A 2ª turma do STF iniciou, nesta terça-feira, 12, a apreciação do inquérito instaurado pelo ministro Gilmar Mendes para apurar o abuso de autoridade no uso de algemas e grilhões no ex-governador do RJ Sergio Cabral.
Ao ser transferido entre presídios, Cabral teria sido algemado nas mãos, pés e cintura pela Polícia Federal ao ser encaminhado ao IML de Curitiba para exames. Ao apresentar sua conclusão, Gilmar Mendes teceu duras críticas à atuação do MP e da PF, destacando a utilização de métodos ilegais para obtenção de colaboração premiada. Para o ministro, o Supremo precisa responder à atuação da PF e MP para evitar "tortura em praça pública."
Gilmar ainda sugeriu que há um concerto entre MP, Justiça Federal do Rio e a do Paraná para burlar decisões do STF.
Sérgio Cabral é condenado na Lava Jato a 87 anos de prisão e está preso desde novembro de 2016. Em outubro do ano passado, foi determinada a transferência de Cabral, do Rio para Curitiba, pelo juiz Bretas, do Rio. Decisão se deu após relatório do MP que apontou luxos e regalias recebidas pelo ex-governador na prisão de Benfica. O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, suspendeu a transferência.
Em janeiro, nova transferência foi determinada, do Rio para o complexo Penal de Curitiba, desta vez por ordem do juiz Moro, da 13ª vara de Curitiba, e também por Caroline Figueiredo, juíza substituta na 7ª vara do Rio. Em abril, após decisão da 2ª turma do STF, o ex-governador retornou ao Rio de Janeiro.
Na transferência realizada em janeiro, ao chegar ao IML de Curitiba escoltado por agentes Federais, o ex-governador estava algemado nas mãos, pés e cintura, situação que foi registrada pela imprensa, que aguardava sua chegada no local.
Diante da situação, o ministro Gilmar determinou a instauração de inquérito para apurar abuso de autoridade no episódio, o qual começou a ser apreciado hoje pela 2ª turma do Supremo.
Providências
O ministro Gilmar foi responsável por instruir todo o inquérito, distribuído a ele próprio por prevenção: ouviu agentes envolvidos, determinou a realização de perícia, examinou os vídeos, etc. Nesta terça, apresentou ao colegiado suas conclusões.
O ministro destacou que o uso da força pelo Estado sempre mereceu tratamento (art. 284 do CPP), e que o emprego da algema é permitido apenas em caso de resistência do preso, fuga ou perigo. Para ele, a forma de acorrentamento realizada em Cabral poderia ter justificativa em presos com histórico de violência e alta periculosidade – o que não era o caso.
“O escárnio do estado policial com as leis desse país me parece patente, a ponto de se dizer em alto e bom som que a súmula vinculante desta Corte não valia nada. (...) Indagado ao agente policial como a imobilização com algemas impediria potenciais agressões verbais contra o preso, respondeu ele que o preso poderia ficar alterado, e correr para o lado errado, atrapalhando a integridade física dele, que é o principal objetivo da escolta."
STF x MPF
Em sua fala, o ministro criticou veementemente a utilização de métodos ilegais para obtenção de delação. De acordo com Gilmar, um agente policial teria informado, em depoimento, que apenas delatores tinham tratamento melhor.
“Nós vamos pactuar com isso?”, alertou o ministro. Para Gilmar, o depoimento é revelador de um método que há muito vem sendo denunciado por advogados de presos. “É a volta do AI-5”, disse Gilmar. "Haverá tortura pelo MP". Ao que Toffoli respondeu: “a psicológica já está presente”.
Ele afirmou que se mostra aí um conjunto de práticas que precisam ser analisadas pela Corte. “Costumeiramente tenta-se contornar decisões da Corte, isto não é incomum, permitindo, por exemplo, uma nova ordem, um novo HC. Acaba chegando aqui uma reclamação porque, se as vezes em combinação com o MP, pede-se de novo uma prisão.”
Neste ponto, o ministro afirmou que tudo aponta para um pacto entre JF/RJ, JF/PR e MP. Ouça:
Ele destacou que já havia sido instaurado um inquérito em Curitiba para apurar o uso das algemas em Sérgio Cabral, mas nada se fez. “Um mero faz de conta.”
Gilmar lembrou que a PGR pediu o arquivamento do inquérito no Supremo. Falou, ainda, sobre procuradores que atacam a Corte, desqualificando seus magistrados, criticando decisões, com manifestações, por exemplo, pelo Twitter. “É preciso que nós respondamos”, advertiu, “evitando que em pouco tempo nos tenhamos tortura em praça pública. Caminha-se para isto".
Ao concluir, Gilmar propôs a submissão do inquérito à PGR, bem como ao Ministério De Segurança Pública, Conselho Nacional De Justiça e Conselho da Justiça Federal para providencias devidas.
Em seguida, o ministro Fachin observou que, ao discutir tema da competência atribuída ao Supremo e levar ao debate o alcance do supervisionamento de procedimentos investigatórios, há, na petição, uma coincidência no conteúdo da Pet 7321, de sua relatoria. Assim, o ministro pediu vista do inquérito e o adiamento da Pet.
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Processo: Inq 4.696