Migalhas Quentes

Bolsonaro diz saber como pai de presidente da OAB desapareceu na ditadura; entidades reagem

Pai de Felipe Santa Cruz, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, desapareceu em 1974.

29/7/2019

Ao reclamar da atuação da OAB no processo judicial de Adélio Bispo, autor da facada no presidente durante as eleições, Jair Bolsonaro afirmou: “Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto pra ele." Felipe Santa Cruz é filho de Fernando Santa Cruz, desaparecido em 1974.

Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi um estudante e militante do movimento estudantil brasileiro. De acordo com um de seu irmãos, João Artur, Fernando não era ligado à luta armada, mas era membro da Ação Popular Marxista-Lenista. No dia 23 de fevereiro, Fernando saiu da casa do seu irmão Marcelo para o encontro com os amigos às 16h daquele sábado de carnaval, e disse que voltaria às 18h. Entretanto, nunca mais foi visto. O filho Felipe tinha dois anos de idade. Veja a declaração:


Durante uma live no Facebook, enquanto um rapaz cortava seu cabelo, o presidente voltou a falar no assunto.

Agradecendo as manifestações de solidariedade, o presidente da Ordem conta que a avó faleceu há pouco, aos 105 anos, sem saber como o filho foi assassinado. "Se o presidente sabe, por “vivência”, tanto sobre o presente caso quanto com relação aos de todos os demais “desaparecidos”, nossas famílias querem saber."

"O que une nossas gerações, a minha e a do meu pai, é o compromisso inarredável com a democracia, e por ela estamos prontos aos maiores sacrifícios. Goste ou não o presidente." Felipe Santa Cruz

A OAB, em nota, além de apresentar solidariedade a todos as famílias daqueles que foram mortos, torturados ou desaparecidos, ao longo de nossa história, especialmente durante o Golpe Militar de 1964, afirma que "a diretoria, o Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB e o Colégio de Presidentes das 27 Seccionais da OAB repudiam as declarações do Senhor Presidente da República e permanecerão se posicionando contra qualquer tipo de retrocesso, na luta pela construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e contra a violação das prerrogativas profissionais".

Manifestações

O Sindicato dos Advogados do RJ classificou a fala de “desprezível”: “Se alguém incorre em crime esse alguém é o próprio presidente, pois se ele sabe, como afirma, como morreu o pai de Santa Cruz, Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, tem de contar.

O Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais também divulgou nota em solidariedade ao atual presidente do Conselho Federal da OAB.

Em nota, o IAB diz que a postura é "incompatível com o exercício do cargo de chefe de Estado" e que as declarações, as quais indicam que o presidente da República tem conhecimento de fatos criminosos ocorridos, "está por merecer esclarecimentos ao Ministério Público Federal que não pode, em nome do estado de direito, ignorar tal pronunciamento".

AASP, IASP, MDA, Cesa e Sinsa afirmaram que "não se mostra aceitável a agressão à Advocacia; o desrespeito à dor e o ataque pessoal ao Presidente da OAB; tampouco, a violação dos valores inerentes à Democracia".

As comissões de Direitos Humanos da OAB; A AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul; Anistia Internacional; Instituto Vladimir Herzog; Amatra1 - Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região - Rio de Janeiro; o IGP - Instituto de Garantias Penais manifestaram repúdio às declarações e solidariedade ao presidente da OAB. 

O governador de SP, João Doria, criticou a fala de Bolsonaro: "É inaceitável que um presidente da República se manifeste da forma que se manifestou em relação ao pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz. Foi uma declaração infeliz".

Os Centros Acadêmicos das faculdades de Direito da PUC, USP e Mackenzie publicaram nota conjunta sobre o ocorrido repudiando a fala do presidente. 

Veja as manifestações:

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Nota pessoal de Felipe Santa Cruz

Como orgulhoso filho de FERNANDO SANTA CRUZ, quero inicialmente agradecer pelas manifestações de solidariedade que estou recebendo em razão das inqualificáveis declarações do presidente Jair Bolsonaro. O mandatário da República deixa patente seu desconhecimento sobre a diferença entre público e privado, demostrando mais uma vez traços de caráter graves em um governante: a crueldade e a falta de empatia. É de se estranhar tal comportamento em um homem que se diz cristão. Lamentavelmente, temos um presidente que trata a perda de um pai como se fosse assunto corriqueiro – e debocha do assassinato de um jovem aos 26 anos. 

