Promotor do MP/ES que deixou de protocolar recurso teve pedido negado pelo desembargador William Silva. O magistrado achou por bem ensinar ao promotor o passo a passo da devolução dos autos ao cartório.
De acordo com Silva, a simples juntada do recurso aos autos não é suficiente para o reconhecimento da regular interposição do apelo. Para o magistrado, afora as prerrogativas que lhes são conferidas, ao promotor de justiça-parte não deve ser dispensado qualquer tratamento processual diferenciado.
Nas linhas finais da decisão, Silva relembra a função do MP. "Ademais, importante salientar que é ônus do Ministério Público, como parte no processo penal, acompanhar o processamento do recurso por ele interposto, solicitando, quando for o caso, certidões que atestem algum equívoco perpetrado pelo Tribunal".
Veja a íntegra da decisão.
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11- Apelação Civel Nº 24060312964
VITÓRIA - 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL
APTE MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL
APDO L.S.R.
Advogado(a) MARCELO SOUZA NUNES
APDO M.C.S.O.
Advogado(a) EDSON JOSE RABELO
APDO MUNICIPIO DE VITORIA
Advogado(a) MARCIA ALESSANDRA CORREA
RELATOR DES. WILLIAN SILVA
APELAÇÃO CÍVEL N.º 024060312964
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL
APELADOS: L.S.R.
RELATOR: DES. WILLIAN SILVADECISÃO
Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Estadual em face de L.S.R. e outros, tendo em vista a sentença, acostada às folhas 1.252 a 1.271 dos autos, prolatada pelo MM. Juiz de Direito da Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal de Vitória.
O recorrente, em síntese, sustenta que os atos imputados na inicial, corroborados, a seu ver, pelos elementos probatórios acostados, seriam amoldáveis à prática de improbidade administrativa, daí porque deveria ser reformada a sentença que, de forma antecipada, julgou improcedentes os pedidos formulados.
Os recorridos, em sede de contrarrazões, pugnam pelo desprovimento do apelo.
A douta Procuradoria de Justiça entendeu pela desnecessidade de sua intervenção.
É, no essencial, o relatório. Passo a decidir monocraticamente, eis que presentes os requisitos gizados no artigo 557 do Código de Processo Civil.
O apelo sequer merece admissão.
Embora não se negue que, nos termos da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, o membro do parquet possui a prerrogativa de intimação pessoal, inclusive recebendo os autos com vista (artigo 41, inciso IV), não há qualquer dispensa, nesse mesmo diploma, do protocolo das manifestações ministeriais.
Como se vê, após receber o processo para ciência da sentença a seu tempo prolatada, o ilustre promotor de justiça Marcelo Zenkner procedeu à devolução ao cartório com a simples juntada de seu recurso aos autos, o que não é suficiente para o reconhecimento da regular interposição do apelo. Sem dúvida, atuando como parte, deve o membro do Ministério Público atentar aos deveres dispostos na legislação, sob pena de clara violação aos princípios da isonomia e segurança jurídica.
A uma porque, afora as prerrogativas que lhes são conferidas – que, por óbvio, têm sua razão de ser e devem ser plenamente respeitadas -, ao promotor de justiça-parte não deve ser dispensado qualquer tratamento processual diferenciado. Basta imaginar que jamais seria admitida a apelação do advogado que, com carga do processo para a elaboração de seu apelo, limita-se a juntar a peça aos autos, devolvendo-os à serventia. A redação do codex processual é clara: “quando o ato tiver que ser praticado em determinado prazo, por meio de petição, esta deverá ser apresentada no protocolo, dentro do horário de expediente, nos termos da lei de organização judiciária local.”
