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Íntegra da decisão do STJ que trancou ação contra acusados de matar calouro de Medicina da USP durante trote finalmente é publicada

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6/9/2006

 

Trancamento da ação penal

 

Íntegra da decisão do STJ que trancou ação contra acusados de matar calouro de Medicina da USP durante trote finalmente é publicada

 

O STJ trancou a ação penal em relação a todos os acusados, em fevereiro de 2005. Acórdão é publicado em setembro de 2006 (clique aqui e confira na íntegra o acordão).

 

Frederico Carlos Jaña Neto, Ari de Azevedo Marques Neto, Guilherme Novita Garcia e Luís Eduardo Passarelli Tirico ficaram livres da ação penal a que respondiam pela morte de Edison Tsung Chi Hsueh. Eles eram veteranos do curso de Medicina da Universidade de São Paulo e foram acusados de causar a morte por afogamento do calouro durante um trote.

 

O crime ocorreu em fevereiro de 1999. A denúncia oferecida pelo Ministério Público informa que os acusados estavam recepcionando os calouros, entre os quais Edison Hsueh. Aplicavam o tradicional trote, após a aula inaugural. Os calouros foram despojados de seus pertences, amarrados pelos pulsos com barbantes e submetidos a atos como arremesso de ovos, banho de ovo e farinha e pintura no corpo. Depois foram levados para a Avenida Dr. Arnaldo, seguindo para a Associação Atlética Acadêmica Oswaldo Cruz, onde foram lavados com água e sabão em um bosque e, posteriormente, obrigados a entrar na piscina. Durante os caldos e outras “brincadeiras” que foram aplicadas, acabou ocorrendo o afogamento de Hsueh.

 

A defesa entrou com pedido de habeas-corpus no Tribunal de Justiça paulista pedindo o trancamento da ação pelo reconhecimento de que a denúncia seria inepta (que omite os requisitos legais, ou se mostra demasiado contraditória e obscura, ou em patente conflito com a letra da lei). Como a Justiça paulista indeferiu o pedido, houve o pedido ao STJ, no qual quer ver reconhecida a falta de justa causa para a ação penal.

 

O relator do habeas-corpus, ministro Paulo Gallotti, destacou que, pelas peculiaridades do caso, apreciar a alegação demandaria a avaliação dos elementos que levaram à convicção do Ministério Público ao oferecer a denúncia, sem adentrar o exame das provas.

 

Segundo o ministro, os depoimentos prestados dão conta de que tanto houve calouros que participaram do trote que não se incomodaram, como houve os que se consideraram humilhados e desrespeitados, mas todos deixam certo que não há como pretender relacionar os acusados com a morte da vítima.

 

“Ainda que fossem veementes todos os depoimentos (e não o são) em afirmar que houve excessos, violência, agressões e abusos no ‘trote’, tais elementos de prova não se mostram suficientes para sustentar a acusação de homicídio qualificado imputada aos réus, por não existir, como acentuado, o menor indício de que o óbito da vítima tenha resultado dessas práticas”, entende o ministro.

 

Conforme ressalta o relator, o que os autos revelam é que tudo não passou de uma brincadeira – “de muito mau gosto” – em festa de estudantes. “A conclusão a que se chega certamente não é aquela pretendida por alguns, mas a verdade é que os autos não contêm elementos suficientes para dar curso à ação penal movida contra os pacientes por homicídio qualificado, isto sem deixar, mais uma vez, de lamentar profundamente a morte trágica do jovem Edison Tsung Chi Hsueh”. Com exceção do ministro Hamilton Carvalhido – que entendia que não se poderia, em habeas-corpus, apreciar o conjunto de provas –, o entendimento foi acompanhado pelos demais ministros da Sexta Turma.

 

1999

Em 22 de fevereiro de 1999, às 7 horas da manhã, os calouros assistiram à aula inaugural no teatro da faculdade. Após as palestras do diretor e de representantes da Associação Atlética e do Centro Acadêmico, foram avisados de que não precisariam participar do trote caso não desejassem. Quase todos aderiram ao ritual. Depois de deixar pertences pessoais como relógios, carteiras e camisetas em sacos plásticos, os estudantes tiveram os pulsos amarrados com barbantes. Bombardeados por ovos, tinta, farinha e violeta genciana, um corante usado em pesquisas de bactérias, seguiram até o busto de Arnaldo Vieira de Carvalho, primeiro diretor e patrono da faculdade, onde cantaram hinos, fizeram reverências e beijaram o chão.

Abusos durante o trajeto foram relatados no processo. Uma das brincadeiras impostas simulava uma partida de boliche. Um calouro, geralmente mais obeso, era a bola e os demais as garrafas. O aluno-bola era obrigado a rolar em direção aos pinos e derrubá-los. Alguns estudantes tiveram o braço engessado com o de um colega. Nas imagens das fitas de vídeo anexadas ao processo, calouros aparecem sendo chutados.

Depois das brincadeiras, os estudantes caminharam até a Associação Atlética. No bosque, foram lavados - os calouros pelas veteranas, as calouras pelos veteranos. Seguiram então até a arquibancada em frente à piscina. Enfileirados, acompanhados pelo som de uma bateria, entoaram alguns hinos. Ao ouvir gritos de ordem, caíram na água. Dois calouros relatam que, devido ao grande número de pessoas, aqueles que estavam na frente eram empurrados. 

 

Edison não foi visto perto da piscina. O calouro Wagner Hernandez foi, provavelmente, a última pessoa a falar com ele. Os dois conversaram brevemente na aula inaugural. Voltaram a se encontrar no trajeto entre o bosque e a arquibancada.

 

Filho de imigrantes chineses de Taiwan, de classe média, Edison não sabia nadar. De acordo com o laudo médico, ele morreu de asfixia mecânica. Entrou na água e não voltou a emergir. A lenta agonia durou entre três e cinco minutos. A piscina é profunda - tem entre 2 e <_st13a_metricconverter w:st="on" productid="4 metros">4 metros. Cerca de uma centena de alunos pulou ao mesmo tempo, provocando evidente situação de risco. A água estava turva devido ao excesso de tinta e aos restos da farinha despejada nos estudantes durante o trote.

 

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