniciativa parlamentar, ao imporem à Secretaria de Segurança Pública a criação das listas, também afrontam a competência privativa do chefe do Executivo local de propor leis ou emendas constitucionais que disponham sobre criação e atribuições de órgãos e entidades da administração pública estadual.
Mendes sustentou, ainda, que a veiculação de fotos, dados pessoais e processuais dessa pessoa na internet viola a função ressocializadora da pena, a dignidade da pessoa humana e o direito à imagem, à honra e à intimidade dos condenados.
Segurança pública
O relator, ministro Alexandre de Moraes, analisou que as leis impugnadas buscam atender às condições e circunstâncias locais, na medida em que instituem cadastros consultivos como instrumentos para lidar com formas de criminalidade crescentes no Estado, com o objetivo de contribuir para uma maior eficiência no enfrentamento desses crimes.
“Inegavelmente, busca dar maior respaldo aos direitos dos cidadãos locais à segurança pública, vida e proteção às mulheres, crianças e adolescentes. Os cadastros instituídos pelas leis impugnadas, fornece à sociedade mato-grossense a possibilidade de monitoramento desses dados e, até mesmo, uma medida apta a contribuir para a prevenção de novos delitos de violência de gênero e infantil.”
Para o ministro, não cabe falar em violação aos direitos e garantias individuais sem sopesar a importância de aspectos igualmente caros à sociedade e que devem ser assegurados pelo Estado.
“Ainda, não é demasia ressaltar que o acesso público aos cadastros previstos nos diplomas legais somente fica autorizado após a condenação penal, sendo que, no caso específico dos crimes de violência contra a mulher ou sua dignidade sexual, apenas quando essa condenação tiver transitado em julgado. Antes desses marcos temporais, a disponibilização dos dados fica restrita apenas aos órgãos e autoridades públicas.”
O ministro ainda observou que a manutenção do nome do réu nos cadastros em referência tem prazo final delimitado, qual seja, até o cumprimento e extinção da pena, contribuindo para a razoabilidade da medida, sem que acarrete em efeitos permanentes que pudessem comprometer a ressocialização do condenado.
Diante disso, julgou improcedente o pedido.
- Veja a íntegra do voto.
Em seu voto divergente, Barroso ressaltou que a divulgação como dispõe o art. 4º, inciso I, lei 10.315/15, da identificação e foto dos condenados pelos crimes, sem que tenha havido o trânsito em julgado, pode trazer consequências deletérias irreparáveis àquele que venha a ter uma condenação revertida em grau recursal.
“Por essa razão, entendo que o referido dispositivo deva receber uma leitura constitucionalmente adequada. Destaco que o entendimento aqui exposto não impede a utilização dos dados pelos órgãos de segurança pública, em momento anterior ao trânsito em julgado, para fins investigatórios.”
Assim, votou pela parcial procedência do pedido, para conferir ao art. 4º, inciso I, da lei 10.315/15, do Estado de Mato Grosso, interpretação conforme a Constituição Federal, possibilitando a divulgação do cadastro instituído pela referida lei tão somente em relação às pessoas cuja condenação tenha transitado em julgado.
- Acesse o voto do ministro Luís Roberto Barroso.
Os demais ministros não proferiram voto. O caso estava em plenário virtual, e foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
- Processo: ADIn 6.620