Meu pai era da juventude católica de Pernambuco, funcionário público, casado, aluno de Direito. Minha avó acaba de falecer, aos 105 anos, sem saber como o filho foi assassinado. Se o presidente sabe, por “vivência”, tanto sobre o presente caso quanto com relação aos de todos os demais “desaparecidos”, nossas famílias querem saber. 

A respeito da defesa das prerrogativas da advocacia brasileira, nossa principal missão, asseguro que permaneceremos irredutíveis na garantia do sigilo da comunicação entre advogado e cliente. Garantia que é do cidadão, e não do advogado. Vale salientar que, no episódio citado na infeliz coletiva presidencial, apenas o celular de seu representante legal foi protegido. Jamais o do autor, sendo essa mais uma notícia falsa a se somar a tantas. 

O que realmente incomoda Bolsonaro é a defesa que fazemos da advocacia, dos direitos humanos, do meio ambiente, das minorias e de outros temas da cidadania que ele insiste em atacar. Temas que, aliás, sempre estiveram - e sempre estarão - sob a salvaguarda da Ordem do Advogados do Brasil. 

Por fim, afirmo que o que une nossas gerações, a minha e a do meu pai, é o compromisso inarredável com a democracia, e por ela estamos prontos aos maiores sacrifícios. Goste ou não o presidente.

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Nota da OAB

A Ordem dos Advogados do Brasil, através da sua Diretoria, do seu Conselho Pleno e do Colégio de Presidentes de Seccionais, tendo em vista manifestação do Senhor Presidente da República, na data de hoje, 29 de julho de 2019, vem a público, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 44, da Lei nº 8.906/1994, dirigir-se à advocacia e à sociedade brasileira para afirmar que segue:

1.    Todas as autoridades do País, inclusive o Senhor Presidente da República, devem obediência à Constituição Federal, que instituiu nosso país como Estado Democrático de Direito e tem entre seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos.

2.    O cargo de mandatário da Chefia do Poder Executivo exige que seja exercido com equilíbrio e respeito aos valores constitucionais, sendo-lhe vedado atentar contra os direitos humanos, entre os quais os direitos políticos, individuais e sociais, bem assim contra o cumprimento das leis.

3.    Apresentamos nossa solidariedade a todos as famílias daqueles que foram mortos, torturados ou desaparecidos, ao longo de nossa história, especialmente durante o Golpe Militar de 1964, inclusive a família de Fernando Santa Cruz, pai de Felipe Santa Cruz, atingidos por manifestações excessivas e de frivolidade extrema do Senhor Presidente da República.

4.    A Ordem dos Advogados do Brasil, órgão supremo da advocacia brasileira, vai se manter firme no compromisso supremo de defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, e os direitos humanos, bem assim a defesa da advocacia, especialmente, de seus direitos e prerrogativas, violados por autoridades que não conhecem as regras que garantem a existência de advogados e advogadas livres e independentes.

5.    A diretoria, o Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB e o Colégio de Presidentes das 27 Seccionais da OAB repudiam as declarações do Senhor Presidente da República e permanecerão se posicionando contra qualquer tipo de retrocesso, na luta pela construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e contra a violação das prerrogativas profissionais.

Brasília, 29 de julho de 2019

Diretoria 

Colégio de Presidentes

Conselho Pleno

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Nota pública conjunta

Associação dos Advogados de São Paulo – AASP, Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP, Movimento de Defesa da Advocacia – MDA, Centro de Estudos das Sociedades de Advogados – CESA e Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro – SINSA, vêm a público evidenciar sua solidariedade ao Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em face da recente manifestação do Senhor Presidente da República. Não se mostra aceitável a agressão à Advocacia; o desrespeito à dor e o ataque pessoal ao Presidente da OAB; tampouco, a violação dos valores inerentes à Democracia.

