O PSC – Partido Social Cristão ajuizou nesta segunda-feira, 31, ação no STF buscando a atribuição de interpretação conforme à CF ao bloco normativo formado pelos artigos 282, §§ 2º e 3º e 315 do CPP, c/c o art. 319, VI do CPP, em especial quando de sua aplicação a governadores de Estados.
Tais dispositivos tratam dos critérios e procedimentos para a decretação de medidas cautelares no processo penal e preveem a suspensão do exercício de função pública como medida cautelar alternativa à prisão.
O objetivo da interpretação conforme, defende o PSC, é evitar fragilizar os princípios constitucionais da soberania popular, da separação entre Poderes, do voto direto, secreto, universal e periódico e da autonomia institucional dos Estados-membros, com a criação de indesejável instabilidade nos mandatos políticos de Governador de Estado.
Silêncio constitucional
Na inicial, o partido explica que a CF não dispõe sobre a necessidade, ou não, de prévia autorização do Poder Legislativo local para abertura de processo criminal contra governador pelo STJ – “com a grave consequência do afastamento temporário de mandato daí decorrente”.
“E esse silêncio da Constituição Federal, que transferiu ao E. STJ a competência para processar e julgar os Governadores, sem qualquer condicionamento ao crivo político prévio do Poder Legislativo respectivo, fez com que fosse questionada, perante esta Suprema Corte, a antiga e consolidada orientação no sentido da validade jurídica das regras constantes das Constituições Estaduais, que previam, como condição de procedibilidade, a prévia autorização legislativa em tema de processos por crime comum movidos contra Governadores de Estado, em simetria ao rito previsto para o Presidente da República.”
A advogada Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro, do escritório Bucchianeri Advocacia, responsável pela ação do PSC, recorda na inicial a jurisprudência da própria Corte Suprema, orientação reafirmada ainda em 2015, em julgado relatado pelo ministro Teori, reputando legítimas normas estaduais que subordinam a deflagração formal de um processo acusatório contra governador a um juízo político da Assembleia Legislativa local.
Isso até 2017, prossegue a advogada, quando veio a nova orientação no sentido de que é inconstitucional a previsão, em Constituição Estadual, de dispositivo que condicione a abertura de processo criminal contra governador à prévia autorização legislativa.
“Como calibragem necessária à supressão da participação do Poder Legislativo estadual no processo de abertura de processo criminal contra Governador de Estado em um Tribunal Federal, esta Suprema Corte igualmente assentou a inconstitucionalidade de qualquer norma que estabeleça o automático afastamento do Chefe do Poder Executivo Estadual, exclusivamente em razão da abertura de processo-crime.”
Quórum qualificado
Atualmente, prossegue o PSC na inicial, estima-se que sete governadores de Estado estejam sendo investigados perante o STJ apenas no que concerne a medidas tomadas no combate da epidemia da covid-19; e muitos deles também enfrentam crises políticas em seus Estados. Nesta linha, o partido menciona o afastamento do governador do RJ Wilson Witzel, por decisão monocrática do ministro Benedito Gonçalves, a pedido da PGR.
“Imprescindível, portanto, a realização de nova leitura constitucional da temática atinente ao afastamento cautelar de Governadores de Estado, com o aprofundamento de debate constitucionalmente sensível, que foi postergado por esta Suprema Corte, quando do julgamento das ADI nº 4.764/AC, nº 4.797/MT e nº 4.798/PI.”
Conforme o partido, é justificável a exigência de quórum qualificado para se determinar o afastamento do mandato de um governador eleito.
“Imperioso que esta Corte confira interpretação conforme à Constituição ao artigo 282, § 2º do CPP para estabelecer que a expressão “juiz” ali prevista deve ser tida como “juiz natural para feitos criminais contra Governadores”, qual seja, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, e, ainda, observado o quórum de 2/3 para afastamento, que é o mesmo quórum de afastamento em tema de crimes de responsabilidade, que era o quórum de autorização para abertura de processos por crimes comuns, com o automático afastamento, e que igualmente é o quórum de afastamento de Magistrados e Conselheiros de Contas.”
Contraditório
Para o PSC, tal qual ocorre com o presidente da República, também o afastamento cautelar de governador, em sede de crime de responsabilidade e após votação por 2/3 da respectiva Assembleia Legislativa, apenas pode se dar após a apresentação de defesa prévia.
“A sustação de mandato (...) sem qualquer possibilidade de questionamento das graves razões que deve fundamentá-la, é situação de evidente desproporcionalidade e de banalização da medida, que é extrema, com comprometimento do próprio estatuto constitucional dos mandatos de Governadores.”
Assim, argumenta o autor, o Supremo deve fixar que o afastamento cautelar de governadores demanda a oitiva prévia da autoridade contra a qual o pedido se dirija, ainda que em prazos justificadamente mitigados ou reduzidos.
“É hora de esta Suprema Corte realizar a clivagem constitucional que se faz necessária. Há insegurança política e institucional, com claro comprometimento da própria Governabilidade nos Estados, a justificar o acolhimento da presente ação direta de inconstitucionalidade.”