Migalhas Quentes

Alternar prenome de "Egislane" para "Egislaine" é capricho

Autora ingressou com ação para acrescentar vogal ao prenome.

26/3/2012

A 4ª câmara de Direito Civil do TJ/SC manteve a decisão da 2ª vara Cível de Caçador que impediu a modificação do nome de Egislane I.P. A autora ingressou com uma ação de retificação de registro público para alterar o prenome de "Egislane" para "Egislaine". Segundo alega, ocorreu um erro de grafia no momento do registro.

A demandante juntou ao processo diversas correspondências, cópias da carteira de identidade, CPF e carteira de motorista, em que constam o prenome com a vogal a mais. Afirmou que tal situação lhe causa vergonha e constrangimento, sendo conhecida por todos como "Egislaine".

A lei de Registros Públicos (lei 6.015/73) autoriza a alteração do nome somente em casos de erro material, exposição ao ridículo ou relevante razão de ordem pública, e a regra geral é a imutabilidade.

Os desembargadores concordaram com a fundamentação do juiz da origem e negaram o pedido, com base na inexistência de qualquer das situações estipuladas pela lei.

"Anote-se que a insurgente nasceu em 4 de março de 1977 e o pleito inicial foi protocolado em 2 de fevereiro de 2009, quando contava 32 anos. Data maxima venia, não se mostra crível que, durante todo esse tempo, tenha convivido com situação vexatória e sofrido desconforto pela grafia do seu nome. O caso sugere retificação por capricho. Não se verifica a ocorrência de relevante razão de ordem pública para o acolhimento do pleito", afirmou o desembargador Ronaldo Moritz Martins da Silva, relator da decisão. A votação foi unânime.

__________

Apelação Cível n. 2009.059386-3, de Caçador

Relator: Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva

Apelação cível. Ação de retificação de registro público. Julgamento antecipado da lide. Suficiência dos documentos existente nos autos à compreensão dos fatos e à resolução da lide. Prova testemunhal desnecessária. Hipótese de cerceamento de defesa não verificada. Preliminar de nulidade da sentença afastada. Pleito de alteração de prenome. Pedido de inclusão da vogal "i" no prenome "Egislane", à consideração de que assim é conhecida em seu meio social. Desejo pessoal que, por si só, não justifica a quebra da regra geral da imutabilidade do nome. Ausência de situação vexatória. Relevante razão de ordem pública não afirmada. Sentença de improcedência mantida.

Recurso desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.059386-3, da comarca de Caçador (2ª Vara Cível), em que é apelante Egislane I.P.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, à unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Eládio Torret Rocha, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Victor Ferreira.

Florianópolis, 01 de março de 2012.

Ronaldo Moritz Martins da Silva

RELATOR

RELATÓRIO

Perante o Juízo de Direito da 2a Vara Cível da comarca de Caçador, Egislane I.P., propôs "ação de retificação de registro público" (processo n. 012.09.000772-9), objetivando a retificação do seu prenome "Egislane" para "Egislaine", em razão, segundo alega, de erro de grafia ocorrido no momento do registro e por ser assim conhecida em seu meio social (fls. 02/04).

A gratuidade da justiça pleiteada na exordial (fl. 04) foi deferida (fl. 15).

O representante do Ministério Público se manifestou às fls. 16/18 e 33/35.

A MMa. Juíza de Direito, Dra. Viviane Isabel Daniel Speck de Souza, prolatou a sentença de fls. 19/22, cujo dispositivo foi assim redigido:

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado através da presente ação de retificação de registro civil proposta por EGISLANE I.P.. Imponho aos requerentes o pagamento das despesas processuais. Contudo, porque preenchidos os requisitos legais, DEFIRO-LHES os benefícios da justiça gratuita e suspendo a exigibilidade dos pagamentos por cinco anos, salvo se mudança na fortuna do devedor sobrevier, ex vi do disposto no art. 12 da Lei n. 1.060/50, salientando que tal dispositivo está sob o crivo da Suprema Corte, a qual analisará sua recepção pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (RE n. 284.729-MG, relator Ministro Joaquim Barbosa).

