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Pensão alimentar obrigatória e por tempo ilimitado é exceção, entende STJ

Alimentos entre ex-cônjuges é incidente quando configurada a dependência do outro ou a carência de assistência alheia.

24/9/2012

Para o STJ, a obrigação da pensão alimentar para ex-cônjuges vem sendo considerada uma exceção à regra, incidente apenas em caso de dependência ou carência de assistência alheia e por tempo limitado. De acordo com a Corte, a fixação depende das circunstâncias fáticas próprias da hipótese sob discussão, sendo incidente quando configurada a dependência do outro ou a carência de assistência alheia.

A obrigação recíproca, podendo recair tanto sobre homens quanto sobre mulheres, é estabelecida pelo artigo 1.694 do CC/02, observando-se para sua fixação a proporção das necessidades daquele que pede e dos recursos do que é obrigado, o chamado binômio necessidade-possibilidade.

A pensão alimentar aparecia obrigatoriamente nos processos de desquite e, depois de 1977, nas separações e divórcios, quando buscava-se até mesmo o responsável pelo fracasso do casamento e isso era determinante na fixação do valor dos alimentos. Para o advogado e diretor nacional do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, Rolf Madaleno, a doutrina e jurisprudência vêm construindo entendimento de que os alimentos entre cônjuges são cada vez mais raros. "A mulher da atualidade não é mais preparada culturalmente apenas para servir ao casamento e aos filhos, mas tem consciência de que precisa concorrer no mercado de trabalho e contribuir para a manutenção material da família", diz.

Os precedentes do STJ são claros ao definir que os alimentos devidos entre ex-cônjuges serão fixados por tempo certo. Em 2008, a 3ª turma consolidou a tese de que, "detendo o ex-cônjuge alimentando plenas condições de inserção no mercado de trabalho, como também já exercendo atividade laboral, quanto mais se esse labor é potencialmente apto a mantê-lo com o mesmo status social que anteriormente gozava ou, ainda, alavancá-lo a patamares superiores, deve ser o alimentante exonerado da obrigação" (REsp 933.355).

Prazo certo

O raciocínio dos julgadores do STJ é o da efetiva necessidade e conspira contra aqueles que, mesmo exercendo ou tendo condições de exercer atividade remunerada, insistem em manter vínculo financeiro em relação ao ex-cônjuge, por este ter condição econômica superior à sua. Ao julgar um recurso oriundo do RJ em 2011, a 3ª turma reafirmou, no REsp 1.205.408, que o prazo fixado deve assegurar ao cônjuge alimentando tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter pelas próprias forças status social similar ao período do relacionamento.

No recurso no STJ, o ex-marido queria a exoneração da obrigação de pagar quatro salários mínimos à ex-mulher, que já se prolongava por dez anos. Argumentou que passou a viver nova união, em que foi gerada uma filha com síndrome de Down, o que lhe exigia maior capacidade financeira. Disse, também, que a ex-mulher era arquiteta autônoma e que não precisaria do recebimento de pensão para sobreviver.

Ao avaliar o caso, a ministra Nancy Andrighi reconheceu a possibilidade de os valores dos alimentos serem alterados, ou a obrigação extinta, ainda que não houvesse mudança na situação econômica dos ex-cônjuges. Não sendo os alimentos fixados por determinado prazo, o pedido de desoneração, total ou parcial, poderá dispensar a existência da variação necessidade-possibilidade, quando demonstrado o pagamento de pensão por período suficiente para que o alimentando reverta a condição desfavorável que detinha, no momento da fixação desses alimentos.

Trata-se, portanto, de alimentos temporários. Para a ministra, que desonerou o ex-cônjuge da obrigação, "Decorrido esse tempo razoável, fenece para o alimentando o direito de continuar recebendo alimentos, pois lhe foram asseguradas as condições materiais e o tempo necessário para o seu desenvolvimento pessoal, não se podendo albergar, sob o manto da Justiça, a inércia laboral de uns, em detrimento da sobrecarga de outros".

No mesmo julgamento, a ministra advertiu, no entanto, que a obrigação é perene quando a incapacidade para o trabalho for permanente ou quando se verificar a impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho. Aí incluídas as hipótese de doença própria ou quando, em decorrência de cuidados especiais que algum dependente comum sob sua guarda apresente, a pessoa se veja impossibilitada de trabalhar.

Tempo hábil

Processo similar que objetivava exonerar ex-marido de pensão paga por mais de dez anos foi decidido com base no mesmo entendimento. Ele havia se casado novamente e assumiu a guarda do filho em comum, afirmando que a ex-mulher trabalhava como funcionária pública, com renda média de R$ 3 mil. Na sentença, o pedido foi negado. A segunda instância também entendeu que não houve variação negativa na condição econômica do ex-marido e negou o recurso.

A ministra Nancy Andrighi entendeu que "Não se evidencia a existência de uma das exceções à regra da temporalidade dos alimentos devidos a ex-cônjuge, que são a impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho ou a incapacidade física ou mental para o exercício de atividades laborais". A turma concluiu que a ex-esposa teve “tempo hábil para que melhorasse sua condição socioeconômica” e atendeu ao recurso do ex-marido (REsp 1.188.399).

