Migalhas Quentes

Entrevista Exclusiva – Machado de Assis fala da atual situação do país

Num onírico encontro entre o imortal fundador da ABL e a redação de Migalhas, vários temas foram abordados, como a política, voto impresso, pandemia, etc.

5/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Entre as mais nobres presenças que já tivemos a honra de receber na redação deste nosso vibrante matutino, a de hoje foi ainda mais especial. Com efeito, foi com alegria e júbilo que recebemos nesta madrugada ninguém menos do que o imortal Machado de Assis.

Na entrevista exclusiva que nos concedeu, o Bruxo do Cosme Velho não se esquivou de temas polêmicos como atual política e as agressões do presidente da República. Com sua inerente ironia, respondeu as perguntas com seu estilo enigmático. 

Veja abaixo como foi nossa conversa. 

Migalhas – Escritor, obrigado por vir ao portentoso edifício sede deste nosso poderoso rotativo. Seja bem-vindo.

Machado de Assis – “A imprensa é uma grande invenção.”

Migalhas – Você deve estar acompanhando esse imbróglio entre o presidente da República e o ministro Barroso. Que situação difícil, não acha?

Machado de Assis – “Quem pode impedir que o povo queira ser mal governado? É um direito anterior e superior a todas as leis.”

Migalhas – Esse jeito do presidente, é muito estranho.

Machado de Assis – “Ninguém ignora que os doidos gesticulam muito.”

Migalhas – Você está querendo dizer que ele...

Machado de Assis – “Não se explica o que é de sua natureza evidente.”

Migalhas – Mas e a família participando desse jeito do governo?

Machado de Assis – “A loucura entra em todas as casas.”

Migalhas – Como você acha que o Judiciário deve reagir?

Machado de Assis – “Ninguém discute com homem doido.”

Migalhas – Quem diria, quando o povo via os olhos azuis dele não imaginava o que poderia vir.

Machado de Assis – “A cor dos olhos não vale nada, a questão é a expressão deles. Podem ser azuis como o céu e pérfidos como o mar.”

Migalhas – De fato, é estranha a idolatria dele a torturadores. Isso era um sinal.

Machado de Assis – “Pode-se avaliar um homem pelas suas simpatias históricas; tu serás mais ou menos da família dos personagens que amares deveras.”

Migalhas – Azar o nosso passarmos por uma pandemia com um governo desse jeito.

Machado de Assis – “Há dessas ironias do acaso, que dão vontade de destruir o universo.”

Migalhas – Onde será que ele quer chegar com esse confronto entre os poderes?

Machado de Assis – “A causa secreta de um ato escapa muita vez a olhos agudos.”

Migalhas – O que você acha de o presidente ficar citando provérbios bíblicos?

Machado de Assis – “Jesus Cristo não distribui os governos deste mundo. O povo é que os entrega a quem merece, por meio de cédulas fechadas, metidas dentro de uma urna de madeira, contadas, abertas, lidas, somadas e multiplicadas.”

Migalhas – Opa! Então você é a favor do voto impresso? É contra as urnas eletrônicas?

Machado de Assis – “Negar o progresso, que heresia!”

Migalhas – Ah, que susto. E esse semipresidencialismo que voltou à pauta, e que seria uma espécie de parlamentarismo?

Machado de Assis – “Sistema parlamentar, composto às pressas, pode ficar um sistema para lamentar.”

Migalhas – Você é contra?

Machado de Assis – “Há coisas que se não dizem.”

Migalhas – Mas muita gente está pensando nisso.

Machado de Assis – “Um ódio comum é o que mais liga duas pessoas.”

Migalhas – E o que você acha da política?

Machado de Assis – “Contados os males e os bens da política, os bens ainda são superiores.”

Migalhas – Mas voltando às investidas presidenciais contra o TSE, o que devemos fazer?

Machado de Assis – “Nem todos os problemas valem cinco minutos de atenção.”

Migalhas – Quem vai presidir as próximas eleições será o ministro Alexandre de Moraes. O que acha?

Machado de Assis – “Não se fazem Alexandres na conquista de praças desarmadas.”

Migalhas – Não entendemos o exemplo.

Machado de Assis – “Os exemplos não se fizeram senão para ser citados.”

Migalhas – Deixa ver se entendemos, você acha que pode haver algum confronto?

Machado de Assis – “Não é em terra que se fazem os marinheiros, mas no oceano, encarando a tempestade.”

Migalhas – Mas o presidente ainda tem seguidores.

Machado de Assis – “Ninguém, por ato próprio, se amarra a um cadáver.”

Migalhas – Você fala figurativamente, é claro. Mas quem sabe o presidente perceba que está caminhando para sua morte política e mude o rumo.

Machado de Assis – “É duro dizer a um homem que todas as suas esperanças são vãs.”

Migalhas – E ainda temos a questão da covid-19, que assusta muito.

Machado de Assis – “Felizes os que podem respirar! bem-aventurados os que não tossem!”

Migalhas – Pois é. Pelo menos estes dias estamos nos divertindo com os jogos olímpicos.

Machado de Assis – “Os dias passam, e os meses, e os anos, e as situações políticas, e as gerações e os sentimentos, e as ideias. Cada olimpíada traz nas mãos uma nova andaina do tempo.”

Migalhas – Vamos terminando, agradecidos pela presença. Por fim, qual é nosso futuro?

Machado de Assis – “Quando uma Constituição livre pôs nas mãos de um povo o seu destino, força é que este povo caminhe para o futuro com as bandeiras do progresso desfraldadas.”

Migalhas – Uma palavra final aos migalheiros.

Machado de Assis – “Sempre há de triunfar a vida inteligente. Basta que se trabalhe sem trégua.”

Obs. Todas as “respostas” machadianas acima são aforismos de autoria do próprio escritor, retirados de sua obra, ipsis litteris. Eles poderão ser encontrados, juntamente com outras duas milhares de frases do imortal, na nova versão (revista e atualizada) das Migalhas de Machado de Assis, agora em dois volumes, as quais serão em breve lançadas. 

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