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Ninho do Urubu: Juiz indaga se é “suspeito” por decidir contra o MP

O Ministério Público arguiu “suspeição condicional” do juiz, que indagou se seria suspeito quando decide contra o MP, mas não quando decide a seu favor.

17/6/2021

No caso do incêndio no Ninho do Urubu, o Ministério Público suscitou a suspeição do juiz Marcos Augusto Ramos Peixoto, da 37ª vara Criminal da Comarca da Capital/RJ, após o magistrado reconsiderar o recebimento da denúncia quanto a dois réus. O magistrado não aceitou a suspeição arguida e rebateu o parquet: “Então, o juiz é ‘suspeito’ quando decide contra o Ministério Público, mas não quando decide a seu favor?”

(Imagem: Pexels)

O Ministério Público arguiu “suspeição condicional” do juiz, ressaltando que ao reconsiderar o recebimento da denúncia quanto a dois réus, teria avançado no mérito das questões levadas ao feito na fase preambular, pelo que estaria suspeito para dar sequência ao julgamento, acaso reformada pelo Tribunal a decisão quanto a estes dois réus.

O magistrado iniciou a decisão lamentando “profundamente a violação ao dever de urbanidade que deve(ria) imperar entre os atores do processo”. Para o juiz, tem se mostrado recorrente dentre alguns poucos membros do Ministério Público, que abandonem a argumentação para passar às ofensas.

Segundo o juiz, se suspeição houvesse, já haveria desde aquele momento e não no futuro, se e quando provido o recurso ministerial. Para o magistrado, “suspeição” não é algo a ser analisado se e quando for da conveniência de apenas uma das partes: ou existe ou não existe, independentemente do destino a ser conferido à via recursal interposta por A ou B.

“Vale lembrar que no recurso em sentido estrito este julgador terá, antes de remetê-lo ao Tribunal, de exercer juízo de retratação: como entender que tal seja possível se uma das partes afirma que, pelo que já consta dos autos (não por motivo superveniente) o magistrado é, aqui e agora, suspeito? À toda evidência, tal importaria em manifesta inversão tumultuária vez que ao ser eventualmente acolhida a ‘suspeição’, a mesma seria reconhecida nos autos recursais que somente subiram ao Tribunal porque a decisão impugnada não foi reconsiderada pelo juiz... ‘suspeito’.”

Juízo de garantias

Para o magistrado, o MP confunde suspeição com dissonância cognitiva, mas são inconfundíveis, “sendo que a primeira se resolve pela arguição da exceção pertinente, enquanto a segunda somente se resolveria pelo juízo de garantias”.

“Assim é que não se mostra minimamente legítimo que pretenda o Ministério Público um juiz de garantias para chamar de seu – e só seu. Se a preocupação com dissonância cognitiva é efetivamente legítima, ela não se aplica somente à acusação ao pretender afastar o juiz que rejeitou a denúncia, mas também às defesas que, certamente, prefeririam que seus constituintes fossem julgados por juiz outro que não aquele que recebeu a inicial, seja na fase do artigo 396, seja na do 399.”

O magistrado explicou que desceu à análise mais detalhada do feito em razão das pormenorizadas e muito bem elaboradas respostas à acusação apresentadas por todas as partes, inclusive porque, se não o fizesse, a decisão poderia ser inquinada de nulidade.

“Entretanto, se o fez na decisão quando da reconsideração do recebimento da denúncia, objeto do recurso em sentido estrito ministerial, também o fez quando ratificou o recebimento da denúncia. Por qual motivo, então, o magistrado seria ‘suspeito’? Só porque não proferiu decisão integralmente condizente com o esperado pela acusação? Então, o juiz é ‘suspeito’ quando desce à (necessária, como fundamentado) análise pormenorizada do feito e decide contra o Ministério Público, mas não quando decide a seu favor? Não faz o mínimo sentido.”

Contraditório

A acusação alegou ainda que o magistrado de um lado teria violado o contraditório e, de outro, a paridade de armas ao não abrir vista ao Ministério Público.

O magistrado ressaltou, no entanto, que existe a necessidade de abertura de vista ao Ministério Público se os acusados juntam documentos às respostas, e tal foi feito, quando determinou ao MP sobre todos os acrescidos, em especial os documentos acostados pelas defesas.

“Ocorre que o órgão acusatório, intimado eletronicamente, preferiu não se manifestar sobre os documentos que já estavam nos autos. Como aqui já dito, a uma, não compete a qualquer das partes presidir o processo, mas ao juiz e, a duas, manifestações do órgão acusatório, enquanto parte, não vinculam o Juízo que, como visto, abriu tempestivamente vista dos autos ao Ministério Público sobre os documentos que já estavam acostados.”

Diante disso, não aceitou a suspeição arguida.

Veja a decisão.

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