A 7ª turma do TST restabeleceu sentença que condenou a empresa Rodoviário Goyaz Ltda a indenizar uma empregada que foi dispensada quando estava grávida e posteriormente recusou a voltar ao trabalho. No entendimento da turma, a recusa da gestante em retornar ao emprego não retira seu direito à indenização compensatória.
A empregada foi contratada para exercer a função de auxiliar de escritório, em fevereiro de 2007, e foi dispensada, sem justa causa, no dia 7/5/11, sendo que em 4/1/12 foi a data de nascimento de seu filho. Em março de 2012, ela reclamou direito à indenização na 10ª Vara do Trabalho de Goiânia. Na sentença, o juízo informou que, em princípio, a estabilidade gestacional da empregada se estenderia até o dia 4/6/12, conforme ADCT, artigo 10, II, b e a súmula nº 244, II, do TST. Todavia, uma vez que ela desistiu de retornar ao emprego, o juízo limitou o direito à indenização à data da sentença (16/4/12).
No entanto, o TRT da 18ª região acatou recurso da empresa, e indeferiu a verba à empregada, entendendo que a estabilidade provisória assegurada à gestante visa a garantia do emprego da trabalhadora e "não os salários do período sem a correspondente prestação de serviços, de forma que a pretensão restrita ao pagamento de indenização substitutiva aliado à recusa de retorno ao emprego implica renúncia a essa garantia".
A empregada recorreu ao TST, sustentando que não "houve renúncia ao direito à estabilidade gestante por ter-se recusado a retornar ao emprego e ter pedido somente a indenização", como alegou a empresa, "pois o tempo de estabilidade já havia transcorrido quase em seu total, devendo-se levar em consideração que o direito é mais do nascituro do que da mãe, sendo, assim, irrenunciável".
Ao examinar o recuso da empregada na 7ª turma, a ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora, afirmou que, considerando a função da social do trabalho, comumente se aplica a reintegração ao emprego, em casos análogos. "Contudo, a prudência indica que a adoção irrestrita dessa prática gera, por vezes, resultados antagônicos ao fim social da norma". Segundo a relatora, advém daí a previsão do artigo 496 da CLT, que trata da conversão da reintegração em indenização.
A relatora esclareceu ainda que "a recusa da empregada em retornar ao trabalho não prejudica o recebimento da indenização compensatória relativa à estabilidade infligida, porquanto se trata de prerrogativa irrenunciável". Transcreveu diversos precedentes do Tribunal julgados nesse sentido.
Assim, deu provimento ao recuso da empregada para restabelecer a sentença quanto ao pagamento da indenização relativa à estabilidade gestacional. Seu voto foi seguido por unanimidade.
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Processo relacionado: RR-452-37.2012.5.18.0010
Veja a íntegra da decisão.
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ACÓRDÃO
7.ª Turma
GMDMA/ASS/lps/sm
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. GESTANTE. RECUSA DE RETORNO AO EMPREGO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DIREITO INDISPONÍVEL. INDENIZAÇÃO CABÍVEL. Demonstrada possível violação do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido.
II - RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. GESTANTE. RECUSA DE RETORNO AO EMPREGO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DIREITO INDISPONÍVEL. INDENIZAÇÃO CABÍVEL. Vigora nesta Corte o entendimento de que a responsabilidade do empregador quanto à estabilidade da gestante tem caráter objetivo, bastando para a sua concessão a reunião de dois requisitos: gravidez na vigência do contrato e dispensa imotivada. A recusa da gestante em retornar ao emprego não elide o recebimento da indenização compensatória. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n.° TST-RR-452-37.2012.5.18.0010, em que é Recorrente SHIRLEI FRANCISCA LOPES e Recorrida RODOVIÁRIO GOYAZ LTDA.
O Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 18.ª Região denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela reclamante, por não vislumbrar ofensa direta e literal de dispositivo constitucional, tampouco contrariedade a Súmula indicada.