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Transitada em julgado esta decisão e cumprido o Provimento n. 08/2007, arquive-se.

Inconformada, a postulante apelou (fls. 25/30), arguindo, preliminarmente, cerceamento de defesa, diante do julgamento antecipado da lide, sendo impossibilitada de produzir prova testemunhal.

Quanto à matéria de fundo, alegou, em síntese, que 1) resta evidente o erro material de grafia no momento do registro de sua certidão de nascimento, pois foi omitida a vogal "i" em seu prenome; 2) "[...] tal situação lhe causa constrangimento e vergonha [...]" (fl. 30); 3) sempre é questionada sobre tal fato; 4) é conhecida no meio social por "Egislaine"; 4) recebe certificados e correspondências, nos quais consta o prenome "Egislaine".

A Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer de fls. 40/42, da lavra do Dr. Nelson Fernando Mendes opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

Esse é o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 24/25), anotando-se que a recorrente é beneficiária da gratuidade da justiça (fl. 15).

1 Do cerceamento de defesa

A insurgente sustenta, em preliminar, que não lhe foi oportunizada a produção de provas, em especial a oitiva de testemunhas, razão pela qual restou configurado o cerceamento de defesa.

Repousam nos autos

1) os certificados e correspondências bancárias, nas quais constam o nome da requerente como "Egislaine I.P." (fls. 07/11);

2) as cópias da carteira de identidade, do CPF e da carteira de motorista da demandante (fl. 12);

3) as certidões de nascimento da autora (fl. 13) e de sua filha (fl. 14).

In casu, os aludidos documentos são suficientes à compreensão dos fatos e à resolução da lide.

A insurgente não justificou o fato ou os fatos que pretendia demonstrar com a prova oral. A grafia de seu nome com a vogal "i" está informada no processo.

Eventual situação vexatória seria declarada por testemunhas mediante a exposição de caráter subjetivo. A isto não se presta essa modalidade de prova.

A produção de prova oral, portanto, apresenta-se desnecessária.

É assente na jurisprudência o entendimento de que, versando a causa sobre matéria de direito e de fato, inexiste cerceamento de defesa se o julgador encontra no acervo documental juntado pelas partes elementos suficientes para a formação de seu convencimento.

Aplicáveis à espécie:

1) Apelação Cível n. 2007.054307-5, de Fraiburgo, rel. Des. Joel Figueira Júnior, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 11.03.2008:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. [...]. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE [...].

I - Não há cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide se o juiz formou seu convencimento diante das provas constantes dos autos, mostrando-se prescindível a instrução processual por tratar-se de matéria de direito e de fato documentalmente comprovada [...].

2) Apelação Cível n. 2004.006008-4, de Rio do Sul, rel. Des. Mazoni Ferreira,

Segunda Câmara de Direito Civil, j. 15.10.2007:

1. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVAS. DOCUMENTAÇÃO SUFICIENTE PARA FORMAR O CONVENCIMENTO DO JULGADOR. EXEGESE DO ART. 330, I, DO CPC.

Se as provas existentes nos autos são suficientes ao convencimento do julgador, não se decreta a nulidade da sentença pelo julgamento antecipado da lide. [...].

3) Apelação Cível n. 2006.003288-5, da Capital, rela. Desa. Salete Silva Sommariva, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 21.08.2007:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ELEMENTOS SUFICIENTES À FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. VIABILIDADE (CPC, ART. 330, I). [...].

I - Não incorre em cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando a controvérsia recair sobre matéria passível de solução mediante o simples exame dos documentos carreados aos autos. [...]. Assim, afasta-se a prefacial suscitada.

2 Do mérito

A demandante postula a alteração de seu prenome, sob a alegação de erro de grafia ocorrido no momento do registro e de que é conhecida no meio social como "Egislaine".

A regra geral no ordenamento jurídico é a da imutabilidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro material, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública.

O artigo 57 da Lei n. 6.015/1973 dispõe:

Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei. (Redação dada pela Lei n. 12.100 de 2009).

