"Se todos os advogados, no exercício da profissão, ofenderem a honra da parte antagônica ou do magistrado, haverá um benefício ou malefício à sociedade e à resolução das demandas judiciais? Indubitavelmente, haveria malefício. Os conflitos multiplicar-se-iam."
Diante da reflexão filosófica acima, o juiz de Direito Carlos Gustavo Fernandes de Morais, entendeu que é necessário estabelecer limites à previsão de imunidade profissional contida no Estatuto da OAB. O magistrado é relator de caso envolvendo promotor e advogados que aportou na turma julgadora Cível e Criminal da 6ª região - 1ª sub-região. Seu voto foi acompanhado à unanimidade pelo colegiado. Com a decisão, foi determinado o prosseguimento de TCO - Termo Circunstanciado de Ocorrência lavrado contra quatro advogados por suposto crime de injúria.
Queixa por injúria
A defesa relatou que os pacientes, na condição de representantes locais da OAB, divulgaram nota oficial contra conduta de um procurador do MP/GO. Dias antes, o integrante do órgão ministerial teria utilizado "termos e expressões que resultaram em ofensa direta aos requeridos, bem como toda a classe de advogados". Após a publicação do texto, contudo, o promotor registrou queixa por suposta injúria.
Imunidade limitada
Em seu voto, o magistrado ponderou que a interpretação irrestrita à normativa que prevê a imunidade profissional ao advogado (artigo 7º, parágrafo 2º da lei 8.906/94) pode trazer prejuízos sociais, sendo necessário estabelecer limites.
“A importância do tema surge da necessidade de se resguardar o direito à honra de toda a população. A interpretação absoluta da imunidade resultaria em negativa generalizada do direito à honra de todas as pessoas, sob o pretexto de que se está a litigar em juízo."
Sobre o tema, o juiz discorreu sobre o conceito de Justiça sustentada no clássico "A República", de Platão, com referências à ideia do bem e do que é justo e benéfico à maioria, e relacionou à filosofia de Immanuel Kant, pressupondo que se deve investigar qual é o bem de uma norma.
Considerados tais argumentos, fez a indagação sobre o benefício ou malefício à sociedade se advogados ofenderem a honra da parte contrária ou do magistrado. "Indubitavelmente, haveria malefício, os conflitos se multiplicariam." Diante da reflexão filosófica, o relator frisou que, nessa linha de raciocínio, em virtude dos riscos à paz social que o dispositivo carrega, a interpretação à norma da imunidade profissional do advogado deve ser restritiva.
"O alcance da imunidade profissional deve ser limitado apenas às ofensas estritamente necessárias e intrínsecas às teses defensivas. [...] [Analisando] o caso concreto, percebe-se que as ofensas constantes na 'nota de repúdio' não têm relação com quaisquer teses defensivas e sequer foram produzidas na ação judicial proposta pelo promotor de Justiça em face dos advogados."
Veja a íntegra da filosófica decisão.