Associação dos Advogados de São Paulo – AASP
Renato José Cury
Presidente

Instituto dos Advogados de São Paulo - IASP
Renato de Mello Jorge Silveira
Presidente

Movimento de Defesa da Advocacia - MDA
Eduardo Perez Salusse
Presidente

Centro de Estudos das Sociedades de Advogados - CESA
Carlos José Santos da Silva
Presidente

Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro - SINSA
Luis Otávio Camargo Pinto
Presidente

 

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Nota do IAB a respeito dos ataques do presidente da República contra Felipe Santa Cruz

O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) repudia veementemente a manifestação do presidente Jair Bolsonaro acerca do desaparecimento de Fernando Santa Cruz, pai do presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, dando conta, sem o menor pudor, de um possível conhecimento sobre o lamentável episódio.

O desaparecimento, tortura e morte de inúmeros brasileiros no período da ditadura militar são atos da maior gravidade. Foram repelidos nacional e internacionalmente, constituindo uma das páginas mais vergonhosas da nossa história.

Além da postura incompatível com o exercício do cargo de chefe de Estado, o presidente da República vem a público dizer que supõe ter conhecimento de fatos criminosos ocorridos, o que está por merecer esclarecimentos ao Ministério Público Federal que não pode, em nome do estado de direito, ignorar tal pronunciamento.

São evidentes os ataques desferidos pelo presidente contra a advocacia, bem como suas tentativas de enfraquecer a atuação firme da OAB diante do frequente desrespeito da ordem constitucional.

Ainda que o presidente da República insista em alimentar a violência e ignorar os princípios republicanos de observância dos direitos da pessoa humana, desdenhando das atrocidades cometidas por conta da política fascista de segurança nacional perpetrada na ditadura militar, é inaceitável a agressão de índole pessoal ao presidente da OAB.

A perda do pai em circunstâncias até hoje obscuras – mas que o presidente da República diz conhecer – deveria ser objeto de manifestação de respeito ao ser humano, ao cidadão Felipe Santa Cruz.

Não só a advocacia, mas toda a sociedade brasileira que tanto lutou pelo restabelecimento da democracia, não pode ficar apática aos acontecimentos recentes. Não é mais um discurso retórico. É a mesma postura de total desprezo aos direitos da pessoa humana.

O IAB não só hipoteca total solidariedade ao cidadão, ao advogado e líder da advocacia, como reafirma que mexer com Felipe Santa Cruz é mexer com a OAB; e mexer com a OAB é mexer com todos os advogados e advogadas brasileiros.

Rio de Janeiro, 29 de julho de 2019.

Rita Cortez

 

Presidente nacional do IAB

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Nota do Sindicato dos Advogados-RJ contra o ataque do presidente da República a Felipe Santa Cruz

Desprezível, é o mínimo que se pode dizer de mais um ataque do presidente da República ao presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz. Ele afirmou hoje, de forma gratuita e extemporânea, em uma coletiva à imprensa quando falava do atentado que sofreu na eleição, que “um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade".

Na mesma entrevista o presidente da República, novamente, atacou de forma infundada a atuação da Ordem no caso do atentado, acusando a instituição de ter impedido a polícia de ter acesso aos celulares dos advogados, quando a Ordem apenas fez cumprir a Constituição e as prerrogativas dos advogados. Aliás, se alguém incorre em crime esse alguém é o próprio presidente, pois se ele sabe, como afirma, como morreu o pai de Santa Cruz, Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, tem de contar. Caso contrário, estará acobertando um crime, além de esconder informações sobre um desaparecido político. Sem falar que ele agiu, ao fazer tal declaração, de modo leviano e cruel, ferindo, a nosso ver, o decoro no exercício do mais alto cargo da República.

A semana mal começou e o presidente e seu governo mantém a triste média de declarações e ações ilegais, perigosas, antidemocráticas e preconceituosas – lembrando que na semana que passou ele atacou os nordestinos; ameaçou de prisão o jornalista que vem denunciando irregularidades gravíssimas na Lava Jato; atacou os cientistas brasileiros que denunciam o desmatamento criminoso em nossas florestas; ameaçou com censura o financiamento cinematográfico; e de quebra ainda negou que a jornalista Miriam Leitão tenha sido torturada durante a ditadura. Tudo isso em apenas uma semana...

