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Em entrevista coletiva, Vidigal fala das CPIs e do presidente da Câmara

6/9/2005


Em entrevista coletiva, Vidigal fala das CPIs e do presidente da Câmara

O presidente do STJ, ministro Edson Vidigal, concedeu entrevista coletiva, nesta segunda-feira, em dois momentos no auditório externo do Tribunal. Ao chegar para a cerimônia de abertura de seminário sobre o combate à impunidade, o ministro Vidigal foi indagado sobre as suspeitas de que o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), receberia dinheiro do empresário Sebastião Buani, detentor da concessão de um dos restaurantes da Câmara.

"Eu tive o cuidado de ler ontem todos os jornais e todas as revistas. O que há até aqui é apenas uma suspeita. Eu acho que a gente tem de ter muito cuidado e, enquanto não houver um indício forte e suficiente, nós não podemos dar destaque a esse tipo de colocação", disse.

No entanto o ministro defendeu que o caso seja apurado com profundidade para que não pairem dúvidas.

Já no segundo momento, na saída do auditório, os jornalistas quiseram saber a opinião do ministro, que, durante seu discurso, chamou a atenção para as investigações levadas a cabo pelas comissões parlamentares de inquérito (CPIs).


Entrevista na chegada ao auditório do STJ


Pergunta: O senhor poderia nos detalhar sobre esse seminário?

Ministro Edson Vidigal – O seminário é a busca de formas alternativas para o combate à impunidade no Brasil. Nós temos dois graves problemas neste país. Um é a pobreza, que não podemos ignorar. Tanto é que estamos aqui bem vestidos, todos já tomaram banho, já tomaram café. Mais da metade da população brasileira está em estado de absoluta pobreza, de miséria. Abaixo da linha de pobreza. Isso, segundo cálculos de organismos internacionais. Cerca de 2% dos brasileiros detêm mais de 50% da renda nacional. Isso é muito grave. E, a par disso, nós temos a impunidade, que revolta a sociedade. A impunidade significa que pessoas estão cometendo crimes, cometendo avanços, praticando peculato, pondo a mão no dinheiro público, e a sociedade assistindo incrédula porque, pelo sistema processual existente no Brasil, quem, por exemplo, é condenado a até oito anos de reclusão depois de um longo processo não cumpre a pena integralmente, porque vai ser beneficiado por uma série de vantagens previstas na própria lei. Então, é preciso que nós tomemos mais consciência e levemos a questão mais a sério, a democracia não pode conviver com a impunidade. E a impunidade é a causadora de muito desses grandes males que levam o Estado brasileiro a não ter condições de cumprir com as promessas da democracia e levando as populações, portanto, a essa desgraça a que nós estamos assistindo no Brasil.

Pergunta: Ministro, a corrupção intensifica essa pobreza...

Ministro Edson Vidigal – Exatamente. Porque a corrupção no Brasil se dá principalmente com o dinheiro público. No setor público. Ou com a sonegação ou com a lavagem do dinheiro que é oriundo de fontes inconfessáveis e, no geral, ou é sonegação ou é desvio do dinheiro público nas falsas licitações, enfim, nos grandes desvios. Isso faz, portanto, com que o Estado não aplique, que ele detenha poucos recursos para aplicar em favor da sociedade.

Pergunta: Presidente, em meio a todas essas denúncias que surgiram de irregularidades, ontem surgiu uma nova contra o presidente da Câmara dos Deputados, né?

Ministro Edson Vidigal – Eu tive o cuidado de ler ontem todos os jornais e todas as revistas. O que há até aqui é apenas uma suspeita. Eu acho que a gente tem que ter muito cuidado e, enquanto não houver um indício forte e suficiente, nós não podemos dar destaque a esse tipo de colocação.

Pergunta: Mas o senhor não acha que, se for comprovado, não é gravíssimo o envolvimento do presidente da Câmara dos Deputados?

Ministro Edson Vidigal – Claro. É gravíssimo com qualquer homem público. Se for comprovado. Agora, nós não podemos ficar fazendo capa, manchete daquilo que ainda é apenas um indício, o que não é suficiente. Eu, como juiz, tenho de ter todo o cuidado. Inclusive é do meu dever contribuir para frear esse tipo de especulação. Senão, amanhã, vamos cair numa Revolução Francesa, na qual todo mundo passa a ser suspeito. Basta o primeiro irresponsável abrir a boca contra quem quer que seja. Basta que seja uma autoridade para, no dia seguinte, virar capa de revista ou manchete de jornal sem que se tenha o cuidado de apurar.

Pergunta: Agora, com relação ao Ministério Público lá em São Paulo, sobre o depoimento do Burati (Rogério Burati), o Ministério Público foi muito questionado e esse é um dos temas aqui do congresso. Qual avaliação o senhor faz?

