Migalhas Quentes

Intervalo intrajornada parcial gera horas extras

SDI-1 do TST restabelece decisão do TRT.

5/12/2012

A SDI-1 do TST condenou os empregadores de um trabalhador rural, cortador de cana, a lhe pagar integralmente as verbas relativas ao intervalo intrajornada – período concedido ao empregado para descanso e alimentação – que ele havia usufruído parcialmente.

O empregado ajuizou a ação na 1ª vara do Trabalho de Assis/SP após ser demitido sem justa causa tendo trabalhado para os empregadores durante 17 anos, no período de 1988 a 2005. Após apurar que ele usufruía apenas parte do intervalo intrajornada, o juízo condenou as empresas a lhe pagarem o restante em horas extras.

O TRT da 15ª região ampliou a condenação para uma hora por dia trabalhado, na forma da indenização prevista no artigo 71 da CLT.

As empresas recorreram e conseguiram excluir a indenização da condenação na 5ª turma do TST, com o entendimento que o referido artigo celetista é aplicável ao trabalhador urbano e não se estende ao rural. O empregado interpôs embargos à SDI-1, discordando da decisão.

A relatora do recurso na sessão especializada, ministra Delaíde Miranda Arantes, deu razão ao empregado, informando que o TST já pacificou entendimento sobre o assunto. "A não-concessão ou a concessão parcial do intervalo mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (artigo 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração".

___________

ACÓRDÃO

SDI-1

GMDMA/MOV

RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. INTERVALO INTRAJORNADA. RURÍCOLA. APLICAÇÃO DO ART. 71, § 4.º, DA CLT. Nos termos do item I da Súmula 437 do TST, a não concessão total ou parcial do intervalo intrajornada de uma hora ao trabalhador rural acarreta o pagamento do período total, acrescido do respectivo adicional, por aplicação subsidiária do art. 71, § 4.º, da CLT. Recurso de embargos conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista n.° TST-E-RR-137400-33.2005.5.15.0036, em que é Embargante F.S.C. e são Embargados MARCOS FERNANDO GARMS E OUTRO.

A 5.ª Turma entendeu inaplicável o art. 71, § 4.º, da CLT ao trabalhador rural e com isso deu provimento ao recurso de revista dos reclamados para excluir da condenação o pagamento de indenização pelo não-cumprimento do intervalo intrajornada.

O reclamante interpõe recurso de embargos. Alega que o rurícola é beneficiário da norma contida no art. 71 da CLT. Requer o pagamento do intervalo intrajornada suprimido. Colaciona arestos à divergência.

Impugnação não apresentada.

Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2.º, II, do RITST.

É o relatório.

VOTO

1 - CONHECIMENTO

Atendidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passa-se ao exame dos específicos do recurso de embargos, que se rege pela Lei 11.496/2007.

1.1 - INTERVALO INTRAJORNADA. RURÍCOLA. APLICAÇÃO DO ART. 71, § 4.º, DA CLT

A 5.ª Turma entendeu inaplicável o art. 71, § 4.º, da CLT ao trabalhador rural e com isso deu provimento ao recurso de revista dos reclamados para excluir da condenação o pagamento de indenização pelo não-cumprimento do intervalo intrajornada. Registrou:

"O Regional condenou o reclamado ao pagamento de horas extras, referentes ao período não usufruído do intervalo intrajornada, consignando:

'2.1 - DO INTERVALO INTRAJORNADA

A origem deferiu ao trabalhador, como horas extras, o tempo de intervalo não gozado, qual seja, 30 minutos nos dias efetivamente trabalhados nas safras (exceto a de 2005) e 40 minutos em dois das por semana, com reflexos em dsr's, férias mais 1/3, 13º salários e FGTS + 40% (F. 208/209).

O autor insiste no pagamento integral do intervalo mínimo de uma hora, com amparo na OJ n. 307 da SBDI I do C. TST (f. 219/221).

