A 3ª seção do STJ, em julgamento por videoconferência nesta quarta-feira, 26, negou recurso da Google, mantendo decisão que determinou que a empresa forneça dados de usuários que pesquisaram sobre a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes antes do assassinato.
O colegiado seguiu voto do relator, ministro Rogério Schietti, que ressaltou que a quebra dos sigilos dos registros delimitada por parâmetros de pesquisa em determinada região e em período de tempo especifico, não impõe risco desmedido à privacidade e intimidade dos usuários possivelmente atingidos.
O Google questionou decisão do TJ/RJ que determinou que a empresa fornecesse as informações. O pedido, feito em agosto de 2018 pela Polícia Civil e pelo MP/RJ, solicita a lista dos IPs e Device IDs de usuários que pesquisaram o nome da vereadora e as combinações "Vereadora Marielle", "Agenda vereadora Marielle", "Casa das Pretas", "Agenda vereadora Marielle", e "Rua dos Inválidos", entre outros, nos dias 7 de 14 de março de 2018.
O MP solicitou, ainda, os IPs e cruzamento de dados dos dispositivos que passaram pelo pedágio da Transolímpia, via que liga os bairros Recreio dos Bandeirantes e Deodoro, em 2 de dezembro de 2018, entre 11h05 e 11h20, para identificar os ocupantes do veículo usado no assassinato.
Em dezembro de 2018, o Google recorreu da decisão alegando que a combinação de palavras são termos comuns, potencialmente pesquisados por milhares de pessoas para os mais diversos fins. Para a empresa, não existe autorização legal para a determinação da quebra de sigilo de uma gama de pessoas não identificadas e sequer individualizadas.
Quebra de sigilo
O relator, ministro Rogério Schietti, assentou que o direito ao sigilo não possui, na compreensão da jurisprudência pátria, dimensão absoluta e, embora deva ser preservado na sua essência, o STJ, assim como a Suprema Corte, entende que é possível afastar sua proteção quando presentes circunstâncias que denotem existência de interesse público relevante.
“Invariavelmente por meio de decisão proferida por autoridade judicial competente suficientemente fundamentada, na qual se justifique a necessidade da medida para fins de investigação criminal ou de instrução processual criminal, sempre lastreada em indícios que devem ser, em tese, suficientes a configuração de suposta ocorrência de crime sujeito a ação penal pública.”
Schietti verificou que a proporcionalidade à quebra dos dados informáticos é adequada, na medida em que serve como instrumento que pode auxiliar na elucidação dos delitos, cuja investigação se arrasta por mais de dois anos sem que haja uma conclusão definitiva.
“É necessária, diante da complexidade do caso e da não evidência de outros meios não menos gravosos para se alcançarem os legítimos fins investigativos. E, por fim, é proporcional em sentido estrito, porque a restrição a direitos fundamentais que dela redundam, tendo como finalidade a apuração de crimes dolosos contra a vida de repercussão internacional, não enseja gravame às pessoas eventualmente afetadas, às quais não terão seu sigilo de dados registrais publicizados, os quais se não constatados sua conexão com o fato investigado, serão descartados.”
Scrietti finalizou dizendo que a ordem judicial para a quebra dos sigilos dos registros delimitada por parâmetros de pesquisa em determinada região e em período de tempo especifico, não se mostra medida desproporcional, porquanto tendo como norte a apuração de “gravíssimos crimes cometidos por agentes públicos contra as vidas de três pessoas, mormente, a de quem era alvo da emboscada, pessoa dedicada a atividade parlamentar, a defesa de direitos de minorias que sofrem com a ação desse seguimento podre da estrutura estatal fluminense, não impõe risco desmedido à privacidade e intimidade dos usuários possivelmente atingidos”.
Assim, o colegiado negou provimento ao recurso em mandado de segurança, vencido o ministro Sebastião Reis Jr.
Atualização:
Em nota, o Google lamenta a decisão tomada hoje pelo STJ e diz que estuda possível recurso ao STF.
"Reiteramos nosso respeito ao trabalho de investigação das autoridades brasileiras, com as quais colaboramos de modo consistente. Embora tenhamos atendido diversas ordens expedidas no caso em questão, entendemos que a discussão levada ao STJ envolve pedidos genéricos e não individualizados, contrariando a proteção constitucional conferida à privacidade e aos dados pessoais. Mais uma vez, o Google reafirma o compromisso com a privacidade dos brasileiros e está avaliando as medidas a serem adotadas, inclusive um eventual recurso ao Supremo Tribunal Federal.”