Em 2009, um contrato firmado por João Grandino Rodas, quando era diretor da Faculdade de Direito do Largo S. Francisco, vinculava a doação de verba para a construção de um auditório para 90 pessoas no prédio principal ao batismo da sala com o nome de Conde. Pela tradição, as salas da São Francisco recebem nomes de professores e ex-professores da casa. Após protestos de alunos, a Faculdade retirou o nome dado a duas salas em homenagem ao banqueiro.
O juiz de Direito Jayme Martins de Oliveira Neto considerou que a situação revelou o descumprimento do compromisso firmado no contrato. Situação que, para ele, autoriza revogação da doação.
A família também pediu indenização por danos morais, mas o magistrado rejeitou o pedido. "Não verifico que o descumprimento do contrato, ainda que com encargo sentimental, traga aos autores sofrimento particular que mereça indenização especial", afirmou.
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Processo: 0011162-47.2011.8.26.0053
Veja abaixo a íntegra da decisão.
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VISTOS.
Cuida-se de Procedimento Ordinário movido por Pedro Conde Filho em face de Universidade de São Paulo - USP alegando que teria doado um auditório e um conjunto de sanitários a serem construídos na Faculdade de Direito da USP, sendo que os únicos encargos da donatária seria o de nomear o auditório como "Sala Pedro Conde" e o de manter, em suas dependências, um quadro a óleo retratando o seu pai.
Afirma que houve descumprimento do contrato de doação firmado quando foi revogada a homenagem. Pede indenização por danos morais e o ressarcimento do valor despendido. Citada, Universidade de São Paulo - USP contestou o feito, alegando, preliminarmente, a necessidade da citação da Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito para integrar o pólo passivo, tendo em vista sua participação na iniciativa de modernização da Faculdade e em parte do valor doado.
No mérito, sustenta que, de acordo com o contrato firmado, primeiro a obra seria executada e só depois seria submetida aos órgãos colegiados a decisão sobre a atribuição do nome da sala, sem obrigação de resultado assumida. Aduz que não se trata de bem restituível, e que o encargo foi cumprido, ao ser encaminhada a questão para apreciação da Congregação. Oportunizou-se réplica. Foi requerida, pela Universidade de São Paulo a produção de prova testemunhal. Relatados.
FUNDAMENTO e DECIDO.
Afasto a preliminar que requeria a intervenção de terceira, ainda que anuente ao contrato de doação, porque sua participação se resume a colaborar anualmente com a manutenção do auditório e conjunto sanitários, independente do nome a que dado ao local. Nessa senda, sua participação dentro do objeto dos autos é absolutamente estranha à discussão do encargo de doação. Trata-se de ação que visa a revogação de doação por descumprimento de encargo.
Situo o tema.A doação com encargo é um contrato em que há convergência de vontades para a concessão de um bem mediante execução de um ônus pelo beneficiário. Nas doações mediante encargo, se faz necessário que haja o adimplemento do encargo para o completo aperfeiçoamento do contrato. Do contrário, como se observa no art. 555 do Código Civil vigente, a revogação da doação poderá ocorrer em razão de ingratidão do donatário ou por inexecução do encargo.
No presente caso, observa-se que a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo firmou contrato de doação com o autor o qual dispunha expressamente sobre a intenção de homenagear seu pai. Aí moram o encargo e a discussão sobre a exigibilidade. Dentro do que narra a defesa, a cláusula 2.2, analisada isoladamente supõe que a doação irá posteriormente submeter o encargo à aprovação pela Congregação da Universidade, o que revelaria ou limitaria o alcance da interpretação do encargo, tanto quanto, sinalizaria que se trata de obrigação de meio.
Entretanto, não se interpreta o contrato pela dicção de uma cláusulas, mas as cláusulas pelo teor do contrato. Essa é a disposição que se orienta a partir do art. 112 do Código Civil, de forma que a conclusão evidente dentro do que contratado pelas partes não supõe a impossibilidade do cumprimento do encargo, ou quiçá a ressalva de responsabilidade da donatária, cingindo-se o contratado apenas ao encaminhamento da doação à Congregação da faculdade. O que se extrai efetivamente, permeável do início ao pé do contrato, é a exigibilidade do encargo, razão fundamental da doação, decorrente da honra e dos laços que cercam os doadores.