Inconformada, a reclamada interpõe agravo de instrumento, sustentando que seu recurso de revista tinha condições de prosperar. Renova os argumentos relativos à estabilidade provisória.
Foram apresentadas contrarrazões e contraminuta.
Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, consoante o art. 83, § 2.º, II, do RITST.
É o relatório.
VOTO
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO
1 - CONHECIMENTO
Preenchidos os requisitos legais de admissibilidade, CONHEÇO do agravo de instrumento.
2 - MÉRITO
O recurso de revista da reclamante teve seu seguimento denegado pelo juízo primeiro de admissibilidade, aos seguintes fundamentos:
"PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS
Tempestivo o recurso (acórdão publicado em 03/07/2012 - fl. 15; recurso apresentado em 11/07/2012 - fl. 17).
Regular a representação processual (fl. 35-processo digital).
Dispensado o preparo (fl. 13-autos físicos).
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS
Rescisão do Contrato de Trabalho / Reintegração/Readmissão ou Indenização / Gestante.
Alegação (ões):
- contrariedade à Súmula 244, II/TST.
- violação dos artigos 10, II, 'b', do ADCT e 5º, XXXV, da CF.
- violação de legislação infraconstitucional e divergência jurisprudencial.
A Recorrente insurge-se contra o acórdão, sustentando que não houve renúncia ao direito à estabilidade gestante por ter-se recusado a retornar ao emprego e ter pedido somente a indenização, pois o tempo de estabilidade já havia transcorrido quase em seu total, devendo-se levar em consideração que o direito é mais do nascituro do que da mãe, sendo, assim, irrenunciável. Sustenta que a proteção constitucional está vinculada tanto à reintegração quanto à indenização. Por fim, diz que tem direito à tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva.
Consta do acórdão (fl. 09):
'EMENTA. GESTANTE. RECUSA DE RETORNO AO EMPREGO EM AUDIÊNCIA. RENÚNCIA À ESTABILIDADE PROVISÓRIA. A estabilidade provisória prevista no artigo 10, II, 'b' do ADCT, visa garantir o emprego da empregada gestante e não os salários do período sem a correspondente prestação de serviços, de forma que a pretensão restrita ao pagamento de indenização substitutiva aliado à recusa de retorno ao emprego implica renúncia a essa garantia, por demonstrar claramente a falta de interesse na manutenção do posto de trabalho pela obreira.'
Ante a restrição do artigo 896, § 6º, da CLT, não cabe análise de divergência jurisprudencial e de ofensa a preceito legal.
A prestação jurisdicional foi entregue devidamente, não tendo razão a Recorrente no tocante à assertiva de violação direta e literal do inciso XXXV do artigo 5º da CF.
Por outro lado, o posicionamento regional não contraria a Súmula em destaque nem ofende o outro preceito constitucional citado, pois não tratam especificamente da circunstância ocorrida nos autos, em que foi reconhecida a renúncia da Reclamante à sua estabilidade de gestante por ela ter recusado injustificadamente a reintegração oferecida pela empresa ainda dentro do prazo de reintegração.
CONCLUSÃO
DENEGO seguimento ao Recurso de Revista."
Nas razões do agravo de instrumento, a reclamante pretende a reforma da decisão quanto ao tema. Sustenta que a estabilidade provisória compreende norma de ordem pública, não podendo, por conseguinte, ser renunciada. Assevera se tratar de tutela ao nascituro e que a recusa da empregada em retornar ao emprego não pode ser entendida como renúncia à estabilidade. Renova a divergência jurisprudencial, a arguição de violação dos arts. 5.º, XXXV, da Constituição Federal e 10, II, "b", do ADCT, e contrariedade à Súmula 244, II, do TST.
A estabilidade provisória da empregada gestante, a que alude o art. 10, II, "b", do ADCT, tem como fato gerador dois requisitos objetivos, quais sejam, a gravidez na vigência do contrato de trabalho e a dispensa imotivada.
