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Voto por omissão no plenário virtual pode desrespeitar próprio regimento do STF

Exigência de quórum qualificado no plenário físico para julgar matéria constitucional conflita com a previsão do voto omisso ser traduzido, no virtual, como voto com o relator.

8/5/2020

A pandemia do coronavírus e as medidas de isolamento social levaram o STF a impulsionar os julgamentos virtuais, e desde o mês passado o plenário virtual funciona intensamente. Tanto que sofreu melhorias após críticas e também pleitos da advocacia. Mas uma situação nociva à jurisdição ainda permanece: o temerário voto por omissão.

Pela regra atual, se o ministro não se pronunciar no prazo da sessão virtual, ele tem seu voto computado como seguindo o relator. Diferentemente do plenário físico – em que a ausência é, afinal, ausência –, no virtual a corrente minoritária pode, de supetão, tornar-se a maioria formal. Inclusive, alterando a jurisprudência da própria Corte.

É o caso, por exemplo, de processo de repercussão geral que está na pauta da sessão virtual que se encerra nesta sexta-feira, 8: o RE 827.538, que trata da validade de lei estadual que obriga concessionária a investir em proteção ambiental.

No cerne da discussão está a fixação de balizas ao exercício, pelos entes federativos, de competências relativas à proteção do meio ambiente, em face da competência da União para legislar sobre energia.

Pois bem. O relator, ministro Marco Aurélio Mello, desproveu o recurso da Cemig - Companhia Energética de Minas Gerais, no que foi acompanhado pelo ministro Fachin, propondo a tese de que “surge constitucional, considerada a competência concorrente, norma estadual em que prevista obrigação, por parte de concessionária de energia elétrica, de promover investimentos com recursos de parcela da receita operacional auferida, voltados à proteção e à preservação ambiental de bacia hidrográfica em que ocorrer a exploração”.

Por outro lado, ministros Fux, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski divergiram. O placar de 3x2 a favor da recorrente confirma, em processo de repercussão geral, a jurisprudência sólida do plenário físico – quando ministro Marco Aurélio ficou vencido. Contudo, se os outros ministros não se manifestarem até às 23h59 desta sexta-feira, 8, os votos omissos serão computados com o relator Marco Aurélio.

Para efeito de comparação, no RE 627.189, julgado em 2017 e no qual o plenário considerou que "não existem fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal fixado", ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Fachin, além de Rosa weber e Celso de Mello. Na ADIn 5.610, julgada no ano passado, vencidos Marco Aurélio e Fachin, o plenário também afastou a competência estadual sobre matérias do setor elétrico, deliberando que "os prazos e valores referentes à religação do fornecimento de energia elétrica não apenas já estão normatizados na legislação setorial pertinente, como o quantum pelo serviços cobráveis e visitas técnicas submetem-se à homologação da ANEEL, razão pela qual não remanesce, sob esse prisma, qualquer espaço para a atuação legislativa estadual, mercê de, a pretexto de ofertar maior proteção ao consumidor, o ente federativo tornar sem efeito norma técnica exarada pela agência reguladora competente".

Além da superação de posição jurisprudencial do plenário físico (o que não é problema por si só), o plenário virtual cria uma situação no mínimo complicada no que diz respeito ao quórum de deliberação.

Isso porque o regimento interno do STF é claro ao prever o quórum qualificado, com oito ministros, para votação de matéria constitucional (parágrafo único do art. 143). Mais adiante, no art. 173, o regimento dispõe ainda que se não for alcançada a maioria necessária à declaração de  inconstitucionalidade, estando licenciados ou ausentes ministros em número que possa influir no julgamento, “este será suspenso a fim de aguardar-se o comparecimento dos ministros ausentes, até que se atinja o quórum”.

Em outras palavras: o julgamento no plenário físico não só exige quórum mínimo de dois ministros a mais para tratar de matéria constitucional, como prevê a hipótese de suspensão do julgamento caso este quórum não ocorra; já no virtual, mais uma vez, a omissão (leia-se: ausência) de voto é revertida a favor do relator. É, de fato, uma incongruência: o plenário virtual do Supremo extrai posição do ministro que se ausenta da votação.

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