Assim sendo, considerando que nomear auditório com o nome de pessoa ligada aos doadores constitui inegável honra concedida, de rigor lembrar que o Código Civil é direto em prever que "O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador (...)", a teor do art. 553. Logo, pela vontade do contrato e pela Lei, há aqui indiscutível encargo exigível, quase obrigação principal.
Registre-se, de resultado.
Dentro dessa perspectiva, sobretudo pela redação dada às cláusulas, e mesmo na ótica da cláusula específica 2.2 do contrato de doação com encargo, no sentir do Juízo, não há como presumir a limitação de responsabilidade como mero esforço de nomeação do auditório.
Ainda que tal obstáculo administrativo exista por óbvia organização interna da Universidade, ou mesmo que se discuta a irresponsabilidade da ré em contratar obrigação de ato de terceiro - leia-se Congregação da Universidade - sugerindo-se que essas premissas constituem indiscutível ilegitimidade direta a ato próprio da donatária, caracterizando ato alheio e empecilho ao encargo, tal é tema que se manteve apenas no íntimo da Faculdade, não sendo em qualquer momento do contrato de doação esclarecida aos doadores.A justificativa de que o ato de nomeação dependeria de aval da Congregação da Universidade jamais se apresentou na superfície do contrato, permitindo-se inferir aos doadores que se tratava de hipótese aparentemente formal, sem maior profundidade.
Ocorre que como se verificou, era questão de absoluta suma importância, dada a perspectiva e autonomia da Congregação, que na hipótese exerceu sua independência, e em recurso administrativo, não confirmou a nomeação pretendida pelos contratantes. Em face disso, no sentir do Juízo, a reserva mental levada a efeito, independente se ao tempo da doação houvesse diálogo entre a Faculdade e a Congregação, tanto quanto alheio às conveniências da Universidade, configura hipótese prevista no art. 110 do Código Civil atual, pelo qual, o que deve prevalecer é a manifestação da vontade das partes contratantes, exceção feita tão somente se o doador possuir conhecimento sobre a reserva mental. Não o caso. Logo, a vontade é de doar mediante encargo. Preserve-se, aqui, a vontade.
Portanto, toda essa dinâmica revela indisfarçável descumprimento do encargo. Situação direta que autoriza revogação da doação. Percebido o inadimplemento do encargo pela donatária, Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, acolho as razões do autor para que haja a revogação da doação onerosa.
Contudo, tão somente dos danos materiais, referentes aos valores dispendidos com a realização das obras e investimento em móveis, equipamentos, honorários profissionais, ressalvado do advogado que patrocina o feito, conforme peça inicial e documentos, que não mereceram da contestação, resistência puntual e específica. No que tocam os danos morais, este Juízo não tem admitido o dano moral contratual, conforme farta jurisprudência em mesmo sentido.
De outro lado, ainda que fosse possível, não verifico que o descumprimento do contrato, ainda que com encargo sentimental, traga aos autores sofrimento particular que mereça indenização especial. Para não passar à margem, especificamente em relação aos honorários do advogado que patrocina o feito, tratam-se de evidente despesa do autor para recompor seu patrimônio jurídico que supõe violado, de maneira que configura parte do dano emergente indenizável. Contudo, não há procedência integral, porque não admitido o dano moral pretendido.
Nessa senda, a responsabilidade pelos custos de advogado são concorrentes, na medida em que o autor contratou profissional para pedir mais do que tinha realmente direito. Assim por equidade, fixo o valor, à luz do que vencido, em R$ 40.000,00.
Ante o exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE a ação, com supedâneo no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil para condenar a Ré: 1) à restituição de 1.073.012,70, corrigidos e com juros desde a citação, observada a redação em cada bloco de tempo da Lei Federal 9.494/97; 2) ao pagamento da importância de R$ 40.000,00, contratados como pró-labore ao procurador do autor, para a propositura da demanda, corrigidos e com juros desde a citação, observada a redação em cada bloco de tempo da Lei Federal 9.494/97.
Custas e despesas ex lege. Por força do princípio da causalidade, cada parte arcará com os honorários a que deram causa.
P.R.I.C.
Em caso de eventual recurso, haverá custas de preparo no valor de R$ 24142,52.
Porte de remessa e retorno no valor de R$ 25,00 por volume (os autos encontram-se com 2 volumes).