Trata-se de direito indisponível do trabalhador e encargo social do empregado, decorrente, pois, da sua responsabilidade objetiva. Independe, portanto, de qualquer condição que não as já mencionadas.
Considerando a função social do trabalho, comumente se aplica a reintegração da obreira em casos análogos, com vistas a uma maior eficácia da norma constitucional. Contudo, a prudência indica que a adoção irrestrita dessa prática gera, por vezes, resultados antagônicos ao fim social da norma. Daí advém a previsão do art. 496 da CLT.
Nesse sentido, admite-se que a recusa da empregada em retornar ao trabalho não prejudica o recebimento da indenização compensatória relativa à estabilidade infligida, porquanto se trata de prerrogativa irrenunciável.
Com efeito, convém transcrever os seguintes precedentes:
"RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º 11.496/2007. GESTANTE. ESTABILIDADE. RECUSA À OFERTA DO EMPREGO EM AUDIÊNCIA. DIREITO À PERCEPÇÃO DA INDENIZAÇÃO ESTABILITÁRIA. O direito à estabilidade, assegurado à gestante, cumpre dupla finalidade: primeiro, proteger a trabalhadora contra possível ato discriminatório do empregador e, segundo, garantir o bem-estar do nascituro. Trata-se, desse modo, de direito de que não pode dispor a empregada gestante, porquanto a consequência de seu ato atingirá também o nascituro. A recusa à proposta de reintegração, portanto, não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade provisória a que se refere o artigo 10, I, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Recurso de embargos a que se nega provimento." (TST-E-RR-268400-18.2004.5.09.0018, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, SBDI-1, DEJT 7/4/2009)
"ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE RECONSIDERAÇÃO DA DISPENSA RECUSA DA EMPREGADA EM ACEITAR O EMPREGO EM AUDIÊNCIA. RENÚNCIA À ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INEXISTÊNCIA. Dois são os pressupostos para o direito à garantia de emprego da empregada gestante: a gravidez na vigência do contrato de trabalho e a dispensa imotivada. A boa-fé do empregador, na rescisão do contrato de trabalho, na hipótese em que não tem ciência da gravidez, ou mesmo após a rescisão, quando reconsidera a dispensa e coloca o emprego à disposição da empregada gestante, não elide a ilegalidade da denúncia unilateral desmotivada do contrato de trabalho, fato gerador da garantia prevista no art. 10, II, b, do ADCT da Constituição da República de 1.988, cuja proteção atinge também a esfera de direitos do nascituro. Recurso não conhecido." (TST-E-RR-99640-16.2005.5.15.0015, SBDI-1, Rel. Min. Horácio Senna Pires, DJ - 26/10/2007)
"RECURSO DE REVISTA. GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. RECUSA DE RETORNO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE RENÚNCIA À ESTABILIDADE. A dispensa da empregada gestante, por ato unilateral do empregador viola o princípio da garantia de emprego consagrada constitucionalmente. Uma vez exercido o ato potestativo de dispensa o arrependimento do empregador não é basta para retirar da empregada a indenização correspondente ao período de garantia de emprego. A alegação da empregada de que o retorno do emprego seria inconveniente por receio de perseguição ou hostilidade, não pode ser tido como renúncia à garantia constitucional. Recurso de Revista conhecido e provido." (TST-RR-12100-86.2008.5.15.0123, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6.ª Turma, DEJT 19/3/2010)
"RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. AUSÊNCIA DE PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO. RECUSA DE RETORNO AO EMPREGO. RENÚNCIA NÃO CONFIGURADA. COMUNICAÇÃO. EXIGÊNCIA. Nos termos do art. 10, II, -b-, do ADCT, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Analisando o tema, esta Corte Superior tem fixado o entendimento de que, para que a empregada tenha assegurado o seu direito ao emprego ou à reparação pecuniária, devem coexistir dois pressupostos: a concepção no curso da relação de emprego e a dispensa não motivada pela prática da falta funcional prevista no art. 482 da CLT. Assim, a estabilidade da gestante tem início com a confirmação da gravidez e se estende até cinco meses após o parto, recaindo sobre o empregador o ônus de, ao despedir a empregada gestante, arcar com a obrigação