A emissora e a apresentadora alegaram que Ana Maria Braga não devia fazer parte do polo passivo da ação, pois é profissional contratada da TV empregadora, e que o comentário em questão estava imbuído de interesse coletivo e amparado no legítimo dever de informar.
O desembargador Neves Amorim, relator, afastou a tese de ilegitimidade passiva da apresentadora, baseando-se na súmula 221 do STJ, a qual diz que "são civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação". Ele também apontou o teor excessivo dos comentários tecidos contra a juíza: "o interesse público a que se referem os recorrentes de fato está presente na notícia, contudo a forma como fora apresentada ao público extrapolou o direito constitucional de crítica, livre manifestação do pensamento e o do dever de informar da imprensa".
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Processo: 0124974-31.2008.8.26.0002
Veja a íntegra da decisão.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0124974-31.2008.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes GLOBO COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÃO S/A e ANA MARIA BRAGA MAFFEI sendo apelado L.V.C.S.S.
ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LUÍS FRANCISCO AGUILAR CORTEZ (Presidente) e JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS.
São Paulo, 29 de maio de 2012.
Neves Amorim
RELATOR
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Apelação nº 0124974-31.2008.8.26.0002
Apelante: Globo Comunicação e Participação S.A. e outro.
Apelado: L.V.C.S.S.
Comarca: São Paulo - 7ª Vara Cível do Foro Regional de II/Santo Amaro - Processo nº 124974-0/2008.
Voto n° 14934
EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - LEGITIMIDADE DA CORRÉ/ APRESENTADORA PRESENTE - APLICAÇÃO DA SÚMULA 221 DO STJ - RÉ, QUE EM PROGRAMA DE TV, CRITICA DECISÃO JUDICIAL, CITANDO O NOME DA JUÍZA/AUTORA, ARGUMENTANDO QUE ESTA LIBEROU CRIMINOSO POR BOM COMPORTAMENTO O QUE VEIO ACARRETAR A MORTE DA VÍTIMA – FATOS RELATADOS PELA CORRÉ APRESENTADORA INFUNDADOS - DECISÃO JUDICIAL QUE SE EMBASOU EM DEPOIMENTO DA PRÓPRIA VITIMA, QUE AFIRMOU A AUSÊNCIA DE PERICULOSIDADE DO CONDENADO - NOTÍCIA TENDENCIOSA E SENSACIONALISTA QUE TENTOU FAZER COM QUE OS TELESPECTADORES INSURGISSEM-SE CONTRA A AUTORA - DANOS MORAIS EVIDENTES – VALOR ARBITRADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO CONDIZENTE COM A POSIÇÃO SOCIAL DA AUTORA E A MAGNITUDE DAS CORRÉS, TENDO CARÁTER PUNITIVO E COIBITIVO – REITERAÇÃO DOS TERMOS DA SENTENÇA PELO RELATOR - ADMISSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - ADEQUADA FUNDAMENTAÇÃO - PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 252 DO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
RECURSO IMPROVIDO.
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente a presente ação de indenização por danos morais, condenando as rés ao pagamento, solidariamente, ao valor de R$150.000,00 (cento e cinquenta mil) (fls. 142/174).
Apelam, em conjunto, os correqueridos, alegando, preliminarmente, a ilegitimidade passiva da corré Ana Maria Braga, por esta se tratar apenas de preposta emissora. No tocante ao mérito, sustentam, em apertada síntese, que o comentário em questão está imbuído de inegável interesse coletivo e amparado pelo direito constitucional de crítica e livre manifestação do pensamento, amparado também, no legítimo dever de imprensa. Argumenta que as acusações feitas pela corré Ana Maria não tem o condão de gerar qualquer indenização, posto que devidamente vinculadas ao contexto fático que estava sendo discutido. Por fim, caso seja mantida a sentença recorrida, pugnam pela redução do quantum indenizatório, utilizando-se os parâmetros de moderação e razoabilidade.
Regularmente processada, vieram aos autos contrarrazões (fls. 255/278).
É o relatório.
Em que pese à argumentação das requeridas, não cabe provimento ao recurso.
Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva da corré Ana Maria Braga, não cabe razão aos recorrentes.
Trata-se a corré Ana Maria de profissional contratada pela correquerida emissora, desta forma, inegável a sua legitimidade para figurar no polo passivo da presente ação, sendo direito da requerente de ingressar com a causa individualmente ou concomitantemente, como na presente ação, estando este entendimento, em sintonia com a jurisprudência Superior Tribunal de Justiça, que já é objeto da súmula 221:
“São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação.”
