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Pedido de vista adia julgamento que discute legitimidade para execução de pena de multa

STF definirá se multa resultante de condenação tem natureza penal e deve ser executada pelo MP ou se deve ser considerada dívida de valor a ser cobrada pela Fazenda Pública.

23/11/2016

O STF iniciou nesta quarta-feira, 23, o julgamento de questão de ordem na AP 470. A União pede a reconsideração de decisão do ministro Luís Roberto Barroso, que assentou a legitimidade do MP para exigir judicialmente, perante a vara de Execução Penal, o valor das multas fixadas, nos termos do artigo 164 da lei de execução penal. Após os votos dos ministros Luís Roberto Barroso, relator, e Dias Toffoli, favoráveis a legitimidade prioritária do MP, e do ministro Marco Aurélio, que abriu a divergência, pediu vista o ministro Edson Fachin.

A União sustenta que o artigo 164 da LEP foi tacitamente revogado pela lei 9.268/96, que deu nova redação ao artigo 51 do CP, ao estabelecer que "a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição". Nesse sentido, a União alega que "a própria multa, embora não tenha perdido sua origem penal, transmudou-se em 'dívida de valor' e que, a partir da edição da lei 9.268/96, o Ministério Público não dispõe de legitimidade para executar tais multas".

A União pede a reconsideração da decisão "a fim de se determinar a legitimidade da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para a execução das multas resultantes das condenações proferidas nesta ação penal".

Relator, o ministro Barroso manteve seu posicionamento na plenária desta quarta. Para ele, a pena de multa, embora convertida em dívida de valor, não perde seu caráter de sanção criminal, e por ser uma pena, enseja a legitimação prioritária do MP para sua cobrança. “A sentença penal condenatória já é um título executivo, portanto, não há nenhuma necessidade de inscreve-la como dívida ativa para executar.”

“A CF/88 incumbiu o MP de ser o titular da ação penal e a lei complementar 75/93 impõe ao MP o dever de fiscalizar a execução da pena, inclusive a execução da multa de natureza penal.”

De acordo com o ministro, o fato de a lei se referir a “dívida de valor”, não retira o caráter de pena da multa. “Ela é também dívida de valor, mas é essencialmente uma pena de natureza criminal.”

“Por ser, em primeiro lugar, uma pena criminal é natural a primazia do MP para a cobrança da multa. Até mesmo pelo fato de que a postura do apenado com relação ao cumprimento da sanção pecuniária interfere no gozo dos benefícios a serem usufruídos no curso da ação penal.”

Em seu voto, o ministro defendeu a possibilidade de que, caso o MP não venha a promover a execução da pena de multa, a Fazenda Nacional pode fazê-la. “Por ser também dívida de valor em face do Poder Público, deve-se admitir subsidiariamente que a advocacia da Fazenda Pública a cobre.

“A seriedade com que se está tratando a multa penal na AP dá a multa um novo papel dentro do contexto da execução penal brasileira, em que ela era tratada como uma dívida de valor e, portanto, a fazenda Pública faz juízos completamente diferentes do que faz o MP a propositivo da conveniência e oportunidade de cobrança dessa dívida.”

O ministro Toffoli acompanhou o voto do relator, entendendo pela natureza penal da multa.

Divergência

O ministro Marco Aurélio abriu a divergência. Para ele, é a Fazenda Pública que possui legitimidade para executar a multa e não há que se falar em competência concorrente, uma que vez que a legitimação concorrente pressupõe a competência de um único juízo, e o MP não pode atuar nas varas de Execuções Fiscais, por exemplo.

“A partir do momento em que haja o trânsito em julgado do título condenatório, não se tem mais uma pena em termos de processo crime a ser executada, quanto à multa imposta, mas sim uma dívida de valor, uma dívida ativa da Fazenda."

Salientou ainda que a mudança no CP não permite mais a transformação da multa em prisão e afirmou que a manutenção da natureza penal da multa pecuniária decorrente de condenação penal com trânsito em julgado é, na prática, a manutenção da prisão por dívida, contrariando jurisprudência já firmada pelo STF e violando o Pacto de São José da Costa Rica sobre Direitos Humanos.

Para ele, o STF não poderia colocar de lado a mudança do CP, mediante a qual não há possibilidade de transformar-se a multa em pena restritiva da liberdade. “Articular, no caso de não pagamento da multa, com questão alusiva ao cumprimento da pena é olvidar-se da mudança substancial ocorrida, e, mais ainda, cogitar-se de aplicação da LEP para ter-se regressão do regime de pena, é olvidar-se que o Tribunal já decidiu que não pode haver prisão por dívida.”

O ministro Ricardo Lewandowski não votou, mas adiantou seu posicionamento no mesmo sentido. De acordo com ele, com o advento lei 9.268/96 ficou tacitamente revogado o artigo da LEP que estabelecia o rito de cobrança pelo MP, "transmudou-se a natureza dessa multa de penal para a dívida de valor".

Dívida Ativa

Ao trazer questão de fato ao julgamento, a advogada-Geral da União, Grace Mendonça, pontuou que o valor total de multas penais já inscritas em dívida ativa da União gira em torno de R$ 305 milhões. Desse montante, segundo ela, referente a R$ 60 mi, ainda não há o ajuizamento de ação, mas referente a R$ 240 mi, sim. Especificamente em relação à AP 470, Grace ressaltou que já há 30 milhões inscritos em dívida ativa pela Fazenda Pública com base no artigo 51 do CP.

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