A sociedade tem que se organizar para deter essa escalada autoritária que atinge nosso País. O ataque a Felipe, no fundo, é um ataque ao que ele representa: o ataque a uma instituição, a OAB, que se fortaleceu no período democrático pós Constituição de 1988, que é o que o presidente da República quer destruir.

Não permitiremos!

Álvaro Quintão – presidente do Sindicato dos Advogados-RJ

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Nota do CONDEGE

O Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais – CONDEGE manifesta sua solidariedade ao presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, a respeito das declarações do Exmo. Presidente da República Jair Messias Bolsonaro sobre o desaparecimento de seu pai, preso pelas forças de segurança do Estado durante a ditadura militar e até hoje desaparecido.

Durante o regime autoritário de 1964 a 1985, quando as liberdades democráticas mais básicas da sociedade foram duramente atacadas, vários brasileiros foram mortos, torturados e presos ilegalmente, dentre eles o Sr. Fernando Santa Cruz, como reconhecido pela Comissão da Verdade e diversos organismos da sociedade civil.

A consolidação da democracia brasileira requer que as autoridades públicas resgatem a memória e a verdade, bem como velem pela dignidade de todos aqueles que sofreram com o abuso do poder estatal.

Portanto, solicitamos que os representantes dos poderes e demais instituições façam os debates políticos, quando necessário, mas de forma cortês, sem jamais usar como estratégia argumentativa declarações que escarnecem da dor pessoal alheia, ainda mais quando esta dor resulta de abusos do próprio Estado. O respeito entre as instituições e às pessoas é a base da democracia e o que legitima a própria existência da República.

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Nota das Comissões de Direitos Humanos da OAB repudiam ofensas a Felipe Santa Cruz, presidente nacional da entidade dos advogados

O presidente da República, Jair Bolsonaro, ofendeu nesta segunda-feira, (29/07), o presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), advogado Felipe Santa Cruz, ao vilipendiar a memória de seu pai, Fernando Santa Cruz Oliveira, que foi sequestrado e assassinado pelo braço repressivo da ditadura militar e permanece até hoje como um dos desaparecidos políticos do regime de 1964.

Bolsonaro afirmou: “Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto pra ele." O desaparecimento  de Fernando Santa Cruz Oliveira é um crime, cujos efeitos são permanentes. Seu corpo nunca foi encontrado. Seus autores não foram investigados, nem punidos. Ao dizer que sabe como Fernando foi morto, Bolsonaro associa-se aos autores do crime de que ele foi vítima. Faltando com a verdade, o presidente da República acusou Fernando de ter participado “do grupo mais sanguinário e violento da guerrilha em Pernambuco”, calúnia sem nenhum fundamento.

É ainda mais grave constatar que esses absurdos foram proferidos por Jair Bolsonaro como forma de retaliação e constrangimento à OAB, em virtude de a entidade ter defendido as prerrogativas do advogado de Adélio Bispo dos Santos, autor do atentado a faca contra o presidente. Bolsonaro ignora que tentativas de ameaçar e constranger a OAB estão historicamente destinadas a fracassar

Diante disso, manifestamos nosso repúdio às declarações de Bolsonaro e nossa solidariedade ao presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, e sua família.

Comissão Nacional de Direitos Humanos OAB
Hélio Leitão

Comissão de Direitos Humanos OAB-SP
Ana Amélia Mascarenhas Camargos

Comissão de Direitos Humanos OAB-DF
Soraia Mendes

Comissão de Direitos Humanos OAB-PB
Leilane Soares de Lima

Comissão de Direitos Humanos OAB-MT
Flávio Ferreira

Comissão de Direitos Humanos OAB-MS
Christopher Pinho Ferro

Comissão de Direitos Humanos da OAB-BA
Jerônimo Luiz Plácido de Mesquita

Comissão de Direitos Humanos da OAB-SE
José Robson Santos de Barros

Comissão de Defesa de Direitos Humanos OAB-RO
Eduarda Meyka Ramires Yamada

Comissão de Direitos Humanos OAB-AL
Anne Caroline Fidelis de Lima

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Nota da AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul

A AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul -, vem a público prestar solidariedade ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, em virtude das declarações proferidas pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, no dia de hoje (29/7).

