Migalhas Quentes

Acolhimento institucional não deve ser imposto se há alternativa melhor para criança

4ª turma do STJ garante que criança fique com guardiães até Judiciário decidir em definitivo seu destino.

28/3/2019

A 4ª turma do STJ concedeu ordem em HC para garantir que uma bebê permaneça com os guardiães em detrimento do acolhimento estatal até a decisão definitiva das instâncias ordinárias.

O julgamento foi concluído nesta quinta-feira, 28, a partir do voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão.

A menina, atualmente com dez meses, é natural de Alagoas, filha de mãe soropositiva e desde o nascimento apresentou vários problemas de saúde. Como os pais não demonstraram interesse em assumir responsabilidade pela criança, um tio-avô entregou-a, com um mês de vida, para amigos - um casal paulista que está em 17º lugar no cadastro nacional de adoção para os parâmetros escolhidos.

Para regularizar a situação de cuidado, o casal requerente e os genitores ajuizaram pedido de guarda. Contudo, o juízo de 1º grau determinou busca e apreensão da criança e o acolhimento institucional, decisão mantida pelo Tribunal de origem.

O HC então buscou afastar a determinação de busca e apreensão da bebê em razão de sua suposta adoção irregular, por “maliciosa burla ao cadastro à adoção”.

Melhor interesse da criança

Ao analisar o caso, o relator lembrou que as medidas de proteção devem ser aplicadas sempre que as crianças ou os adolescentes estiverem em situação de risco, pois têm o objetivo precípuo de afastar ou evitar o perigo ou a lesão aos direitos tutelados pelo ECA. E que a atuação do juiz deve ser sempre pautada pela precisa identificação de situação concreta.

Portanto, devem-se afastar medidas que, embora prima facie pareçam atender ao caráter de proteção da norma, diante do caso concreto, revelam-se como excessivo formalismo a aviltar o melhor interesse da criança de conviver em um lar estabelecido.

Em outros termos, repita-se, a aplicação de medida protetiva de acolhimento institucional é regida pelo caráter de provisoriedade e excepcionalidade, deduzindo-se que sua duração deverá ser pelo menor tempo possível e só pelo imprescindível até o retorno da criança ou do adolescente à família natural ou adotiva, bem como não deverá ser imposta diante de outra alternativa que atenda ao melhor interesse da criança.

Apesar de mencionar jurisprudência do próprio STJ no sentido de aplicar eventual medida protetiva para evitar a formação de laços afetivos em situações em que a guarda tem indícios de ilegalidade, S. Exa. não concluiu como sendo o caso concreto.

A ordem cronológica de preferência das pessoas previamente cadastradas para a adoção não tem caráter absoluto, pois deverá ceder ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, a razão de ser de todo o sistema de proteção erigido pelo Estatuto, que tem na doutrina da proteção integral sua pedra basilar, máxima se não há nos autos nenhum indício real de fraude ou conluio.

Na sessão desta quinta-feira, 28, o ministro Marco Buzzi apresentou voto-vista divergindo do relator. O ministro votou pelo não conhecimento do habeas e, no mérito, levou em consideração os pareceres de psicólogos que apontam a não formação de laços afetivos no curto período do casal com a bebê, e que é notória a irregularidade na entrega da criança aos guardiães, que têm conhecimento do procedimento legal de adoção.

Para Buzzi, a defesa do melhor interesse da criança seria o acolhimento provisório institucional, assim como determinou o juiz e confirmou o tribunal, tanto em razão do pequeno lapso de tempo de convívio com os impetrantes, de modo a evitar o estreitamento dos laços afetivos, quanto para resguardar a adequada observância da lei, já que haveria evidência de prática de adoção à brasileira.

Após a divergência, o relator Salomão reforçou que não lhe pareceu nos autos a haja intenção de fraude – caso contrário, o casal “teria feito a adoção a brasileira típica, teriam ido ao cartório. Aqui eles pediram a guarda. É um indício mais do que cabal da boa-fé do casal”.

Vamos tirar essa criança deste casal que está com ela desde o 1º mês de vida, aplicando todos os cuidados para que não sofra as consequências drásticas da doença da mãe, ou vamos mantê-la com os guardiães? Eu não tenho coragem de fazer essa retirada”, destacou, ao citar também o fato de que o casal quer incluir a pequena no plano de saúde.

A ministra Gallotti acompanhou a divergência, entendendo que decisões do gênero podem “inviabilizar o cadastro de adoção”.

Os ministros Raul e o presidente da turma Antonio Carlos formaram a maioria com o relator. O ministro Raul ainda ponderou:

Não estamos fugindo aos procedimentos legais, mas apenas provisoriamente que a criança fique em ambiente melhor, recebendo atenção específica, direta e imediata do casal, e sem subtrair das instâncias ordinárias seu cumprimento de dever.”

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