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Em editorial, O Estado de S. Paulo critica alguns desvios de rota do ministro Nelson Jobim

23/9/2005


Em editorial, O Estado de S. Paulo critica alguns "desvios de rota" do ministro Nelson Jobim

Abaixo, editorial do jornal O Estado de S. Paulo, publicado ontem (22/9), sobre alguns "desvios" do presidente da mais alta Corte do país, ministro Nelson Jobim.

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O Supremo é isento

Assim como a mulher de César tinha não só que ser honesta, mas parecer honesta, a mais alta corte de Justiça – começando por quem a preside – tem não só que ser politicamente isenta, mas parecer politicamente isenta. Indaguemos agora: pelas freqüentes declarações e decisões monocráticas do atual presidente do STF, ministro Nelson Jobim, é a visão de neutralidade política a que se associa à sua imagem perante a opinião pública?

Considerando, por outro lado, que os magistrados devem “falar nos autos”, não podendo externar opiniões sobre causas judiciais que poderão vir a ser submetidas a seu julgamento – sob pena de fazerem condenável prejulgamento –, será que esse cuidado tem tido quem está à frente do Judiciário brasileiro, por comandar o tribunal de jurisdição mais elevada do País?

Manifesto assinado por 60 juízes e desembargadores do Rio Grande do Sul – sob o título Manifesto pela Ética – sugere enfaticamente, ao presidente do STF, que adote uma de duas atitudes: a renúncia a suas pretensões político-eleitorais, pela manifestação pública de desistência de eventuais candidaturas (a Presidência ou Vice-Presidência da República), ou a renúncia ao posto de dirigente do Pretório Excelso. No texto está que o silêncio de Jobim, diante de conjecturas e ilações da mídia sobre sua eventual candidatura, constitui “um escárnio e um acinte à Constituição da República”. Além disso, os magistrados gaúchos expressam seu desagrado ante o fato de Jobim, “distanciando-se de sua condição de magistrado”, fazer considerações a respeito da “ingovernabilidade” do País, caso ocorra a hipótese – constitucional, é bom lembrar – do impeachment do presidente Lula. É bem verdade que o ministro Jobim tem a estranha característica (recentemente revelada a jornalista colaborador desta casa) de não enviar desmentidos a matérias publicadas, mesmo que as considere infundadas. Isso complica a precisão do entendimento público, a respeito de suas manifestações. Mas decerto isso não se aplicaria a suas decisões judiciais, muitas vezes controvertidas, como aquela em que mandou liberar o empresário Sergio Gomes da Silva, o Sombra, principal acusado de mandante do assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel, ou, especialmente, a recente liminar que concedeu, numa terça-feira à noite, no mandado de segurança em favor de seis deputados do PT, suspendendo a tramitação, na Câmara dos Deputados, do processo de cassação de seus mandatos, por quebra de decoro parlamentar.

Deixando à parte a controvérsia sobre a legitimidade ou não da suposta interferência de um Poder (Judiciário) em outro (Legislativo), assim como as questões atinentes a interpretação do Regimento Interno das Casas Legislativas, quanto ao direito de defesa prévia dos parlamentares processados por quebra de decoro, estranhou-se a decisão monocrática do presidente do STF, por não tratar- se de período de recesso, nem de férias, por estarem outros ministros do Supremo em Brasília – aos quais poderia ser distribuído o feito – e, sobretudo, por ser muito discutível a urgência daquela decisão.

Certamente as ilações quanto à falta de isenção política atingem com mais facilidade um magistrado do Supremo que tem uma intensa atividade política em seu currículo – como deputado federal, constituinte e ministro de Estado – e nunca se preocupou em dissipar especulações sobre seu futuro político-eleitoral. Já se disse, muitas vezes, que ao STF nunca escapou uma certa dimensão política em suas grandes decisões. Mas essa acepção sempre se referiu a interesses gerais do Estado, sem maiores conotações partidárias ou político eleitorais. É na isenção do poder Judiciário – traço que adquire importância maior, por dedução natural, em sua mais alta instância – que repousa toda a garantia de Direitos os cidadãos, o que vale dizer, toda a crença social no respeito à lei e a seu cumprimento. No momento em que paire a menor desconfiança quanto à plena isenção (política) do Supremo, comprometida poderá estar, de forma extremamente perigosa, a confiabilidade da sociedade, em relação à própria Justiça.

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