Na 1ª audiência pública da comissão que analisa o pedido de impeachment da presidente Dilma, os deputados ouviram os juristas Miguel Reale Júnior e Janaina Paschoal.
Juntamente com o jurista Hélio Bicudo, eles são autores da denúncia contra Dilma com base na edição de decretos de suplementação financeira sem autorização do Congresso e nas chamadas "pedaladas fiscais", ou seja, o uso de recursos de bancos públicos, como o BB e o BNDES, para quitar compromissos de programas sociais do governo. O pedido de impeachment de Dilma foi protocolado em outubro do ano passado e aceito pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, no início de dezembro.
Para Reale Júnior, não há dúvidas sobre a gravidade dos fatos nem sobre a qualificação de crime de responsabilidade. O jurista calcula que as "pedaladas fiscais" de Dilma, iniciadas em 2014, continuaram em 2015 movimentando cerca de R$ 40 bi.
"As pedaladas fiscais se constituíram em um expediente malicioso por via do qual foi escondido o déficit fiscal. E foi por via das pedaladas que se transformou despesa em superávit primário. No momento em que se quebra o equilíbrio fiscal, há como um jogo de quebra de dominó que leva à inflação, à recessão e ao desemprego. Operações de crédito que foram feitas por longo prazo, em quantias exorbitantes que não se confundem com aquilo que pode se chamar de fluxo de caixa e que pode ter ocorrido no governo Fernando Henrique e no governo Luiz Inácio da Silva."
Segundo o jurista, a União contraiu empréstimos com instituições que ela mesma controla – como BB, CEF e BNDES, o que é proibido pela lei de Responsabilidade Fiscal. Janaina Paschoal acusou o governo de desrespeito constante à lei. "Eles acreditam que o BNDES, o BB e a CEF são deles. Até porque só os amigos foram beneficiados.”
Como os supostos crimes ocorreram em período eleitoral, Reale e Janaína também veem configurações de crimes comum e de falsidade ideológica de Dilma. Janaina Paschoal ainda citou conexão desses casos com a corrupção na Petrobras, já que as "pedaladas" e os decretos estariam ajudando a cobrir o que ela chama de "sangria" de recursos da estatal.
Devido ao não registro das operações junto ao BC, Reale considera que houve falsidade ideológica. “Falseou-se uma realidade fiscal que o País não tinha". Ele também acusou o governo de "sequestrar a esperança" do Brasil devido às perdas de credibilidade e de confiança.
Janaina Paschoal rebateu o discurso de golpe por trás do pedido de impeachment. "A frase que diz 'impeachment sem crime é golpe' é verdadeira. A questão aqui é que estamos diante de um quadro em que sobram crimes de responsabilidade."
Para Reale Junior, o fato de o TCU e o Congresso Nacional ainda não terem apreciado as contas de Dilma Rousseff de 2015 – que são o alvo da denúncia de impeachment – não impede a caracterização de crime de responsabilidade da presidente da República. "O crime já está consumado."
O líder do PSDB, deputado Antonio Imbassahy, avaliou que os depoimentos reforçam a convicção em torno do impeachment de Dilma. Já o deputado Wadih Damous, vice-líder do PT, viu viés político e falta de domínio sobre os temas nos argumentos dos juristas. A audiência pública foi tensa, com bate-boca entre parlamentares e gritos de "impeachment já" e de "não vai ter golpe" vindos dos manifestantes. A reunião durou pouco mais de duas horas e foi encerrada, segundo o presidente da comissão, deputado Rogério Rosso, devido à Ordem do Dia do Plenário da Câmara.
A segunda audiência pública da Comissão Especial do Impeachment está marcada para a manhã desta quinta-feira, 31. Serão ouvidos o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e o professor de Direito Tributário da UERJ, Ricardo Lodi Ribeiro, indicados por deputados governistas.