Filosofia, Ética, Processo... Em dez semestres, dezenas são as disciplinas às quais os bacharéis em Direito devem dedicar-se. Foco de atenção especial durante a XXII Conferência Nacional dos Advogados, os jovens advogados e estudantes de Direito têm um novo desafio para o exercício da advocacia atualmente.
Para além do conhecimento técnico inerente à profissão, o destaque no competitivo mercado de trabalho jurídico dependerá de habilidades de empreendedorismo e gestão.
Traço cultural
Com quase 900 mil advogados, há tempos que a saturação do mercado virou dado preocupante para os causídicos, e o empreendedorismo bem-vindo em outras carreiras tornou-se necessidade. Contudo, entre a teoria e a prática há um longo caminho a percorrer.
O professor da Faculdade de Economia e Administração da USP Marco Aurélio Gumieri Valério destaca que o advogado sofre uma série de restrições éticas no intuito de evitar que ele siga por um caminho empreendedor em busca de seu espaço no mercado jurídico.
“Aprendemos nos bancos escolares que a ‘advocacia’ e o ‘empreendedorismo’, que o ‘mercado’ e a ‘direito’ são termos conflitantes.” Em outras palavras, o advogado aprende a lidar com o escritório na base da tentativa e do erro.
“Isso é um traço cultural: na Austrália, os escritórios de advocacia podem negociar ações em bolsa. Mais mercantil que isso impossível.”
Habilidades de gestão
De acordo com o presidente da Comissão Nacional de Apoio aos Advogados em Início de Carreira, Rodrigo Otávio Soares Pacheco, o escritório tem como desafios o atendimento de qualidade ao cliente; a gestão administrativo-financeira; e o controle ético e normativo e foco nos resultados.
O financeiro tende a ser a área de maior dificuldade: “A gestão financeira é uma área delicada para os advogados que devem compreender e otimizar o custo do escritório para ensejar uma política justa e competitiva de honorários.”
Marisa leva em consideração que há uma distinção entre o excelente advogado e proprietário do escritório e o gestor da banca, que não necessariamente precisam ser a mesma pessoa.
“O gestor deve ser um profissional com perfil de liderança, com forte capacidade de agregação porque terá que trabalhar como o elo de ligação entre os diversos setores do escritório.”
Ferramentas à mão
Na busca por agregar práticas empreendedoras, as tecnologias podem ser grandes aliadas dos advogados, seja na gestão da carreira própria ou de uma banca.
Software de controle processual e que integre o fluxo de informações do escritório, processos digitalizados em arquivo virtual – eis alguns dos requisitos que otimizam o trabalho advocatício.
“Os movimentos internos desde a chegada de um novo cliente, de uma nova ação, de uma nota de expediente, da pauta de prazos e audiências entre tantos outros processos e fluxos precisam estar previstos e desenhados.” Marisa Golin da Cunha destaca ainda que o controle financeiro também deve estar alicerçado em aplicativos confiáveis que registrem os históricos e permitam previsões orçamentárias para o negócio da banca.
Outra característica do negócio privado que pode ser apropriada pelo advogado é o marketing. “Investimento no marketing digital é muito importante, com criação de website, newsletter eletrônica, marketing de busca”, afirma Rodrigo.
Preparo
De acordo com o ICAJ - Índice de Confiança dos Advogados na Justiça, pesquisa de 2014 da USP coordenada pelos professores Marco Aurélio e Claudio de Souza Miranda, tiveram ampla aceitação dos causídicos a inclusão nos currículos das seguintes disciplinas:
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Marketing jurídico, com 76,6 em 100;
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Contabilidade e Finanças, 77,2 em 100; e
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Gestão de Escritório, com 83,9 em 100.
A Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP tem a disciplina de Contabilidade e estuda incluir uma disciplina de Gestão em seu currículo, mas a maioria dos cursos jurídicos não incluíram no currículo tradicional disciplinas de gestão e empreendedorismo.
Assim, antes mesmo do surgimento de tais desafios, os estudantes e jovens profissionais que queiram se diferenciar no mercado devem buscar conhecimentos nas áreas de negócio, como a participação em cursos de extensão e a frequência a disciplinas optativas ou de outro curso.
Práticas
Pensando justamente nesse preparo que a OAB/SP recentemente firmou convênio com o Sebrae para o fomento de ações voltadas ao desenvolvimento sustentável dos pequenos negócios da advocacia , com o lançamento do programa “ Advocacia Empreendedora”.
O convênio prevê a realização de cursos nas áreas de marketing, planejamento e finanças, recursos humanos, além do desenvolvimento da Cartilha "Comece Certo: Escritórios jurídicos”, que irá abordar o empreendedorismo, gestão e trará orientações específicas para os advogados. Segundo Bruno Caetano, diretor-superintendente do Sebrae/SP, os cursos terão módulos com duração de 3 horas e os advogados receberão certificado de conclusão.
A parceria estabelece ainda a disponibilização de ferramentas para que os advogados possam solucionar os problemas sem precisar de ajuda externa; a divulgação das atividades e eventos; a identificação, planejamento, acompanhamento e avaliação de ações de orientação.
Outro exemplo que demonstra a importância do tema foi a adesão do escritório Felsberg Advogados ao programa Brasil+Competitivo. Instituído pelo PL 6.558/13, o programa visa fomentar o empreendedorismo, aumentar a competitividade empresarial e facilitar o acesso a capital privado de crescimento para PMEs.
Atualmente, o Brasil+Competitivo tramita na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, cujo parecer do relator concluiu pela adequação financeira e orçamentária do PL e, no mérito, pela sua aprovação.
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