Os reclamados, por outro lado, sustentam que as regras do art. 71 da CLT não se aplicam aos rurícolas, devendo ser excluído da condenação o pagamento do intervalo intrajornada não usufruído. Sucessivamente, punam pela reforma do julgado quanto aos reflexos deferidos, alegando que a verba ostenta natureza indenizatória (f. 231/232).

Tem razão somente o reclamante.

Ressalvo entendimento pessoal e acompanho entendimento da colenda Turma no sentido de que o art. 4º do Decreto 73.626/74 não albergou o rurícola sob o pálio da CLT porque o art. 71 desta última estabelece o limite mínimo e máximo do descanso intervalar, impossibilitando, de outra parte, o seu fracionamento. Isto, no entanto, não pode levar á conclusão simplista que do rurícola poder-se-ia exigir trabalho extenuante durante 8h sem a necessária parada para repor suas energias. O art. 5º, § 1º do Decreto 73.626/74 cuidou, em conseqüência, complementar o texto da lei, não só assegurando o direito ao gozo de, no mínimo, 1 hora, mas acenando, também, com a possibilidade do seu elastecimento conforme 'usos e costumes da região'.

A não concessão, total ou parcial, do intervalo intrajornada mínimo para repouso e alimentação implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), conforme entendimento consubstanciado na OJ 307/SDI-1/TST, mesmo porque, no horário do intervalo, o empregado deveria estar descansando e não produzindo.'

Nas razões de recorrente, alega violação dos arts. 5º da Lei 5.889/73, 71, caput e § 4º, da CLT, além de trazer divergência jurisprudencial (fls. 259-261).

À análise.

Debate-se nos autos se ao empregado devem ser aplicadas as normas do artigo 71 da CLT, ou o art. 5º da Lei nº 5.889/73, quanto ao intervalo intrajornada.

No que se refere ao intervalo intrajornada do rurícola, estabelece-se no art. 71 da Consolidação das Leis do Trabalho o seguinte:

'Art. 71. Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de seis horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de uma hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de duas horas'.

Todavia, o trabalhador rural possui norma própria sobre o intervalo intrajornada (artigo 5º da Lei 5.889/73), dispondo, textualmente:

'Em qualquer trabalho contínuo de duração superior a seis horas, será obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação observados os usos e costumes da região, não se computando este intervalo na duração do trabalho. Entre duas jornadas de trabalho haverá um período mínimo de onze horas consecutivas para descanso'.

Assim, enquanto o dispositivo da CLT fixa o mínimo de um hora e o máximo de duas horas diárias para o intervalo intrajornada e admite que haja prorrogação por acordo individual ou coletivo de trabalho, a norma específica dos rurícolas não fixa nenhum parâmetro, apenas remete aos usos e costumes da região.

Evidenciada a existência de norma específica ao trabalhador rural, não há como se conceder horas extras com base em dispositivo da CLT (art. 71, § 4º).

Vale ressaltar que o Decreto nº 73.626/74, que regulamenta a Lei nº 5.889/73, enumera, no artigo 4º, os dispositivos da CLT aplicáveis às relações de trabalho rural. Desse rol, contudo, não consta o art. 71 da CLT.

Nesse sentido já decidiu esta Corte:

'TRABALHADOR RURAL. INTERVALO INTRAJORNADA. A partir do momento em que há norma específica para o trabalhador rurícola em que não foi fixada uma unidade de tempo destinado para o intervalo intrajornada, porque se remeteu aos usos e costumes da região, não há como se albergar a norma do art. 71 da CLT, que prevê a duração de uma hora para tal intervalo. Ora, como a lei dos rurícolas não fixa o período do descanso, entende-se como usual e costumeiro aquele para o qual o trabalhador foi contratado, pois do contrário os sindicatos rurais já teriam se insurgido contra a não-observância do costume regional. Recurso desprovido' (RR-2.303/2003-117-15-00, DJ de 09/09/2005, Rel. Min. Barros Levenhagen).

