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Histórico: STJ afasta regime fechado a presos em SP por tráfico privilegiado

6ª turma invocou julgado do STF que, em 2016, decidiu que não é hediondo o delito em questão.

8/9/2020

A 6ª turma do STJ, em sessão por videoconferência nesta terça-feira, concedeu HC a paciente, e determinou aos demais condenados por tráfico privilegiado a 1 ano e 8 meses em regime fechado, a fixação de regime aberto. Em seu voto, o relator, ministro Rogerio Schietti, destacou interpretação consolidada pelo STF de que não é considerado hediondo o delito em questão. A decisão, que foi unânime, também garante a aplicação do critério para casos futuros, por meio de “salvo conduto”.

Consta nos autos que o paciente foi condenado como incurso no artigo 33, caput, da lei 11.343/06, às penas de 01 ano e 08 meses de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 166 dias-multa. O réu apelou buscando a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. A 6ª câmara de Direito Criminal do TJ/SP negou provimento ao recurso.

Em sessão desta terça-feira, o advogado Rafael Muneratti, defensor púlbico de SP, destacou que, em sentença, o magistrado aplicou a pena prevista para o delito de tráfico privilegiado, mas, sob o argumento de suposta hediondez, aplicou o regime fechado. O causídico ressaltou que desde 2016 o STF decidiu que não há hediondez no delito em questão.

“Entramos em contato com a administração penitenciária do Estado de SP e nos assustamos ao sermos informados por ofício de que condenados definitivos por tráfico privilegiado, há um total de 869 pessoas em regime fechado e, se contados os não definitivos, 1438 pessoas. Por isso pedimos que o HC alcance as questões idênticas.”

Relator

Ao analisar o caso, o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, ressaltou que não é mais possível transigir com soluções atômicas ou moleculares. “Temos que pensar em algo que seja mais efetivo”, ressaltou.

Para o ministro, há anos são perceptíveis em um segmento da jurisdição criminal os reflexos de uma postura judicial que, sob o afirmado escudo da garantia da independência e da liberdade de julgar, reproduz política estatal que se poderia, “não sem exagero, qualificar como desumana, desigual, seletiva e preconceituosa”.

“Tal orientação, que se forjou a longo das últimas décadas, parte da premissa equivocada de que não há outro caminho para o autor de qualquer das modalidades do crime de tráfico, nomeadamente daquele considerado pelo legislador como de menor gravidade, que não o seu encarceramento.”

Schietti destacou que, segundo interpretação consolidada e antiga do STF, não é considerado hediondo o delito de tráfico de drogas, caracterizada pela quantidade de drogas apreendida não elevada e por ser o agente primário, sem antecedentes penais e sem envolvimento com atividade ou organização criminosa.

“Não condiz com a racionalidade punitiva, ínsita a um Estado Democrático de Direito, que a todo e qualquer autor de tráfico de drogas se imponha o cumprimento de sua pena em estabelecimento penal, em regime fechado, e sem direito a qualquer alternativa punitiva, mesmo se todas as circunstâncias judiciais e legais sejam reconhecidas a seu favor (quantidade pequena de droga, primariedade e bons antecedentes do agente, além de não demonstração de seu envolvimento em atividade ou organização criminosa).”

O ministro ainda ressaltou que não há de ser esse o proceder de agentes do Estado a quem se confia o exercício da nobre função de dizer o Direito, “algo que no âmbito da jurisdição criminal, que expressa o poder punitivo estatal, reclama dose ainda maior de serenidade e ausência de preconceitos”.

"Se o CP determina que, fixada a sanção em patamar inferior a 4 anos de reclusão, o regime inicial de pena há de ser o aberto quando as circunstâncias forem todas favoráveis ao agente, permitindo também substituir a reprimenda privativa de liberdade por restritiva de direitos, não há razão para impor-se a condenados pela modalidade mais tênue do crime de tráfico de entorpecentes o mesmo regime de pena que, ex vi lege, se costuma impingir somente a quem é condenado por outros crimes, ou mesmo por tráfico, a mais de 8 anos de pena, ou a reincidentes ou portadores de circunstâncias desfavoráveis."

Assim, concedeu o HC para:

i) Em relação ao paciente individualizado na impetração, fixar o regime aberto como modo inicial de cumprimento da pena;

ii) Em relação aos presos que, conforme informação da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de SP, se encontrem na mesma situação (condenados, por delito de tráfico privilegiado, a 1 ano e 8 meses, em regime fechado), fixar o regime aberto;

iii) Em relação aos presos condenados, pelo delito de tráfico privilegiado, a penas menores do que 4 anos de reclusão – salvo os casos do item anterior – determinar que os respectivos juízes das Varas de Execução Penal competentes e responsáveis pela execução das sanções dos internos reavaliem, com a máxima urgência, a situação de cada um, de modo a verificar a possibilidade de progressão ao regime aberto em face de eventual detração penal decorrente do período em que tenham permanecido presos cautelarmente.

iv) Aos condenados que atualmente cumprem pena por crime de tráfico privilegiado, em que se reconhecem todas as circunstâncias como favoráveis, e aos que vierem a ser sancionados por tal ilicitude (mesmas circunstâncias fáticas), determinar que não se imponha – devendo haver pronta correção aos já sentenciados – o regime inicial fechado de cumprimento da pena.

O ministro ainda determinou o cumprimento da ordem de HC para que se providencie, junto aos respectivos juízos, a imediata expedição de alvarás de soltura aos presos que, beneficiados pelas medidas ora determinadas, não estejam presos por outros motivos.

A turma seguiu o entendimento do relator por unanimidade.

Opinião

Para o defensor público, Rafael Muneratti, "a decisão busca fazer valer o princípio da isonomia, garantindo a todos os detentos e detentas a aplicação dos critérios objetivos de aplicação de pena previstos pela sua jurisprudência, de maneira ampla, sem que seja necessário levar cada um dos casos idênticos de maneira individualizada àquele Tribunal Superior”.

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