Para o professor Madaleno, é difícil imaginar que uma pessoa vá enriquecer recebendo apenas uma pequena percentagem daquilo que o outro precisa na íntegra para sua subsistência (em geral, de 15% a 20%). "No entanto, o enriquecimento sem causa está presente quando efetivamente a pessoa que ganha pensão alimentícia já está trabalhando ou formou novo relacionamento e ainda assim segue percebendo os alimentos", explica.

Exoneração

Nesses casos, deve ser proposta ação de exoneração de alimentos. A 3ª turma também já enfrentou o tema e definiu que a sentença que extingue a obrigação não retroage à data da citação. O caso, de Minas Gerais, foi julgado em 2008. O relator, ministro Sidnei Beneti, entendeu que efeitos da ação de exoneração de alimentos apenas têm incidência a partir do trânsito em julgado da decisão (REsp 886.537).

A decisão favoreceu a ex-mulher, que pediu judicialmente o pagamento de alimentos atrasados, no total de R$ 5 mil. O ex-marido opôs embargos à execução alegando que, como ele estava desempregado e não recebia mais salário, não poderia pagar a pensão. Além disso, argumentou que, em agosto de 1998, ingressou com ação de exoneração de alimentos e o pedido foi julgado procedente, desobrigando-o do pagamento. O tribunal estadual deu razão ao ex-marido, mas ela recorreu ao STJ.

Segundo o relator, no caso da ação de exoneração não houve notícia de liminar ou antecipação de tutela que liberasse o ex-marido do dever de pagar as prestações de pensão alimentícia.

Em diversos precedentes, o STJ também definiu que a desoneração da obrigação de alimentos não pode ser pedida por meio de habeas corpus, mas em ação própria. "A obrigação alimentar, sua redução ou desoneração não podem ser discutidas no âmbito do habeas corpus; só no juízo cível, mediante ação própria, é possível fazê-lo", afirmou o ministro Ari Pargendler no julgamento do RHC 21.514, em 2007. A falta de pagamentos de obrigação alimentar é causa de prisão civil do devedor.

Desaparecimento da necessidade

Em 2011, ao julgar o HC 187.202, a 3ª turma afastou a possibilidade de prisão de um homem executado pela ex-mulher por dívidas de alimentos. A relatora, ministra Andrighi, constatou que o direito não foi exercitado ao longo de mais de 30 anos. "A necessidade não se mostra tão premente assim", concluiu.

Em 1987, o casal havia firmado acordo de partilha pelo qual a ex-mulher renunciaria aos alimentos com o pagamento de certa quantia, pelo ex-marido. No período de mais de 20 anos, houve vários pagamentos que alcançariam a quantia de R$ 1.660.900. Considerando que a obrigação do acordo não havia sido integralmente cumprida, a mulher ajuizou ação de cobrança de alimentos.

A ministra destacou que "não se pode deixar de considerar que a credora de alimentos, além de receber substanciais valores a título de cumprimento de acordo de partilha de bens e renúncia de alimentos", fez a cobrança da pensão alimentícia após mais de 30 anos de inércia. A relatora ainda ressaltou que a discussão sobre a manutenção dos alimentos não poderia ser feita em habeas corpus.

Benefícios indiretos

O artigo 1.708 do CC/02 diz que "com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos". Seguindo essa norma, a 3ª turma desobrigou um homem de pagar despesas de IPTU, água, luz e telefone de imóvel habitado pelos seus filhos e pela ex-mulher, que já vivia com novo companheiro (REsp 1.087.164).

Na origem, o ex-marido pediu a exoneração do pagamento de alimentos à ex-esposa. O Tribunal local atendeu ao pedido, mas manteve a obrigação de pagamento das despesas da casa. No STJ, o recurso atacou esse ponto. A ministra Andrighi ponderou que "a desoneração de alimentos prestados a ex-cônjuge, por força da constituição de novo relacionamento familiar da alimentada, abrange tanto os alimentos pagos em dinheiro como aqueles prestados diretamente, por meio de utilidades ou gêneros alimentícios".

Os ministros entenderam que a beneficiária principal dos pagamentos era a proprietária do imóvel, sendo o benefício aos filhos apenas reflexo. "Os benefícios reflexos que os filhos têm pelo pagamento dos referidos débitos da ex-cônjuge são absorvidos pela obrigação materna em relação à sua prole, que continua a existir, embora haja pagamento de alimentos pelo pai", afirmou a ministra, destacando que a obrigação de criar os filhos é conjunta.

Renúncia

Apesar de não constar expressamente em lei, está pacificado pela jurisprudência que os alimentos entre adultos (ex-cônjuges e ex-conviventes) são renunciáveis. O tema foi analisado em junho deste ano, quando a 3ª turma, por maioria, definiu que não há direito à pensão alimentícia por parte de quem expressamente renunciou a ela em acordo de separação caracterizado pelo equilíbrio e pela razoabilidade da divisão patrimonial (REsp 1.143.762).

