O vice-presidente do STJ, ministro Jorge Mussi, no exercício da presidência, deferiu liminar neste sábado, 23, para suspender o interrogatório determinado no inquérito aberto pela Polícia Federal contra o advogado Marcelo Feller.
O advogado seria interrogado por causa de críticas quanto à condução do enfrentamento da pandemia da covid-19 pelo presidente da República Jair Bolsonaro durante programa da CNN Brasil.
O interrogatório está suspenso até o julgamento do mérito do habeas corpus no STJ, ainda sem data definida.
Ao analisar o pedido da defesa de Marcelo Feller, o ministro Jorge Mussi concluiu que fica aparente no caso a ausência de tipicidade da conduta, sobretudo porque, em princípio, não é possível inferir o dolo específico necessário à configuração do delito, justificando a suspensão do interrogatório.
"Ademais, impende prestigiar a liberdade de imprensa consagrada no artigo 220 da Constituição Federal, já que esta - nas palavras do ministro Ayres Britto, a irmã gêmea da democracia - viabiliza, a um só tempo, o debate de ideias, a concretização dos valores republicanos e a responsabilidade dos governantes, que, por sua posição proeminente, devem se submeter e tolerar um escrutínio mais intenso da sociedade.”
Inquérito
A instauração do inquérito foi pedida pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, após os comentários de Feller no programa "O Grande Debate", transmitido pelo canal da CNN Brasil no dia 13 de julho do ano passado.
Segundo o ministro da Justiça, ao criticar a condução do presidente Jair Bolsonaro no enfrentamento da pandemia da covid-19, atribuindo responsabilidade ao presidente por um percentual do total de mortos, Marcelo Feller teria cometido crime contra a honra e a dignidade do presidente da República e contra a segurança nacional.
Livre manifestação
No pedido de habeas corpus, a defesa de Marcelo Feller alegou que ele apenas exerceu o seu direito de liberdade de expressão, assegurado pela Constituição Federal.
O advogado tinha um depoimento marcado, nos autos do inquérito, para o dia 1º de fevereiro, o que justificaria, na visão da defesa, a urgência da análise da liminar para trancar as investigações e evitar o embaraço público ao qual o profissional seria submetido.
O presidente em exercício do STJ, Jorge Mussi, destacou que é pacífico nos tribunais superiores que a incidência da lei 7.170/83, invocada pelo ministro André Mendonça para o pedido de inquérito, pressupõe a presença de dois requisitos cumulativos, um subjetivo, consistente na motivação e objetivos políticos do agente, e outro objetivo, referente à lesão real ou potencial à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à Federação ou ao Estado de Direito.
"Não obstante a discordância que possa surgir em relação aos comentários do paciente, de uma breve análise de seu conteúdo, não é possível extrair a lesão real ou potencial à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à Federação ou ao Estado de Direito, mas tão somente severa crítica à postura do Presidente da República frente à pandemia da covid-19.”
Jorge Mussi lembrou que há notícia nos autos de um pedido de arquivamento do inquérito, mas não há a informação de confirmação do arquivamento pelo órgão revisor do Ministério Público Federal, "medida necessária para tomar certa a perda de objeto do pedido liminar".
Desta forma, segundo o ministro, justifica-se a concessão da liminar, pelo STJ, para suspender o interrogatório.
- Processo: HC 640.615
Leia a decisão.
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O Observatório de Liberdade de Imprensa da OAB emitiu nota assinada por Felipe Santa Cruz e Pierpaolo Cruz Bottini elogiando a decisão do ministro Jorge Mussi de suspender o inquérito.
“O Judiciário cumpriu seu papel de assegurar a liberdade de expressão e de impedir quaisquer atos de inibição à livre circulação de ideias. Na mesma linha, cumpriu sua função o Ministério Público Federal ao arquivar o inquérito sobre o mesmo tema. Tais atos revelam que as instituições funcionam de forma independente, apesar de seguidas tentativas de controlá-las.”
Informações: STJ