A Defensoria Pública da União entrou com um pedido de habeas corpus coletivo no STF com o objetivo de soltar os presos condenados que seriam beneficiados pelo indulto natalino concedido pelo presidente Michel Temer, em 2017.
O decreto presidencial foi suspenso em decisão cautelar proferida pela ministra Cármen Lúcia, durante o recesso do Judiciário, no âmbito da ADIn 5.874, a pedido da procuradora-Geral da República, Raquel Dodge. A suspensão foi mantida pelo relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, que já liberou o tema para análise do plenário.
No ação assinada pelo defensor nacional de Direitos Humanos, Anginaldo Oliveira Vieira, a Defensoria pede que a suspensão do decreto seja revista para que os juízes possam analisar os pedido de liberdade dos presos que teriam o direito com base no decreto de Temer. A instituição pede ainda que a ADIn que discute a validade do indulto seja suspensa.
"Inferno, caos, colapso, crise, absurdo, não faltam adjetivos e substantivos pejorativos para descrever as características do sistema penitenciário brasileiro. Quem aponta os impropérios são os próprios dados oficiais, as notícias dos jornais, as organizações internacionais, os órgãos da Justiça, os familiares dos presos e, sobretudo, os que deveriam ser chamados e tratados como 'reeducandos'", diz a Defensoria em um dos trechos da peça.
A DPU ainda argumenta que "de fato, tornar o indulto mais acessível para crimes sem violência e grave ameaça, no atual contexto de caos absoluto do sistema penitenciário brasileiro, é uma providência necessária, que não se distancia da ideia de remição de pena por violação da dignidade das pessoas privadas de liberdade no país".
"O que importa se alguns grandes possam ser beneficiados pelo indulto natalino de 2017 (o que nem foi comprovado), por não terem praticado crime com violência e grave ameaça, se essa providência vai salvar milhares de pequenos e violentados seres humanos que estão apodrecendo em masmorras tuberculentas em todo o país? É licito prejudicar ainda mais uma esmagadora maioria de presos pobres para não se favorecer poucos de posse? Isso é proporcional, já que se falou em proporcionalidade? Isso é com a razão? Com a Justiça? Certamente que não."
Suspensão
Ao pedir a suspensão do indulto natalino, Dodge considerou que Temer violou a CF ao permitir perdão de multas e penas patrimoniais — e não somente da pena de prisão —, ao viabilizar a paralisação de processos e recursos em andamento e ao extinguir a separação entre os poderes, na medida em que “subordinou” o Judiciário aos efeitos do ato presidencial. O indulto é o perdão total ao crime cometido pelo réu, sem necessidade de cumprimento de nenhuma pena restante.
A procuradora-Geral chama o ato do presidente de “arbitrário”, “inconstitucional” e “indiscriminado”, e afirma que ele favorece a impunidade, beneficia condenados por crimes de corrupção e é inválido sob a ótica da lei.
Ao decidir pela suspensão do decreto, em 28 de dezembro de 2017, Cármen Lúcia afirmou que as regras do decreto “dão concretude à situação de impunidade, em especial aos denominados ‘crimes de colarinho branco’, desguarnecendo o erário e a sociedade de providências legais voltadas a coibir a atuação deletéria de sujeitos descompromissados com valores éticos e com o interesse público garantidores pela integridade do sistema jurídico”. Para Cármen, “as circunstâncias que conduziram à edição do decreto, numa primeira análise, demonstram aparente desvio de finalidade”.
A ministra também afirmou que o decreto não cumpre a finalidade do indulto, pois “esvazia-se a jurisdição penal, nega-se o prosseguimento e finalização de ações penais em curso, privilegia-se situações de benefícios sobre outros antes concedidas a diluir o processo penal, nega-se, enfim, a natureza humanitária do indulto, convertendo-o em benemerência sem causa e, portanto, sem fundamento jurídico válido”.
Cármen Lúcia esclareceu que, pelo indulto, o criminoso ganha “uma nova chance de superar seu erro”. Segundo ela, “indulto não é prêmio ao criminoso, nem tolerância ao crime”. A ministra afirmou que, se a legislação não for cumprida à risca, o indulto se transforma em “indolência com o crime e insensibilidade com a apreensão social, que crê no direito de uma sociedade justa e na qual o erro é punido e o direito respeitado”. Ela concluiu dizendo que indulto fora da finalidade estabelecida na lei “é arbítrio”.
O ministro Barroso, relator, manteve a decisão. Ele também pediu a inclusão do caso na pauta de julgamentos do plenário da Corte, decisão que ficará a cargo da presidente do STF.
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Confira a peça.