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STF: Ensino domiciliar não cumpre dever de prover educação dos filhos

Recurso foi desprovido por ausência de lei. Não foi, por sua vez, julgada inconstitucional a prática do homeschooling.

12/9/2018

O ensino domiciliar não é meio lícito para cumprimento do dever de prover a educação dos filhos, previsto no artigo 205 da CF. Assim entenderam, por maioria, os ministros do STF em sessão plenária realizada nesta quarta-feira, 12.

A Corte finalizou o julgamento do RE 888.815, que discutia a possibilidade do homeschooling. Na última quinta-feira, 6, o relator da matéria, ministro Barroso, entendeu que o ensino domiciliar formal é compatível com a CF, razão pela qual votou pelo provimento do recurso. Nesta quarta, por sua vez, a maioria dos ministros votaram por desprover o recurso porquanto não há lei que discipline a prática. Esta não foi, por sua vez, julgada inconstitucional.

Com repercussão geral reconhecida, o recurso tem origem em MS impetrado pelos pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da secretária de educação do município de Canela/RS, que negou pedido para que ela fosse educada em casa, recomendando sua matrícula na rede regular de ensino. O recurso questiona atos do Juízo da Comarca de Canela e do TJ/RS que consideraram válida a decisão da secretaria.

Voto do relator

Na sessão passada, o ministro Barroso explicou que, no homeschooling, os pais ou responsáveis assumem a responsabilidade pela escolarização formal da criança. Para ele, a discussão não está em saber se o ensino domiciliar é melhor ou pior, mas envolve o “respeito às opções e circunstâncias de quem prefere um caminho diferente”.

Na visão do ministro, há razões relevantes e legítimas para que essa opção possa ser respeitada pela Constituição. Assim, rebateu argumentos contrários à prática e observou que a CF não trata dessa questão de forma específica, mas refere-se apenas ao ensino oficial, o que leva a diversas interpretações. De acordo com ele, a escolarização formal em instituição oficial não é o único padrão pedagógico autorizado pela CF, a qual, sob a ótica do relator, não exclui outros mecanismos.

Barroso destacou que as crianças em ensino domiciliar serão submetidas a exames periódicos. Ele também afirmou que a socialização é importante, mas considerou que as crianças podem conviver com outras em locais como igrejas, clubes desportivos e parques públicos.

O ministro citou vários princípios constitucionais importantes, entre eles os contidos nos artigos 205, 206 e 229, a serem aplicados no sentido do melhor interesse da criança e ressaltou que a CF coloca a família na frente do Estado no dever de prover educação.

Em seu voto, Barroso propôs a seguinte tese de repercussão geral:

“É constitucional a prática de ensino domiciliar (homeschooling) a crianças e adolescentes em virtude da sua compatibilidade com as finalidades e os valores da educação infanto-juvenil, expressos na Constituição de 1988.”

Veja a íntegra do voto do relator. 

Divergência

Na sessão desta quarta, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que há três tópicos a serem debatidos sobre o tema: (i) se há ou não vedação constitucional, uma vez que não há previsão expressa; (ii) caso não haja, quais modalidades seriam ou não permitidas; e, (iii) se não houver vedação para uma ou mais espécies, se é autoaplicável ou se necessitaria de regulamentação pelo Congresso.

Ele destacou que é obrigatório o ensino básico, que deve ser fornecido dos 4 aos 17 anos. Por outro lado, a CF não proíbe a possibilidade de que o ensino seja feito em casa. O que há, observou Moraes, é uma obrigatoriedade daquele que for fornecer o ensino básico seguir regras, estas sim presentes na CF, como por exemplo um conteúdo mínimo necessário.

Por conta disso, para ele há necessidade de regulamentação prévia que estabeleça requisitos, mecanismos de avaliação e fiscalização de frequência, que respeitem os mandamentos especialmente do art. 208, § 3º, da CF.

Assim, embora não entenda que a prática é inconstitucional, como ainda não há legislação que discipline o ensino domiciliar, este não pode ser autorizado. Moraes divergiu do relator para negar provimento ao RE.

Diante do voto, Barroso fez um aparte destacando que "condicioná-lo à vontade discricionária do legislador é frustrar uma possibilidade constitucional, amarrando-a a uma vontade legislativa”. “Se estabelecermos hoje que é ilegal até que a lei sobrevenha, nós jogaremos número relevante de famílias que optaram por esse método num limbo, sem nem permitir essa transição." Mas Moraes manteve sua posição.

O voto foi acompanhado pelos ministros Rosa Weber, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

Embora com argumentos diversos, o ministro Luiz Fux acompanhou a divergência de Moraes pelo desprovimento do RE. Para o ministro, por sua vez, o ensino domiciliar é inconstitucional. Em longo voto, Fux afirmou que “a especificidade do programa educacional brasileiro afasta a necessidade de ensino domiciliar para preservação de qualquer liberdade, quiçá religiosa”.

Ademais, ressaltou a importância do contato de crianças e adolescentes com a diversidade, a tolerância e a diferença. "O espaço público da escola constitui esse ambiente por excelência." Ele pontuou que o ensino domiciliar demanda altos investimentos, e que "um castelamento da elite brasileira propositalmente apartada do contato com as desigualdades sociais e econômicas pode provocar um enrijecimento moral", e, consequentemente, radicalismos de toda sorte. "Essa consequência vai de encontro à intenção do nosso constituinte, que prestigiou a igualdade de condições para acesso à escola."

Entendendo da mesma forma, pela inconstitucionalidade, votou o ministro Ricardo Lewandowski.

Prazo ao legislador

Com uma terceira posição, Edson Fachin votou por dar parcial provimento ao recurso, acompanhando o relator para reconhecer a legitimidade da pretensão de ver a educação domiciliar incluída na política publica domiciliar, porque entende que não há no texto constitucional norma que o impeça, mas desde que observados princípios ali estabelecidos. Ele divergiu do relator apenas quanto ao exercício em concreto de tal direito, reconhecendo a constitucionalidade, mas determinando que seja lançado apelo ao legislador, para que discipline a forma de execução e fiscalização do ensino domiciliar no prazo máximo de um ano.

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