A duas porque a autenticação mecânica do protocolo, disponibilizada às partes de forma equânime, assegura ao ex adverso a legitimidade do ato praticado, afastada a possibilidade de indevida intervenção humana com a aposição do carimbo de devolução dos autos ao alvedrio do servidor. No caso, não há informação oficial para a aferição da tempestividade do recurso: a manifestação de folha 1.271-verso, em que o promotor de justiça informa que “segue recurso de apelação em frente, em 15 laudas” pode ser datada à vontade da parte; e o carimbo de recebimento dos autos em cartório, como visto, não atende às disposições legais de regência, podendo o servidor do Poder Judiciário, inclusive em prejuízo ao direito da parte, certificar o recebimento dos autos em data posterior. Clara, portanto, é a falta de segurança.
Em caso idêntico, o Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AI 817.096/SP) entendeu ser insuficiente a devolução dos autos pela Procuradoria Regional da República ao competente Tribunal Regional Federal, ainda que contendo em seu bojo o recurso especial e respeitado o interregno de interposição, posto que, no entender de sua remansosa jurisprudência, a tempestividade somente é aferida pelo registro no protocolo.
Trago à baila o oportuno voto da Exm.ª Ministra Maria Thereza de Assis Moura:
Afirma o agravante, em síntese, que "os autos do HC nº 2005.03.00.063309-0 saíram da PRR – 3ª Região, com o recurso especial, no dia 6.3.2006, dando entrada no TRF – 3ª Região no dia 7.3.2008, conforme comprovante de movimentação de processo extraído do Sistema de Controle Processual da Procuradoria Regional da República da 3ª Região".
Aduz que "referido comprovante atesta com bastante clareza que os autos deram saída da PRR – 3ª Região com interposição do recurso".
Assevera, ademais, que "o termo de recebimento exarado por técnico judiciário do TRF – 3ª Região dá conta de que os autos foram recebidos naquela Corte no dia 7.3.2008". Por fim, aponta ser suficiente para demonstrar a tempestividade do Recurso Especial "a certidão de f. 31, na qual o técnico judiciário Lucas Madeira de Carvalho atesta que a petição de recurso especial protocolizada sob o nº 2006/053919 foi interposta dentro do prazo legal. [...]
Contudo, a insurgência não merece prosperar.
Com efeito, é assente o entendimento desta Corte no sentido de que a tempestividade dos recursos é aferida pela data do protocolo lançado na petição da interposição destes, e não por comprovante de movimentação ou termo de recebimento, como pretende o agravante.
Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – REMESSA AO TRIBUNAL
RECORRIDO POR VIA POSTAL – PROTOCOLO EM DATA POSTERIOR AO
TERMO FINAL DO PRAZO – INTEMPESTIVIDADE – SÚMULA 216/STJ. 1. É intempestivo o recurso especial que, remetido via Correios ao Tribunal recorrido, foi protocolado em data posterior ao termo final do prazo recursal. Incidência da Súmula 216/STJ. 2. Consoante iterativa jurisprudência, a tempestividade dos recursos dirigidos a esta Corte é aferida pela data do protocolo estampada na petição e não pela data da postagem no correio ou do recebimento da petição por serventuário do Tribunal.
Precedentes. 3. O dever de levar a protocolo, no tempo devido, a petição do recurso especial compete à parte insatisfeita com o provimento jurisdicional prestado, não ao funcionário do Tribunal encarregado do recebimento da correspondência. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido." (AgRg no Ag 851.503/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2007, DJ 01/10/2007 p. 284).
PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL - ATO ILÍCITO - INDENIZAÇÃO - DANO MORAL - AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL INTEMPESTIVO - DESPROVIMENTO. 1 - O v. acórdão recorrido foi publicado no dia 30.05.2005 (fls. 36) tendo o prazo se encerrado no dia 14.06.2005 (terça-feira), e a interposição do Recurso Especial só ocorreu no dia 16.06.2005 (fls. 26), ou seja, em lapso temporal maior ao previsto em Lei. 2 - A prova da tempestividade do recurso especial é feita pela data de protocolo no tribunal. 3 – Agravo regimental desprovido." (AgRg no Ag 718.634/RS, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 13/12/2005, DJ 13/02/2006 p. 825).
