Migalhas Quentes

Advogado comenta os limites de atuação da imprensa em casos de grande comoção

Tragédia na boate Kiss serve de combustível para a cobertura maciça dos veículos de comunicação.

5/2/2013

No último dia 27 de janeiro, o choque tomou conta da sociedade brasileira com a notícia do falecimento de dezenas de jovens em incêndio na cidade gaúcha de Santa Maria. A tragédia ocorreu na boate Kiss, ao que parece causada pelo disparo de um sinalizador durante o show pirotécnico da banda Gurizada Fandangueira. O alto número de vítimas (237 até o momento), bem como o perfil dos que tiveram a vida ceifada (jovens universitários), servem de combustível para a cobertura maciça dos veículos de comunicação.

Em casos assim, surge a discussão sobre as possibilidades de atuação da imprensa. Acerca do tema, entrevistamos o advogado Rubens Decoussau Tilkian, sócio do escritório Decoussau Tilkian Advogados.

 

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1 – Em casos de grande comoção social, quais os limites de atuação da imprensa ?

Não é tarefa fácil encontrar os limites da imprensa responsável, principalmente em situações de repercussão nacional e internacional, em que os chamados “furos jornalísticos” se sobrepõem ao dever e aos limites de transmitir informação. Nesse contexto, há nítida e inegável colisão de direitos fundamentais constitucionais; de um lado, o que protege a liberdade de expressão (inciso IV, do artigo 5º e artigo 220 da CF), sendo vedada a censura (§ 1º, art. 220 da CF) e, de outro, os direitos e garantias intrínsecos ao indivíduo, a saber, a intimidade, a privacidade, a honra, a imagem e o nome (inciso V e X, do artigo 5º, da Constituição Federal e artigos 11, 12 e 17, do Código Civil).

Frente ao poderio que adquiriu no mundo contemporâneo, a imprensa deve agir com a virtude da razão: a prudência. Precisa ser ética e limitar-se a veicular somente informação de interesse público, sem juízo de valor e sem qualquer caráter sensacionalista, esses últimos para simplesmente atrair a curiosidade popular e prestigiar o interesse econômico em detrimento dos valores básicos que sustentam um Estado democrático de direito.

2 – Em que medida excessos cometidos por parte dos veículos podem prejudicar a percepção da sociedade sobre o caso ?

A mídia, ao transmitir informação, notadamente na cobertura de eventos de comoção social, deve redobrar a atenção e o senso de responsabilidade, evitando, assim, a ocorrência dos inaceitáveis “julgamentos midiáticos”. Tal conduta acaba por induzir a opinião popular e, ainda, conferir a imprensa ilegítimo poder de investigar, julgar e condenar um determinado cidadão. Não há dúvidas de que foi ao Poder Judiciário que o Estado conferiu o indelegável direito de julgar e condenar. Assim, a imprensa deve exercer amplamente – e da forma mais ampla possível -, o seu dever de informar, restringindo-se a não deturpar ou radicalizar os fatos, sob pena de, indiretamente, sentenciar, perante a opinião pública, um dado indivíduo que sequer tenha sido condenado.

A Constituição da República estabelece a presunção de inocência até decisão final transitada em julgado, com o desiderato de se observar os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, nos meios estabelecidos pelos Tribunais pátrios.

3 – Qual a influência da cobertura da imprensa na própria condução da investigação e do processo ?

A produção de informação pela mídia, isenta de imparcialidade, gera pré-julgamentos, por vezes, até daqueles que conduzem e participam da investigação e ou do processo. Esse círculo vicioso, composto por mídia banalizada e anseio popular por respostas e providências imediatistas dos órgãos públicos responsáveis, acaba sendo pernicioso e coloca em risco toda a sociedade. Tal processo cria falsa legitimação de democracia, porquanto culmina com o inverso do preconizado pela Carta Magna: o individuo é culpado, salvo se provar o contrário!

4 – Quais as principais precauções que jornalistas devem tomar ao realizar coberturas como a do incêndio em Santa Maria/RS ?

O jornalista deve ser prudente e limitar-se a informar o fato da forma mais objetiva possível. Deve investir-se de extremada responsabilidade ao realizar a cobertura de tamanha tragédia, certificando-se de que as informações divulgadas são precisas e atendem ao interesse público. Jamais o ímpeto mercantilista e sensacionalista deve prevalecer sobre o dever de informar. Exageros perpetrados, nesses casos, não têm retorno, seja para envolvidos, seja às vítimas, seja às famílias que perderam seus entes queridos.

O papel fundamental da mídia é o de acompanhar de perto e noticiar os desdobramentos do fato, aproximando e orientando a população do ocorrido e, ao mesmo tempo, exercendo um importantíssimo papel fiscalizador e preventor em prol da sociedade.

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