A 2ª turma do STF anulou nesta terça-feira, 27, decisão que condenou o ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A condenação havia sido imposta pelo ex-juiz Federal Sergio Moro, no âmbito da operação Lava Jato.
Para a maioria dos ministros da 2ª turma, houve cerceamento da defesa na análise do caso.
No processo, o juízo da 13ª vara Criminal Federal de Curitiba/PR, ao concluir a instrução, abriu prazo comum para que os corréus (delatores e não delatores) apresentassem suas alegações finais. A defesa do executivo pediu que seu cliente pudesse apresentar sua manifestação após os colaboradores, com o argumento de que a abertura de prazo comum, e não sucessivo, para colaboradores e não colaboradores traria prejuízos a seu cliente. O pedido, no entanto, foi negado.
Nesta terça-feira, 27, durante julgamento de agravo regimental em HC, o advogado Alberto Zacharias Toron (Toron, Torihara e Cunha Advogados), que defende Bendine, sustentou que, no processo penal, o réu tem o direito de se defender e de rebater todas as alegações com carga acusatória.
Segundo o advogado, o acusado tem o direito de falar por último, independentemente de onde vier a acusação, sob pena de configuração do cerceamento de defesa. Lembrou ainda que a condenação foi confirmada, com redução de pena, pelo TRF da 4ª região, sem acolhimento da questão trazida no HC impetrado no Supremo.
"Primeiro devem se manifestar aqueles acusados que, embora formalmente qualificados como acusados, na verdade, são delatores para, por último, o delatado (...) para que ele possa, nos seus memoriais, rebater o que foi dito pelo delator acusador."
STF
No STF, o ministro Edson Fachin negou seguimento ao HC. Contra a decisão, foi interposto o agravo regimental.
Fachin votou no sentido de negar provimento ao recurso, por entender que não existe previsão legal para a apresentação de alegações finais em momentos diversos por corréus delatores e delatados. Segundo o ministro, como a colaboração premiada é uma das estratégias que pode ser usada pela defesa, a opção por esse instituto não autoriza que o juiz faça distinção entre colaboradores e não colaboradores.
Divergência
O ministro Ricardo Lewandowski, por sua vez, divergiu do relator, ao considerar que ficou configurado constrangimento ilegal. Segundo o ministro, o direito ao contraditório e à ampla defesa deve permear todo o processo penal, inclusive no momento do oferecimento das alegações finais.
Como a colaboração premiada é meio de obtenção de prova, entendeu que a fixação de prazo simultâneo gera prejuízo à defesa, especialmente porque, no caso, a sentença condenatória foi desfavorável ao acusado.
"É irrefutável a conclusão de que, sob pena de nulidade, os réus colaboradores não podem se manifestar por último, em razão da carga acusatória de suas informações."
Com esse entendimento, o ministro votou pelo provimento do recurso para anular a sentença e os atos posteriores ao encerramento da instrução, para que seja assegurado ao réu o direito de oferecer novamente os memoriais após os colaboradores.
A divergência foi acompanhada pelos ministros Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.
- Processo: HC 157.627
"Preocupação"
Em nota, a força-tarefa da operação Lava Jato em Curitiba manifestou preocupação com a decisão. Para os procuradores, os ministros estabeleceram uma interpretação que, se for aplicada nos demais casos da Lava Jato, "poderá anular praticamente todas as condenações, com a consequente prescrição de vários crimes e libertação de réus presos".
Confira a íntegra da nota:
A força-tarefa da operação Lava Jato em Curitiba externa imensa preocupação em relação à decisão proferida hoje pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que anulou a sentença do caso Aldemir Bendine.
Por maioria, os julgadores entenderam que réus delatados devem ter o direito de se manifestar, ao final do processo, após a defesa dos réus colaboradores.
Os Ministros estabeleceram uma nova interpretação que, se for aplicada como nova regra, vai alterar entendimentos pacíficos sobre princípios como o da ampla defesa.
Contudo, essa nova regra não está prevista no Código de Processo Penal ou na lei que regulamentou as delações premiadas.
Se o entendimento for aplicado nos demais casos da operação Lava Jato, poderá anular praticamente todas as condenações, com a consequente prescrição de vários crimes e libertação de réus presos.
A força-tarefa expressa sua confiança de que o Supremo Tribunal Federal reavaliará esse tema, modulando os efeitos da decisão.