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL INTEMPESTIVO. ALEGAÇÃO DE FALHA NO CARIMBO ELETRÔNICO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO NO TRASLADO DO INSTRUMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE SUA JUNTADA EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL. 1. É firme o entendimento deste Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no sentido de que constitui ônus da parte instruir corretamente o agravo de instrumento, fiscalizando a sua formação e o seu processamento, sendo inviável a juntada de qualquer documento na oportunidade da interposição do agravo regimental, pois não supre a irregularidade decorrente da não adoção da providência em tempo apropriado. 2. O agravo deverá ser instruído com todas as peças que dele devem constar obrigatoriamente (artigo 544 do Código de Processo Civil e 28 da Lei nº 8.038/90), além daquelas que sejam essenciais à compreensão da controvérsia (Enunciado nº 288 da Súmula do Supremo Tribunal Federal), inclusive as necessárias à aferição da tempestividade do recurso interposto, cabendo enfatizar, ainda, que "a composição do traslado deve, sempre, processar-se perante o Tribunal a quo." (RTJ 144/948). 3. Cabe ao agravante, quando da interposição do agravo de instrumento perante o Tribunal a quo, fazer constar, do traslado, a prova da tempestividade da insurgência especial inadmitida, a qual se faz mediante o cotejo entre a certidão de publicação do acórdão recorrido e a data do protocolo constante da petição recursal. 4. "Incumbe, à parte recorrente, quando da interposição do agravo de instrumento perante o Tribunal a quo, fazer constar, do traslado, peça comprobatória de que não houve expediente forense no último dia do prazo recursal, em ordem a demonstrar a plena tempestividade de seu recurso, eis que não se presume a ocorrência de fatos excepcionais, como a suspensão temporária das atividades jurisdicionais."(AgRgAg n° 363.066/SP, Relator Ministro Celso de Mello, in DJ 1/10/2002). 5. A ausência do elemento informativo sobre a falha no carimbo eletrônico do Tribunal a quo, quando da interposição do agravo de instrumento, inviabilizou a aferição da tempestividade do recurso especial. 6. O juízo de admissibilidade manifestado pela Presidência do Tribunal a quo, qualquer que seja o seu conteúdo, reveste-se de caráter preliminar, qualificando-se, por conseguinte, como ato jurisdicional meramente provisório, uma vez que sujeito, sempre, à confirmação ulterior da Corte Superior que reapreciará, em toda a sua extensão, a existência ou não dos pressupostos legitimadores da interposição do recurso especial. 7. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag 584.849/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 17/02/2005, DJ 11/04/2005 p. 401).
Ademais, importante salientar que é ônus do Ministério Público, como parte no processo penal, acompanhar o processamento do recurso por ele interposto, solicitando, quando for o caso, certidões que atestem algum equívoco perpetrado pelo Tribunal. In casu, a certidão juntada à fl. 31, atestando que a petição foi interposta dentro do prazo legal, não é documento apto a retirar a legitimidade do protocolo lançado na petição do Recurso Especial, pois não há menção de que houve qualquer equívoco no protocolo, mantendo-se este, portanto, hígido.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
Dessa forma, considerando ser dever da parte diligenciar no sentido de garantir o regular processamento de seu recurso, deveria o ilustre promotor de justiça ter providenciado o protocolo de seu apelo, e não sua simples juntada aos autos. Assim fazendo, assumiu o risco de não ver sua peça ser tempestivamente encaminhada ao setor de protocolo, algo que somente ocorreu após a devolução dos autos à 1ª instância em virtude de identificação do equívoco que, inicialmente, impediu o próprio cadastro do recurso no sistema informatizado desta Corte.
Isto posto, na forma do artigo 557, caput, do CPC, não conheço do presente recurso, eis que manifestamente inadmissível.
Intimem-se. Publique-se na íntegra.
Vitória, 20 de março de 2012.
WILLIAN SILVA
Desembargador Relator