O ministro Celso de Mello, do STF, concedeu HC a uma das investigadas na operação Sevandija, presa preventivamente desde maio, e assegurou que ela responda em liberdade a processo penal, sem prejuízo, se for o caso, de aplicação de medidas cautelares alternativas. Segundo o ministro, “a gravidade em abstrato do crime, qualquer que seja ele, não basta para justificar, só por si, a privação cautelar da liberdade individual de qualquer paciente”.
“O Supremo Tribunal Federal tem advertido que a natureza da infração penal não se revela circunstância apta, ‘per se’, a justificar a privação cautelar do ‘status libertatis’ daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.”
A operação Sevandija foi deflagrada em 2016 e apura diversas fraudes em contratos de licitações que somam R$ 203 milhões em Ribeirão Preto, interior de SP, segundo as investigações do MP e da PF. A denúncia chegou à promotoria em 2015 e, a partir dela, descobriu-se um esquema de recebimento de propina envolvendo honorários advocatícios, corrupção num contrato do setor de água e o uso de uma empresa terceirizada para empregar indicados por vereadores.
A paciente é ex-diretora da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Ribeirão Preto e estava presa preventivamente na Penitenciária Feminina de Sant'Ana, em SP, por suspeita de ser a operadora responsável pelo controle de pessoas indicadas por vereadores de Ribeirão Preto, dentro de um esquema de compra de apoio para a base aliada da ex-prefeita da cidade Dárcy Vera.
HC
“A análise do ato decisório de primeira instância que decretou a prisão preventiva da ora paciente permite reconhecer a inadequação, em face da jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, dos fundamentos invocados pelo ilustre Magistrado local em relação à ora paciente, considerado, em tese, o papel que teria desempenhado na suposta organização criminosa.”
De acordo com o ministro Celso de Mello, a análise dos autos revela que a paciente teria desempenhado papel secundário, sem maior protagonismo, nos eventos que lhe foram atribuídos pelo MP, “sendo certo, ainda, que a paciente em questão – quando lhe foi concedida liberdade provisória, em momento anterior, em razão de medida liminar deferida pelo Superior Tribunal de Justiça –, aparentemente não incidiu, em mencionado período, em condutas inadequadas ou desviantes que pudessem comprometer ou frustrar os atos de persecução penal”. Segundo Celso de Mello, a paciente não integra o núcleo principal definido na peça acusatória do MP.
“Todos sabemos que a privação cautelar da liberdade individual é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade (HC 93.883/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RHC 105.776/PA, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), sendo de repelir-se, por inaceitáveis, discursos judiciais consubstanciados em tópicos sentenciais meramente retóricos, eivados de generalidade, destituídos de fundamentação substancial e reveladores, muitas vezes, de linguagem típica dos partidários do “direito penal simbólico” ou, até mesmo, do “direito penal do inimigo”, e que, manifestados com o intuito de impor indevidas prisões cautelares ou de proceder a inadequadas exacerbações punitivas, culminam por vulnerar, gravemente, os grandes princípios liberais consagrados pela ordem democrática na qual se estrutura o Estado de Direito, expondo, com esse comportamento, uma inadmissível visão autoritária e nulificadora do regime das liberdades fundamentais em nosso País (HC 85.531/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).”
O HC foi impetrado pelo advogado Ronaldo Augusto Bretas Marzagão, da Advocacia Ronaldo Marzagão.
-
Processo: HC 145.631
Veja íntegra da decisão.