de indenizar, de forma integral, todo o período da estabilidade constitucional, em decorrência da responsabilidade objetiva da empresa nessa matéria, conforme reconhecido pelo STF. De outro lado, o reconhecimento do direito à reintegração à empregada gestante não a impede de postular, exclusivamente, a indenização, conforme se observa do item II da Súmula nº 244 desta Corte. E, ainda, não afasta o direito ao pagamento da indenização - decorrente da estabilidade - o desconhecimento do estado gravídico pelo empregador (Súmula nº 244, II) ou a recusa da empregada em retornar ao emprego. Com efeito, o escopo da garantia constitucional não se restringe à dispensa arbitrária da empregada, por estar grávida; mas, de forma principal, a tutela do nascituro, restando impossível conferir à recusa de retorno ao emprego -status- de renúncia da reclamante ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade provisória prevista no art. 10, II, -b-, do ADCT/88. Recurso de revista conhecido e provido." (TST-RR-2425700-39.2002.5.02.0902, Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa, 1.ª Turma, DEJT 4/12/2009)
"ESTABILIDADE-GESTANTE. INDENIZAÇÃO. PERÍODO JÁ EXAURIDO. DEMORA NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. I - O art. 10, II, alínea "b", do ADCT não previu nenhuma garantia no emprego ou estabilidade provisória. Ali o Constituinte se limitou a proibir momentaneamente o exercício do poder potestativo de resilição, cuja infringência abre para a empregada o direito à percepção de uma indenização correspondente ao período de proibição do exercício daquele poder. II - Não se revela juridicamente razoável a tese da renúncia ou desistência tácita ao benefício, extraída do fato de a ação ter sido proposta depois de vencido o prazo de proibição do exercício do poder potestativo de resilição, ou mesmo da circunstância de ela recusar a proposta de retorno ao trabalho ou ainda da constatação de que já teria conseguido outro emprego. III - É que o decurso do prazo constitucional só teria relevância se ao tempo da propositura da ação houvesse transcorrido o biênio prescricional, enquanto a tese da renúncia tácita faz tábula rasa do princípio segundo o qual a renúncia de direitos, sobretudo de direitos trabalhistas, há de ser, em regra, expressa, ao passo que a recusa ao retorno do serviço, quer o seja manifesta ou inferida da obtenção de outro emprego, traduz legítimo direito da empregada, consagrado no art. 489 da CLT. Recurso provido." (TST-RR-105200-92.2005.5.10.0009, 4.ª Turma , Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen, DJ - 9/2/2007)
Por essas razões, afigura-se possível a tese de violação do art. 10, II,"b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Assim, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.
Conforme previsão dos arts. 897, § 7.º, da CLT, 3.º, § 2.º, da Resolução Administrativa 928/2003 do TST e 229, § 1.º, do RITST, proceder-se-á de imediato à análise do recurso de revista na primeira sessão ordinária subsequente.
II - RECURSO DE REVISTA
1 - CONHECIMENTO
Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passa-se ao exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista.
1.1 - GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INDENIZAÇÃO
Consoante os fundamentos lançados quando do exame do agravo de instrumento e aqui reiterados, CONHEÇO do recurso de revista por violação do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
2 - MÉRITO
2.1 - GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INDENIZAÇÃO
Como consequência do conhecimento do recurso de revista por violação do art. art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, DOU-LHE PROVIMENTO para restabelecer a sentença quanto à condenação ao pagamento da indenização relativa à estabilidade gestacional.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, I) por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista respectivo, a fim de que seja submetido a julgamento na primeira sessão ordinária subsequente; II) por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por violação do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer a sentença quanto à condenação ao pagamento da indenização relativa à estabilidade gestacional.
Brasília, 17 de outubro de 2012.
DELAÍDE MIRANDA ARANTES
Ministra Relatora