Desta forma, rejeito a preliminar.
No tocante ao mérito, melhor sorte não cabe aos recorrentes.
No caso sub examine, pleiteia a autora indenização por danos morais supostamente causados pela apresentadora de programa televisivo da emissora ré.
Depreende-se da leitura dos autos, que a sentença proferida pela autora fora pautada no parecer do Ministério Público que se manifestou a favor da liberação do denunciado, visto que a própria vítima, em depoimento, apontava a ausência de periculosidade do condenado, contudo, em liberdade provisória veio a assassina-la.
Ora, não há nenhum indício de que a autora tenha decidido fora do regramento jurídico ou de que tenha fundamentado a sentença em provas que não estavam nos autos em debate.
Ocorre que sem mencionar tais fatos, a corré Ana Maria em seu programa de televisão “MAIS VOCÊ”, referiu-se a decisão em questão como se a motivação para liberação do acusado fosse por bom comportamento.
Desta forma, ou a corré fora mal instruída sobre o caso ou preferiu declarar opinião tendenciosa para se aproveitar do sensacionalismo e audiência que pudesse acarretar a notícia.
Como bem apontou o MM. Juiz a quo, qual o motivo da apresentadora chamar a atenção dos telespectadores para que prestassem atenção ao nome da autora, como se esta tivesse colaborado para a morte da vítima, como se conclui destas frases proferidas pela corré: “Eu quero falar o nome dessa Juíza para a gente prestar atenção. Ela, ela, a Juíza é L.V.S..”
É certo que as decisões judiciais, por serem públicas e por vivermos em um estado democrático de direito, são passiveis de crítica, contudo, estas devem ser embasadas em fatos reais e quem as profere é responsável pelos danos a que possam causar.
Evidente, que as palavras simplesmente jogadas ao telespectador, tratando de crime gravíssimo e que causa forte comoção, esboçadas sem nenhum embasamento legal e fático, tiveram repercussão negativa para a autora, estando caracterizado o dano moral indenizável.
O interesse público a que se referem os recorrentes, de fato está presente na notícia, contudo, a forma como fora apresentada ao público, extrapolou o direito constitucional de crítica, livre manifestação do pensamento e o do dever de informar da imprensa.
No tocante ao valor arbitrado a título de danos morais, R$150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), considerando o cargo de autoridade judicial que exerce a autora e, frente à magnitude da corré Rede Globo de Televisão e somadas ao fato da apresentadora ter um dos maiores salários da televisão brasileira, julgo que o montante fora fixado de forma moderada e empregando o caráter punitivo que deve ter a condenação.
No mais, é de rigor, portanto, a manutenção da r. sentença recorrida, pois as questões postas em julgamento foram analisadas corretamente mediante criteriosa avaliação do conjunto probatório, conferindo à causa a mais adequada e justa solução, razão pela qual resiste claramente às críticas que lhe são dirigidas nas razões recursais.
Qualquer acréscimo que se fizesse aos seus sólidos fundamentos constituiria desnecessária redundância.
A propósito, o Novo Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em vigor desde 4 de novembro de 2009, estabelece que, “nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente fundamentada, houver de mantê-la”.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça tem prestigiado essa forma de julgamento:
“PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO PROFERIDO EM EMBARGOS DECLARATÓRIOS. RATIFICAÇÃO DA SENTENÇA. VIABILIDADE. OMISSÃO INEXISTENTE. ART. 535, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. 1. Revela-se improcedente suposta ofensa ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem, ainda que não aprecie todos os argumentos expendidos pela parte recorrente, atem-se aos contornos da lide e fundamenta sua decisão em base jurídica adequada e suficiente ao desate da questão controvertida. 2. É predominante na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em reconhecer a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerro omissão ou ausência de fundamentação no decisum. 3. Recurso Especial não-provido.” (REsp nº 662.272-RS, Segunda Turma, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, j. 04.09.2007).
No mesmo sentido: REsp n. 641.963-ES, Segunda Turma, relator Ministro CASTRO MEIRA, DJ de 21.11.2005, REsp n. 592.092-AL, Segunda Turma, relatora Ministra ELIANA CALMON, DJ de 17.12.2004 e REsp n. 265.534-DF, Quarta Turma, relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, DJ de 1.12.2003.
Assim, pelo meu voto, nego provimento ao recuso.
NEVES AMORIM
Desembargador Relator