Anote-se que a insurgente nasceu em 04.03.1977 e o pleito inicial foi protocolado em 02.02.2009, quando contava com 32 anos. Data maxima venia, não se mostra crível que, durante todo esse tempo, tenha convivido com situação vexatória e sofrido desconforto pela grafia do seu nome. O caso sugere retificação por capricho.

Não se verifica a ocorrência de relevante razão de ordem pública para o acolhimento do pleito.

Sublinhe-se que, em caso semelhante (Apelação Cível n. 2005.013169-2, de Jaraguá do Sul, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 08.04.2009), este relator lavrou acórdão no sentido de permitir retificação de prenome no registro civil.

Naquele caso, o autor era menor, não se observou capricho pessoal, não se constatou arrependimento ou possibilidade de violação dos princípios que determinam a imutabilidade do nome. Conclui-se que a retificação se justificava, para harmonizar, no contexto social, a pessoa do autor com o nome pelo qual era identificado.

Aplicáveis à espécie:

1) Apelação Cível n. 2010.055630-2, de Chapecó, rela. Desa. Maria Terezinha Mendonça de Oliveira, Câmara Especial Regional de Chapecó, j. 01.12.2011:

DIREITO CIVIL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. PRENOME QUE NÃO EXPÕE A AUTORA AO RIDÍCULO OU LHE ACARRETE CONSTRANGIMENTO. ALTERAÇÃO DESNECESSÁRIA NA HIPÓTESE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabilidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro de grafia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública. Assim, o pedido de retificação de registro civil que não se funda em qualquer dessas hipóteses, não pode ser deferido (in Apelação Cível n. 2009.047284-4, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 25.11.2009).

2) Apelação Cível n. 2008.046672-1, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Victor Ferreira, Quarta Câmara de Direito Civil, j.12.05.2010:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. INCLUSÃO DA LETRA CONSOANTE "H" NO PRENOME "TIAGO". CAPRICHO PESSOAL. EXCEPCIONALIDADE NÃO CONFIGURADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

"Apelação cível. Retificação de registro civil. Pedido para inclusão do nome Lucas no registro de nascimento do autor, à consideração de que assim é conhecido em seu meio social. Desejo pessoal que, por si só, não justifica a regra geral da imutabilidade do nome. Relevante razão de ordem pública não afirmada e não comprovada. Gratuidade da justiça e assistência judiciária. Distinção. Causa proposta por meio de advogado constituído. Remuneração pelo Estado indevida. Recurso desprovido". (in TJSC, Ap.Cív. n. 2006.010118-0, da Capital, rel. Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva, j. 22.09.2008).

3) Apelação Cível n. 2006.004433-0, de Criciúma, rel. Des Carlos Prudêncio, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 13.07.2009:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. MEDIDA EXCEPCIONAL. ERRO NÃO CONFIGURADO. NOME DE FAMÍLIA. RECURSO NÃO PROVIDO.

"O prenome, assim como o nome, são atributos da personalidade e necessários à identificação das pessoas no contexto de uma sociedade organizada, e por isso a regra da imutabilidade preconizada pela Lei de Registros Públicos (art. 58)" (Apelação Cível n. 1996.000919-1, j. 22.10.1996, rel. Des. Carlos Prudêncio).

4) Apelação Cível n. 2008.019128-8, de Sombrio, rel. Des. Fernando Carioni, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 29.07.2008:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO NO REGISTRO CIVIL. MODIFICAÇÃO DO PRENOME NO ASSENTO DE NASCIMENTO. AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO VEXATÓRIA OU ERRO DE GRAFIA CAPAZ DE AUTORIZAR A MUTABILIDADE DO NOME. ARTIGO 58 DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. RECURSO DESPROVIDO.

Diante da credibilidade e segurança recaída sobre o registro civil de pessoas naturais, a retificação dos nomes lá consignados é medida excepcional e não serve para satisfazer meros caprichos, porquanto a credibilidade desse documento é imperativa, uma vez que retrata a situação dos pais no momento do parto, aí compreendidos os nomes e sobrenomes.

Por estas razões, o reclamo, data venia, merece ser desprovido.

Esse é o voto.

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