Suscitando saber como o pai do presidente da Ordem dos Advogados “veio a desaparecer no Rio de Janeiro”, o presidente da República aludiu que poderia lhe contar como é que “o pai dele desapareceu no período militar”, justificando, ainda, o assim chamado “desaparecimento”, à conta de sua vinculação com grupo militante contra a ditadura militar.

As afirmações do presidente da República insultam o advogado Felipe Santa Cruz, pela rememoração de um episódio por certo trágico em sua experiência pessoal, bem como representam a conspurcação das leis e da Constituição brasileira, visto que tendentes a justificar a tortura e a morte cometidas por agentes do Estado, quando, em absolutamente nenhum caso, a tortura e a morte podem ultrapassar a categoria de insuplantável interdito.

O exercício do mais alto cargo da estrutura pública brasileira exige decoro, serenidade e contenção verbal; a memória dos mortos no período autoritário brasileiro não pode ser vilipendiada; os governados do presente, todos eles, merecem respeito.

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Nota da Anistia Internacional

Sobre a declaração do presidente Jair Bolsonaro feita nesta segunda-feira, 29 de julho, sobre um dos desaparecidos políticos durante o período do Regime Militar, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, a Diretora Executiva da Anistia Internacional, Jurema Werneck disse:

“É terrível que o filho de um desaparecido pelo Regime Militar tenha que ouvir do presidente do Brasil, que deveria ser o defensor máximo do respeito e da justiça no país, declarações tão duras. O Brasil deve assumir sua responsabilidade, e adotar todas as medidas necessárias para que casos como esses sejam levados à justiça. O direito à memória, justiça, verdade e reparação das vitimas, sobreviventes e suas famílias deve ser defendido e promovido pelo Estado Brasileiro e seus representantes”.

“Defendemos a revogação da Lei de Anistia de 1979, eliminando os dispositivos que impedem a investigação e a sanção de graves violações de direitos humanos, a investigação e responsabilização dos crimes contra a humanidade cometidos por agentes do Estado durante o regime militar”, conclui Jurema Werneck, Diretora Executiva da Anistia Internacional no Brasil.

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Nota do Instituto Vladimir Herzog 

O Instituto Vladimir Herzog vem a público repudiar a mais recente declaração de Jair Bolsonaro. Nesta segunda-feira, o presidente da República disse que poderia explicar a Felipe Santa Cruz, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), como seu pai desapareceu durante a ditadura militar.

Felipe Santa Cruz, atual presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), é filho de Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, desaparecido em fevereiro de 1974, depois de ter sido preso no Rio de Janeiro por agentes do DOI-CODI – o órgão de repressão do governo brasileiro durante o regime militar. Até hoje, nunca houve confirmação oficial do que realmente aconteceu com ele.

Fernando era filho de Elzita Santa Cruz, ícone feminino da resistência à ditadura militar brasileira e da defesa dos direitos humanos, que morreu em junho de 2019, com 105 anos. Elzita repetia insistentemente a pergunta: “Onde está meu filho?” e dizia não ter medo de encontrar quem matou Fernando; queria o direito de enterrá-lo. “É uma dor muito grande porque o único crime que Fernando cometeu foi defender a igualdade social, essas coisas pelas quais deveríamos lutar até hoje”, disse em entrevista ao Diário de Pernambuco em 2009.

É de se lamentar profundamente que crimes como o desaparecimento forçado de Fernando Augusto Santa Cruz, que marcaram um dos mais terríveis períodos da história do nosso pais, sejam tratados de forma tão leviana, especialmente por quem hoje ocupa a presidência da República.

Entre 1964 e 1985, graves crimes contra a humanidade foram perpetrados por agentes do Estado brasileiro. Seus autores, no entanto, nunca foram julgados e as circunstâncias de boa parte desses crimes seguem sem esclarecimento. A tarefa permanente de fortalecer a democracia no país é indissociável dos deveres do Estado brasileiro de revelar a verdade sobre os crimes do período e de assegurar justiça a todos que sofreram com a violência de seus agentes.

