Migalhas Quentes

Suspenso julgamento sobre fornecimento de remédios de alto custo e sem registro

Até o momento, apenas o ministro Marco Aurélio, relator, proferiu voto.

15/9/2016

Pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso suspendeu nesta quinta-feira, 15, o julgamento conjunto de dois REs que tratam do fornecimento de remédios de alto custo não disponíveis na lista do SUS e de medicamentos não registrados na Anvisa.

O relator dos processos, ministro Marco Aurélio, único a proferir voto na sessão, votou no sentido que o Estado pode ser obrigado a fornecer remédios de alto custo, desde que comprovadas a imprescindibilidade do medicamento e a incapacidade financeira do paciente e sua família para aquisição. No entanto, para ele, a obrigação não pode prevalecer quando os remédios não são registrados pela agência reguladora.

RE 566471

No caso do RE 566471, o Estado do RN se recusou a fornecer medicamento – citrato de sildenafila - para uma senhora idosa e carente, alegando que o alto custo e a ausência de previsão no programa estatal de dispensação de medicamentos seriam motivos suficientes para recusa. A idosa acionou a Justiça para pleitear que o estado fosse obrigado a fornecer o fármaco. A sentença de primeiro grau determinou a obrigação do fornecimento, decisão que foi confirmada pelo TJ.

Durante seu voto, o ministro Marco Aurélio pontuou que saúde é um direito de todos e dever do Estado, devendo ser garantido por políticas sociais e econômicas. Para o ministro, o acesso à saúde é um bem vinculado à dignidade do homem, e que o direito ao mínimo existencial é um direito fundamental do cidadão, estando ligado a condições mínimas de dignidade.

“Objeções de cunho administrativo não podem subsistir ante a existência de violação ao mínimo existencial. Argumentos genéricos não possuem sentido prático em face de inequívoca transgressão a direitos fundamentais. Não se trata de defender interferência judicial em políticas públicas, mas de assentar a validade da atuação judicial subsidiária em situações não alcançadas por essas políticas públicas.”

Para o ministro, a judicialização, nos casos em que verificada transgressão ao mínimo existencial, é plenamente justificada, independentemente da existência de reserva orçamentária. O relator verificou que o STF, há muitos anos, vem assegurando acesso a medicamentos para os mais necessitados.

O ministro apontou dois critérios para que o Judiciário possa concretizar o direito à saúde: a imprescindibilidade do medicamento para o paciente e a incapacidade financeira para sua aquisição, do beneficiário do fármaco e de sua família, responsável solidária.

Por fim, apresentou a seguinte tese a ser aplicada na repercussão geral:

“O reconhecimento do direito individual ao fornecimento pelo Estado de medicamento de alto custo não incluído em política nacional de medicamentos ou em programa de medicamentos de dispensação em caráter excepcional, depende da comprovação da imprescindibilidade, adequação e necessidade, e da impossibilidade de substituição do fármaco e da incapacidade financeira do enfermo e dos membros da família solidária, respeitadas as disposições sobre alimentos dos artigos 1.694 a 1710 do Código Civil.”

RE 657718

No caso do RE 657718, o TJ/MG negou o pedido da autora da ação, que precisava do medicamento cloridrato de cinacalcete, sem registro na Anvisa à época do ajuizamento da ação. O tribunal estadual entendeu que, apesar de o direito à saúde estar previsto nos artigos 6º e 196 da CF, não se pode obrigar o Estado a fornecer medicamento sem registro na Anvisa, sob pena de vir a praticar autêntico descaminho. O TJ ressaltou a inexistência de direito absoluto e, tendo em vista a prevalência do interesse coletivo, bem como dos princípios do artigo 37 da CF, “a competência do administrador público para gerir de maneira proba e razoável os recursos disponíveis”. O ministro Marco Aurélio concordou com a decisão do TJ.

O ministro lembrou que o artigo 12 da lei 6.360/76 dispõe que nenhum medicamento pode ser industrializado, comercializado ou entregue ao consumo sem registro no Ministério da Saúde. Segundo Marco Aurélio, juízes e tribunais não podem colocar cidadãos em risco determinando o fornecimento de medicamentos quando não haja consenso científico, revelado mediante registro no órgão competente, conforme exigido no diploma legal.

Repercussão geral

O relator salientou que, nos dois recursos em julgamento, os casos concretos não estavam mais em análise, uma vez que no primeiro processo o medicamento foi incluído na lista de remédios disponíveis pelo SUS e, no outro caso, o fármaco já foi registrado pela Anvisa. Mas como os processos tiveram repercussão geral reconhecida, o ministro frisou que o interesse coletivo se sobrepunha ao individual no sentido de ver a controvérsia analisada pelo Supremo e citou parágrafo único do artigo 998 do CPC/15, o qual estabelece: “A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.”

Veja a íntegra do voto do relator no RE 566471 e no RE 657718.

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