No caso, uma mulher que renunciou formalmente aos alimentos teve rejeitado na Justiça paulista o direito de produzir provas de que havia recebido do ex-marido R$ 50 mil por um período de dez meses após a separação, até que ele cessou o pagamento. Ela reivindicava a continuidade porque, a seu ver, ao assumir o encargo, mesmo diante da renúncia, o ex-cônjuge teria desistido da liberação acordada.

Contudo, o processo foi extinto, sem resolução de mérito, antes da fase de produção de provas. O juiz entendeu que, em razão de a mulher ter dispensado os alimentos, a interrupção do pagamento feito por liberalidade do ex-companheiro não lhe traria nenhum prejuízo.

No STJ, o entendimento que prevaleceu foi o do ministro Massami Uyeda, que divergiu da relatora, ministra Andrighi. Afora a força jurídica da renúncia, feita por escritura pública, os fatos demonstrariam que a ex-companheira teve motivos suficientes para renunciar, pelo que recebeu na divisão patrimonial. E esses fatos – a renúncia e a razoabilidade do patrimônio recebido –, segundo Uyeda, tornavam dispensável o prosseguimento do processo, pois não poderiam vir a ser contestados.

Alimentos transitórios

Os chamados alimentos transitórios são largamente aplicados pela jurisprudência e recomendados pela doutrina, no sentido de assegurar a subsistência material por certo tempo e não mais, como era no passado, por tempo ilimitado. São cabíveis quando o alimentando for pessoa com idade, condições e formação profissional que lhe possibilitem a provável inserção (ou reinserção) no mercado de trabalho. A tese foi definida pela Terceira Turma no julgamento de outro recurso especial, analisado em 2010 (REsp 1.025.769).

De acordo com o professor Rolf Madaleno, é prática jurisprudencial fixá-los por um ou dois anos ou até a partilha dos bens. "Existem estudos ingleses comprovando que uma mulher que deixa o mercado de trabalho em função do casamento precisa de dez anos para voltar a receber aquilo que recebia ao deixar de trabalhar", conta.

O ministro Marco Buzzi, integrante da 4ª turma do STJ, em seu livro Alimentos Transitórios: uma obrigação por tempo certo, afirma que os alimentos são devidos apenas para que o alimentando tenha tempo de providenciar sua independência financeira. "Atualmente, não mais se justifica impor a uma das partes integrantes da comunhão desfeita a obrigação de sustentar a outra, de modo vitalício, quando aquela reúne condições para prover a sua própria manutenção", pondera o ministro Buzzi.

A conclusão foi a mesma da ministra Andrighi. Ao atingir a autonomia financeira, "o ex-cônjuge se emancipará da tutela do alimentante – outrora provedor do lar –, que será então liberado da obrigação, a qual se extinguirá automaticamente".

O processo teve origem em Minas Gerais. O casamento durou cerca de 20 anos e, para embasar o pedido de alimentos, a ex-esposa alegava ter deixado seu emprego a pedido do marido, médico, que prometera proporcionar-lhe elevado padrão de vida. Considerando que a ex-mulher tinha 51 anos e era apta ao trabalho, a segunda instância definiu a pensão alimentícia pelo prazo de dois anos, contados do trânsito em julgado, sem adotar índice algum de atualização monetária. No STJ, ela pretendia afastar o prazo predeterminado da pensão mensal e instituir o reajuste das parcelas pelo salário mínimo.

Autossustento

A ministra relatora refletiu sobre a dificuldade do julgador de avaliar a real necessidade dos alimentos. Para ela, há um "fosso fático entre a lei e o contexto social", que exige do juiz a análise de todas as circunstâncias e peculiaridades no processo, para concluir pela capacidade ou não de autossustento daquele que pleiteia alimentos. "A realidade social vivenciada pelo casal ao longo da união deve ser fator determinante para a fixação dos alimentos", afirmou.

A decisão estabeleceu também que, ao conceder alimentos, o julgador deve registrar expressamente o índice de atualização monetária dos valores. Diante da ausência dessa previsão no caso analisado, o STJ seguiu sua jurisprudência para fixar o valor em número de salários mínimos, convertidos pela data do acórdão.

Fazendo menção à boa-fé objetiva, a relatora afirmou que a fixação de alimentos conforme especificada pelo TJ/MG adota caráter motivador para que o alimentando busque efetiva recolocação profissional, e não permaneça indefinidamente à sombra do conforto material propiciado pelos alimentos prestados pelo ex-cônjuge, antes provedor do lar.

Alimentos compensatórios

O professor Madaleno destaca que a jurisprudência e a doutrina vêm construindo a figura jurídica dos alimentos compensatórios, cuja instituição é regulada em outros países e assegura alimentos para aquele cônjuge que trabalhe ou não, mas cujo padrão de vida pode sofrer brusca queda na comparação com o estilo de vida proporcionado durante o casamento pela maior remuneração do outro cônjuge.

De acordo com o jurista, sua aplicação tem maior escala de incidência, em especial, nos regime de separação de bens e notadamente quando a esposa se dedicou exclusivamente à família, não tendo renda própria ou tendo renda que é insuficiente para manter seu status social. O STJ ainda não apreciou essa matéria.

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