Por isso, o Instituto Vladimir Herzog exige que as autoridades responsáveis investiguem a fala do presidente da República e possam, finalmente, dar uma resposta aos familiares de Fernando Augusto Santa Cruz e à toda sociedade brasileira sobre mais este crime cometido durante a ditadura militar.

Prestamos nossa solidariedade a Felipe Santa Cruz e reafirmamos nossa mais determinada disposição em seguir lutando pelos direitos humanos, o que inclui o direito à memória, à verdade e à justiça em relação às graves violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura militar.

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Nota da Amatra1 - Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região - Rio de Janeiro

A Amatra1 (Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região - Rio de Janeiro) vem manifestar publicamente seu repúdio às declarações do Sr. Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, em entrevista coletiva nesta segunda-feira (29), ao se referir de forma desrespeitosa à Ordem dos Advogados do Brasil, e ao seu Presidente, Dr. Felipe Santa Cruz, advogado que construiu sua trajetória na Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro.

A declaração do Sr. Presidente da República – “Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados [do Adélio>? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB?” – demonstra total desrespeito à autonomia dos órgãos da República e desconhecimento de suas funções. A OAB nada mais fez do que cumprir seu papel institucional, defendendo as prerrogativas dos advogados que tiveram, ao ver da instituição, seus direitos violados no exercício da advocacia.

O advogado, conforme reconhecido na Constituição da República (art. 133), é indispensável à administração da Justiça e exerce papel essencial de equilíbrio entre os diversos atores sociais.

A declaração do Sr. Presidente da República – “Se o presidente da OAB quiser saber como o pai desapareceu no período militar, eu conto para ele” –, referindo-se a triste episódio de nossa história republicana recente, em tom irônico, ofendeu a honra de todos os desaparecidos políticos. Ofendeu, igualmente, a honra do presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Felipe Santa Cruz, bem como a memória de seu pai, Fernando Santo Cruz, estudante de Direito, desaparecido aos 26 anos de idade.

A AMATRA1, principal entidade representativa dos Juízes do Trabalho no Rio de Janeiro, reconhece o papel fundamental da Ordem dos Advogados do Brasil na defesa do Estado Democrático de Direito e ratifica seu compromisso com os fundamentos da República Federativa do Brasil, consagrados no artigo 1º da Constituição, especialmente a dignidade da pessoa humana, profundamente atingida no episódio acima relatado.

Diretoria da AMATRA1

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Nota do IGP - Instituto de Garantias Penais 

O Instituto de Garantias Penais (IGP) vem a público apresentar sua inteira solidariedade ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, bem como à sua família, diante de declaração proferida pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, na manhã de hoje, 29 de julho de 2019. A preservação da democracia brasileira é dever de todas as autoridades públicas, especialmente daqueles que exercem seu cargo mais alto. Agressões pessoais, desrespeito à dor individual e banalização de graves violações de direitos humanos devem dar lugar a debates políticos que promovam o enriquecimento de ideias e a construção de um País justo e solidário. Felipe Santa Cruz tem conduzido com maestria uma das entidades mais importantes da sociedade brasileira, destacando-se pela sua liderança equilibrada e sensível, bem como pela defesa enfática da democracia e dos direitos humanos. A manutenção de um diálogo institucional de alto nível entre a OAB e os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário é fundamental para a defesa dos valores mais sagrados da Constituição Federal de 1988. Ao Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, rendemos nossa homenagem e apoio.

_________________

Associação dos Advogados de São Paulo – AASP, Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP, Movimento de Defesa da Advocacia – MDA, Centro de Estudos das Sociedades de Advogados – CESA e Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro – SINSA, vêm a público evidenciar sua solidariedade ao Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em face da recente manifestação do Senhor Presidente da República. Não se mostra aceitável a agressão à Advocacia; o desrespeito à dor e o ataque pessoal ao Presidente da OAB; tampouco, a violação dos valores inerentes à Democracia.

