“Estamos caminhando e amadurecendo, graças a Deus e aos brasileiros, para um amadurecimento democrático na sociedade brasileira a demandar não mais uma reforma do Poder Judiciário, mas uma transformação do Poder Judiciário, no sentido de ser coerente com as demandas que a sociedade nos impõe.”
O discurso da ministra Cármen Lúcia na tarde desta terça-feira, 17, foi proferido em meio a julgamento na 2ª turma do STF. Continuando, a atual vice-presidente do STF – e que assume o comando da Casa e do CNJ no 2º semestre – destacou:
“A própria justiça eleitoral tem de ser refeita: ela serviu à década de 40. A estrutura dela, com leigos, com pessoas que advogam até às seis da tarde, sendo assim como juiz de sete às onze, não funciona mais. Isso não é uma sociedade do século XXI.
Precisa de ser repensado como um todo: qual a justiça que temos e qual a que queremos ter e qual a sociedade exija que se tenha?”
Citando Campos Sales, a futura presidente da Casa ponderou: "Essas reflexões são talvez das mais importantes que se tenha hoje em matéria de Direito Constitucional do Brasil. Porque nós somos, nós o Poder Judiciário, guarda da Constituição. Ora, é da Constituição de hoje, do mundo de hoje, do Brasil de hoje."
O caso em pauta, e que ensejou as manifestações, diz respeito a civis que foram julgados pela Justiça Militar por fraude contra o FGTS.
O relator do caso, ministro Teori, concedeu o habeas por entender que não haveria possível ofensa à administração militar, requisito indispensável à fixação da competência. O ministro acolheu o parecer da PGR de que “o fato de os responsáveis pela empresa, contratada pela unidade militar, serem acusados da falsificação das guias de recolhimento do FGTS, com a consequente frustração de direitos trabalhistas, não é suficiente para atrair a competência da Justiça Militar, sendo consabido que a submissão dos civis à jurisdição militar é admitida apenas em casos excepcionais”.
O ministro Celso de Mello, que presidia o julgamento, afirmou que não tem sentido que civis estejam sujeitos à persecução penal da justiça castrense. “Em jogo está no fundo postulado básico de nossa organização constitucional, que é o princípio do juiz natural.”
Então, chega a vez do ministro Gilmar Mendes, que pondera sobre a necessidade da Corte “evoluir para compreender a Justiça Militar como ramo da Justiça Federal”, de modo a deixar claro que não se pode admitir o julgamento de civis por parte da jurisdição militar tal como hoje está estruturada, sem as garantias adequadas.
No caso concreto, os ministros seguiram à unanimidade o voto do relator Teori pela concessão da ordem.
Um pouco mais à frente e, em outro HC (que tratava da substituição de internação de adolescente por liberdade assistida), a ministra Cármen voltou a falar sobre o papel do Judiciário nos tempos modernos.
De acordo com a ministra, há uma mudança do que é a jurisdição hoje. Citando o trabalho dos últimos dois anos da campanha que coordena da Justiça pela paz em casa, a vice-presidente falou das "redes de sustentabilidade humana" nas varas especializadas de violência doméstica.
"Estamos criando redes paralelas com a coordenação dos juízes e repensando a jurisdição extra autos, porque se não vai voltar o conflito. Temos que repensar o papel dos juízes, como tenho dito a esses das varas especializadas de violência doméstica, temos que ser juízes de paz, no sentido da pacificação. Daqui a pouco teremos que caminhar por este caminho também na área criminal. Fechei os autos e acabou meu papel? Não, na sociedade não. O ministro Gilmar tem chamado a atenção desse desastroso sistema penitenciário, em dizer que temos tudo a ver com isso. Nós que mandamos prender, temos que saber para onde estamos mandando o preso e como é que ele vai viver lá dentro."
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Processo relacionado: HC 128.414 e HC 126.754