'RURÍCOLA INOBSERVÂNCIA DO INTERVALO INTRAJORNADA PARÂMETRO USOS E COSTUMES DA REGIÃO ART. 5º DA LEI Nº 5.889/73 INAPLICABILIDADE DA INDENIZAÇÃO PREVISTA NO ART. 71, § 4º, DA CLT. 1. O fato de a Constituição Federal haver equiparado o trabalhador rurícola ao urbano (CF, art. 7º) não significa dizer que as normas especiais, nos capítulos específicos, tenham sido revogadas, até porque a Carta Magna não disciplinou, nos seus diversos incisos do referido art. 7º, a questão do intervalo intrajornada, devendo ser observados os preceitos vigentes, no caso, os arts. 71 da CLT e 5º da Lei nº 5.889/73. 2. Assim, a partir do momento em que há norma específica para o trabalhador rurícola em que não foi fixado o tempo destinado para o intervalo intrajornada, porque se remeteu aos usos e costumes da região, não há como se albergar a norma da CLT que prevê o intervalo de uma hora para tal intervalo. 3. Na hipótese dos autos, o Regional assentou que em algumas ocasiões, o Reclamante não gozou do intervalo intrajornada nos moldes do art. 5º da Lei nº 5.889/73, deferindo-lhe a indenização prevista no art. 71, § 4º, da CLT. 4. Todavia, cumpre destacar que o Decreto nº 73.626/74, que disciplina a aplicação das normas concernentes às relações individuais e coletivas de trabalho rural, estatuídas pela Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, lista em seu art. 4º todos os preceitos da CLT aplicáveis às relações de trabalho rural, não constando no citado dispositivo legal a referência ao art. 71 da CLT. 5. Se fosse intenção do legislador estender ao rurícola a regra do § 4º do art. 71 da CLT, que foi acrescida pela Lei nº 8.923/94, teria procedido a idêntica alteração na leis especial, o que não ocorreu. 6. Nessa linha, não se aplica ao trabalhador rural a indenização pelo descumprimento do intervalo intrajornada, nos termos do art. 71, § 4º, da CLT' (RR- 2.148/2003-021-23-00, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DJ 21/10/2005).

Ante o exposto, CONHEÇO da revista, no particular, por violação do art. 71, § 4º, da CLT.

2. MÉRITO

Em face do conhecimento do recurso de revista por violação do art. 71, § 4º, da CLT, o seu provimento é medida que se impõe.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso de revista para excluir da condenação o pagamento de indenização pelo não-cumprimento do intervalo intrajornada, e seus reflexos, previsto no art. 71, § 4º, da CLT."

O reclamante alega que o rurícola é beneficiário da norma contida no art. 71 da CLT. Requer o pagamento do intervalo intrajornada suprimido. Colaciona arestos à divergência.

Os paradigmas colacionados, oriundos da 6.ª e 2.ª Turmas, sufragam tese divergente da esposada pela 5.ª Turma no sentido de que o disposto no art. 71, § 4.º, da CLT se aplica aos trabalhadores rurais.

CONHEÇO do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial.

2 - MÉRITO

2.1 - INTERVALO INTRAJORNADA. RURÍCOLA. APLICAÇÃO DO ART. 71, § 4.º, DA CLT

Esta Corte já pacificou entendimento sobre a matéria, conforme entendimento consolidado no item I da Súmula 437, de seguinte teor:

"INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 307, 342, 354, 380 e 381 da SBDI-1) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.

[...]" (Grifos Nossos)

Nesse cenário, DOU PROVIMENTO ao recurso de embargos para restabelecer a decisão do Tribunal Regional.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer a decisão do Tribunal Regional.

Brasília, 22 de novembro de 2012.

DELAÍDE MIRANDA ARANTES

Ministra Relatora

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