Movimento de Defesa da Advocacia – MDA
Eduardo Perez Salusse
Presidente

Associação dos Advogados de São Paulo – AASP
Renato José Cury
Presidente

Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP
Renato de Mello Jorge Silveira
Presidente

Centro de Estudos das Sociedades de Advogados – CESA
Carlos José Santos da Silva
Presidente

Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro – SINSA
Luis Otávio Camargo Pinto
Presidente

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Nota conjunta dos centros acadêmicos

Centro Acadêmico 22 de Agosto
Centro Acadêmico XI de Agosto
Centro Acadêmico João Mendes Júnior

A defesa da memória e verdade em tempos de avanço do obscurantismo e autoritarismo é necessária para que não se permita repetir o passado.

No dia 29 de julho, o presidente Jair Bolsonaro, em resposta à atuação da OAB no caso de Adélio Bispo, autor da facada da qual foi alvo durante a campanha presidencial de 2018, atacou diretamente o atual presidente da entidade de advogados, Felipe Santa Cruz, referindo-se ao desaparecimento de seu pai no período da Ditadura Militar. Fernando Santa Cruz era estudante de direito, militante da Ação Popular e foi preso por agentes da repressão do DOI-CODI em 1974, no Rio de Janeiro. Seu corpo nunca foi encontrado, mas a família não desistiu de buscar a verdade sobre o que de fato aconteceu com ele nos porões da ditadura.

O Presidente da República parece não compreender a relevância do cargo que ocupa, recusando-se a portar-se à altura de seu mandato, além de se afastar de qualquer forma de razão, para que assim possa florescer a sua irracionalidade e seus ideais de mundo que tem muito de distópicos. O cargo de Presidente da República exige uma conduta de respeito aos princípios e valores constitucionais e aos direitos individuais, políticos e sociais, bem como deve obediência à Constituição Federal, com o consequente zelo à dignidade da pessoa humana - que é basilar em nossa Carta Magna.

Suas declarações evidenciam, novamente, seu apreço pelo autoritarismo e pela tortura. É indiscutivelmente vil e antidemocrática a sua postura. É ainda mais estarrecedor que essas declarações surjam como uma reação à defesa (por parte da OAB) de um dos princípios fundantes do exercício da advocacia e, consequentemente, do Estado de Direito: a inviolabilidade do sigilo profissional do advogado.

São uma afronta, portanto, também aos direitos do advogado, do contraditório e do direito à ampla defesa, na medida em que incentivam a "criminalização do exercício advocacia" e exaltam as demais formas de autoritarismo bem como as atrocidades cometidas no período Ditatorial.

O período do Golpe Militar no Brasil foi concomitante a uma série de governos autoritários estabelecidos na América Latina. Indivíduos que representavam uma ameaça ao Estado, seja pela forma como pensavam, ou pela relevância e atuação na sociedade, foram presos, brutalmente torturados e, em muitos casos, mortos. Não havia liberdade de imprensa ou de manifestação.

É evidente que cada vez mais o Brasil sofre com retrocessos, abrindo mão da soberania nacional, perseguindo jornalistas, entidades, setores da sociedade e atacando a educação. É fundamental que nós, estudantes, estejamos engajados na defesa da memória e da verdade, como forma resistência, e na luta contra as investidas que ameaçam o conjunto da população brasileira, especialmente a mais fragilizada economicamente.

Desta feita cabe à nós, entidades representativas dos Estudantes de Direito das Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica e Universidade Presbiteriana Mackenzie, que juntamente com as demais Universidades desse país resistem às investidas do governo Bolsonaro contra o Estado Democrático de Direito e os Direitos Humanos, MANIFESTARMOS PROFUNDO REPÚDIO A DECLARAÇÃO OFERECIDA PELO PRESIDENTE.

Por fim, oferecemos nossa solidariedade ao Presidente Felipe Santa Cruz, bem como à todas as famílias que até hoje não sabem o paradeiro de seus entes desaparecidos em razão política, além do compromisso para que os crimes cometidos na ditadura sejam esclarecidos e a memória e a verdade preservadas.

São Paulo, 30 de julho de 2019.

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