Ministro Edson Vidigal – Aquele caso não foi bem uma postura do Ministério Público como instituição. Foi uma postura reprovável de um servidor do Ministério Público que, movido não se sabe por quê, resolveu ser o porta-voz dos flashes à proporção que o depoimento transcorria. Consta que ele descia e subia correndo para dizer: olha, ele agora está falando isso e tal. Quando o depoimento não havia terminado e o próprio depoente poderia se retratar ao final e, inclusive, não assinar aquilo tudo que estava sendo colhido. É direito do depoente. Mas aquilo tudo já estava sendo passado como verdade definitiva. Espero que alguma providência seja tomada, porque é, no mínimo, um deslize funcional.

Pergunta: O senhor acha que o presidente Severino deveria se afastar temporariamente até que as investigações desse caso sejam concluídas?

Ministro Edson Vidigal – Não. Porque qualquer irresponsável que amanhã venha a abrir a boca para levantar uma suspeita contra quem quer que seja e esse quem quer que seja tenha de ser afastado, nós vamos para uma bagunça generalizada no País. É importante, sim, que se apure de pronto. E, até aqui, penso que as coisas estão sendo conduzidas normalmente. Ele fez o que qualquer um faria. Pediu o inquérito na Polícia Federal, rebateu e agora vão ser feitas as averiguações. Uma vez se constatado, sim. Agora, nós não podemos ficar à mercê. Quer dizer, um sujeito está devendo lá. Por que ele não falou isso antes? Disse que era do tempo em que o Severino era o primeiro-secretário. Porque ele não falou logo quando o Severino se candidatou a presidente? Então, há umas coisas com que a gente tem de ter cuidado. Já pensou amanhã alguém diz que o seu editor está recebendo grana para não divulgar a matéria. Aí, o dono do jornal tem que afastá-lo de pronto? Não. Tem de apurar. Não podemos ficar à mercê desse "denuncismo" irresponsável.

Pergunta: É. Até porque o interesse poderia ser do vice-presidente, que é do PFL. Daí, poderia querer pedir o impeachment do presidente. No caso do impeachment, qual a sua avaliação?

Ministro Edson Vidigal – Isso tudo é especulação. Eu queria pedir permissão para entrar porque senão o seminário não vai começar. Eu vou falar mais aqui do que lá.

Entrevista após discurso de abertura do seminário


Pergunta: Presidente, vamos comentar um pouco o discurso do senhor. O senhor foi um pouco crítico com relação às CPIs, com relação à atuação dos parlamentares...

Ministro Edson Vidigal - É que a impunidade decorre também da falta de objetividade na apuração. Então não se deve nunca se desviar do foco, daquilo que se está apurando. E é evidente que nós vamos encontrar mais eficácia nos profissionais do ramo, que são os policiais. Não podemos esperar nunca encontrar eficácia, respostas prontas do ponto de vista da instrução processual da forma como as CPIs estão atuando no Brasil. Até no cinema a gente vê que é diferente. E é preciso ter mais objetividade. Até porque elas foram instituídas ainda no Direito inglês, em épocas muito remotas, como garantia do direito das minorias da investigação sobre denúncias no setor público e dentro daquilo que o Poder Legislativo tem como função principal hoje, que é a fiscalização, a elaboração orçamentária e a fiscalização do cumprimento do orçamento. Temos visto que as CPIs terminam e aquela papelada toda é mandada para o Ministério Público, que vai ter de se virar junto com a Polícia Federal. Depois daquilo tudo é que se vai concluir se há ou não provas suficientes para se instaurar ação penal. Isso nós estamos falando de experiência própria, de papéis que foram remetidos com conclusões por comissões parlamentares de inquérito em que houve casos de acusados que ficaram dois, três, quatro anos sem que o Ministério Público pudesse formular a acusação.

Pergunta: o senhor acha que as CPIs não são os locais adequados para se investigar todas essas denúncias?

Ministro Edson Vidigal – Não. Não. Não. O que eu acho é que elas estão treinando. E é bom treinar. Mas é que não podemos confiar totalmente apenas na apuração. É preciso que tenhamos o Estado mais aparelhado. Senão, nós vamos contribuir para a impunidade pela morosidade. Porque nós temos o inquérito parlamentar ,que, por sua vez, resulta no inquérito policial, que, por sua vez, vai resultar numa denúncia do Ministério Público, a qual por sua vez pode resultar ou não numa instrução criminal, que é um outro inquérito. E aí quando é que nós vamos chegar ao final? Quando chegarmos ao final, às vezes, aquela pena eventualmente está prescrita para o caso, o fato já passou e aí a impunidade se realiza. Eu apenas estou comentando o fato de que precisamos trabalhar com mais objetividade. Pedi isso, né. Os partidos devem ter mais cuidado na indicação dos representantes. Procurar pessoas que tenham mais experiência com a operação do Direito.
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