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Comissão para avaliar autodeclaração racial de aluna cotista é ilegal

Juiz considerou que não existia previsão para isso em edital.

22/5/2021

(Imagem: Pixabay)
Instituir comissão para analisar a autodeclaração racial do candidato cotista, sem que exista previsão para isso em edital, é ilegal e representa inovação indevida. O entendimento é do juiz Federal substituto Hiram Armênio Xavier Pereira, da 2ª vara Federal Cível de Mato Grosso.

O magistrado suspendeu processo disciplinar aberto contra uma estudante de Direto da UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso, que estava sendo impedida de colar grau. O procedimento poderia culminar na perda de vaga e de todo o percurso acadêmico cumprido, uma vez que a impetrante já teria finalizado os cinco anos de graduação.

De acordo com o processo, a UFMT instituiu uma comissão de heteroidentificação para complementar a autodeclaração de candidatos negros, pardos e indígenas. No entanto, as matrículas analisadas foram as de estudantes já devidamente matriculados e que assinaram contrato prevendo apenas a necessidade de autodeclaração para ingresso como cotista.

No caso dos autos, a estudante de Direito não se submeteu à comissão de heteroidentificação, cuja análise foi feita exclusivamente com base em registros fotográficos, extraídos de redes sociais. Assim, porque não compareceu, foi aberto contra ela um processo disciplinar para averiguação de fraude.

Na decisão, ao acolher os argumentos da defesa da estudante, o juiz explicou que "ainda que a administração possa — e deva — investigar fraudes, é certo que tal investigação encontra limites em outros postulados que regem a atividade administrativa. Com efeito, admitir que, após 5 anos do início do curso, a Administração invalide o seu ingresso seria contrário à eficiência e economicidade na aplicação dos recursos públicos, na medida em que todo o recurso empregado na formação do profissional médico pela Universidade Pública seria inutilizado, em frustração à sua própria expectativa”.

"Outro ponto que merece destaque", prossegue o magistrado, "é que, à época do processo seletivo ao qual se submeteram os impetrantes, não havia previsão da etapa de heteroidentificação, mas apenas a autodeclaração".

"Desta maneira, se o edital é a lei do concurso e vincula as partes — candidato e administração pública —, submeter os candidatos a uma comissão viola o princípio da vinculação ao edital, vários anos após concluído o processo de ingresso."

Os advogados Filipe Maia Broeto e Fernando Cesar de Oliveira Faria atuaram no processo. Para eles, muito embora seja discutível se há ou não a necessidade de controlar possíveis fraudes por meio de comissões, o único critério exigido da impetrante foi o da autodeclaração, sendo, portanto, ilegal fazer retroagir normas não existentes ao tempo do processo seletivo do Sisu.

“Seu fenótipo foi ‘analisado’ simples e inaceitavelmente por ‘fotos’ de redes sociais que foram juntadas mediante um documento apócrifo -- o mesmíssimo que foi utilizado para denegrir os alunos do curso de Medicina, procedimento que já veio a ser ‘cassado’ pela Justiça Federal de Mato Grosso [MS  1000232-59.2021.4.01.3600]”, disseram Broeto e Faria.

Isso, prosseguem, faz com que a conclusão da comissão seja nula por ausência de motivação, “além de representar açoite à dignidade humana, que se mostra inaceitável na atual quadra dos direitos fundamentais”.

Com a decisão, a estudante poderá colar grau em Direito.

Leia a decisão.

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