De acordo com a procuradora regional da República Silvana Batini, do MPF/RJ, "foi a primeira vez que a Justiça brasileira reconheceu que determinados crimes cometidos durante o período da ditadura militar configuram crimes contra a humanidade”.
A defesa dos réus sustentou no HC, com pedido liminar, a incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, sob alegação de que “está a tratar de competência em razão da matéria, cujo critério estabelecedor é o bem jurídico penalmente tutelado, representado no presente caso pela vida humana, não se podendo federalizá-la, eis que não a vida não pertence ao Estado, mas sim ao indivíduo”. Alegou que todos os denunciados ainda são militares, o que atrai a competência da Justiça Castrense.
Em decisão monocrática proferida em agosto, o desembargador Federal Messod Azulay Neto, relator, chegou a deferir o pedido liminar, suspendendo o andamento da ação. Na ocasião, o magistrado entendeu estar configurada a presença do fumus boni iuris. Isso porque a data para o início da instrução processual já estava marcada e, devido à complexidade da questão, ressaltou ser necessário cautela e um estudo aprofundado das teses explicitadas.
No julgamento do mérito realizado ontem, Azulay Neto entendeu que se trata de crime permanente, ou seja, crime que, em tese, ainda continua sendo perpetrado porque o corpo de Rubens Paiva não foi localizado.
Para o desembargador, embora a lei de anistia tenha sido declarada constitucional pelo STF não atinge crimes comuns como o homicídio doloso qualificado e a ocultação de cadáver. Segundo o magistrado, há jurisprudência concluindo pela negação da anistia a pessoas que cometeram crimes em nome da luta contra a ditadura e, sendo assim, o mesmo entendimento deve ser aplicado aos militares que praticaram sequestros, torturas e assassinatos.
Azulay Neto destacou ainda que o Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, incorporada ao sistema legal brasileiro em 1998, a qual prevê que as leis internas do país que prevejam anistia não podem se sobrepor ao acordo que trata, entre outras questões, dos chamados crimes contra a humanidade.
"Estamos tendo uma oportunidade ímpar de prestar contas à sociedade, como deve ocorrer nas democracias maduras".
O crime
De acordo com o MPF, Rubens Paiva foi morto em janeiro de 1971 nas dependências do Destacamento de Operações de Informações - DOI do I Exército, na Tijuca, Rio de Janeiro. Além de homicídio doloso e ocultação de cadáver, José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos respondem pelos crimes de associação criminosa armada e fraude processual.
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Processo: 0104222-36.2014.4.02.0000