A 3ª turma do STJ afastou precedente da Corte e manteve decisão que condenou um plano de saúde a custear medicamento importado sem registro na Anvisa. O colegiado observou que a doença da qual a paciente é portadora é ultrararra e acometeu apenas 160 pessoas no mundo.
A paciente ajuizou ação objetivando que o plano de saúde custeasse integralmente seu tratamento de saúde, portadora de doença ultrarrara denominada Síndrome de Schnitzler, por meio do uso do medicamento Kineret - Anakinra, independentemente de registro na Anvisa.
O pedido liminar foi deferido para determinar que a empresa autorizasse o tratamento, conforme prescrição médica, devendo se abster de qualquer ato que pudesse interromper o serviço.
Em contestação, a operadora de saúde alegou que o medicamento é importado e sem registro em território nacional, razão pela qual sua comercialização e custeio configuraria crime previsto no art. 273 do CP, além de contrariar a lei 9.656/98.
O juízo de primeiro grau confirmou a decisão liminar e condenou a empresa ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais. O TJ/RJ negou provimento à apelação do plano de saúde.
Ao STJ, a empresa apontou ofensa ao art. 757 do CC, sustentando que ficou demonstrado que não mereceu prosperar a condenação de fornecimento do remédio importado, tendo em vista a ausência de cobertura securitária.
Ao analisar a matéria, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, lembrou tese firmada pela 2ª seção de que as operadoras de planos de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento importado não registrado pela Anvisa. Para o ministro, porém, a peculiaridade no caso concreto afasta a aplicação do precedente.
“Entendo existir substancial diferença material entre o caso em julgamento e os paradigmas, suficiente a amparar a conclusão de que não seria coerente e isonômico aplicar a ratio decidendi dos precedentes que deram ensejo ao Tema 990/STJ, tendo em vista, também, de certa forma, o grau de generalidade da tese firmada.”
O ministro ressaltou que a doença da qual a paciente é portadora, a Síndrome de Schnitzler, acometeu apenas 160 pessoas no mundo, o que corresponde a 0,000002% da sua população.
Sanseverino salientou que a característica de ultrarraridade da patologia, por si só, já traz, em comparação, maiores dificuldades ao paciente, não apenas de diagnóstico, mas, sobretudo, de descoberta de medicamento eficaz e acessível para o controle da enfermidade.
No voto, o ministro destacou julgado do STF que explicitou que a raridade ou ultrarraridade da doença tem o condão de excepcionar a regra geral.
“Conforme jurisprudência pacífica desta Corte, a natureza do rol da ANS é meramente exemplificativa, reputando, no particular, abusiva a recusa de cobertura de procedimento prescrito para o tratamento de doença coberta pelo plano de saúde.”
Diante disso, negou provimento ao recurso. A decisão da turma foi unânime.
Atuaram no feito os advogados Anna Maria da Trindade dos Reis e Caio Humberto Pássaro de Laet, pelo Trindade & Reis Advogados Associados, e Pedro Henrique Pedreira Dutra Leite, pelo Dutra Leite & Brandão Cavalcanti Advogados Associados.
- Processo: REsp 1.885.384
Veja a decisão.
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