Notificação
Processo no TCE/SP é anulado por falta de notificação pessoal da parte
A 5ª câmara de Direito Público do TJ/SP entendeu que não tem validade a advertência inicial em processo administrativo de tomada de contas que subverte e mitiga o direito ao exercício da ampla defesa. Desta forma, a decisão anulou um processo no TCE/SP, no qual a parte não foi notificada pessoalmente sobre a demanda.
De acordo com a decisão, o apelante não foi notificado das decisões do relatório de auditoria. Ele alega que a publicação no diário oficial não tem o condão de conferir ciência ao interessado.
Analisando a lei Orgânica do Tribunal de Contas, o desembargador Fermino Magnani Filho afirmou que o artigo 91 contém norma especial, que determina a intimação pessoal. Para ele, "não há possibilidade de mitigação deste comando por decisão do Administrador, considerando-se não escrita qualquer tentativa de se desvencilhar do dever que a lei impõe".
De acordo com o magistrado, a praticidade da citação por edital deve ceder lugar à legalidade da intimação pessoal imposta pela lei.
A causa foi patrocinada pelos escritórios Bottini & Tamasauskas Advogados e Tojal, Teixeira Ferreira, Serrano & Renault Advogados Associados.
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Processo: 0131220-84.2008.8.26.0053
Veja abaixo a íntegra da decisão.
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
5ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICORegistro: 2012.0000083340
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0131220-84.2008.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante JOSE JACINTO DE OLIVEIRA sendo apelado FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
ACORDAM, em 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U. Sustentou oralmente o Dr. Renato Sciullo Faria.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores FRANCO COCUZZA (Presidente) e MARIA LAURA TAVARES.
São Paulo, 5 de março de 2012.
FERMINO MAGNANI FILHO
RELATOR
VOTO Nº 7923
APELAÇÃO Nº 0131220-84.2008.8.26.0053 COMARCA DE ORIGEM: SÃO PAULO APELANTE(S): JOSE JACINTO DE OLIVEIRA APELADO(S): FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
AÇÃO ANULATÓRIA Processo de tomada de contas de exdirigente de empresa municipal de transporte coletivo Notificação pessoal inicial que incumbiu o interessado do acompanhamento de todos os atos posteriores do procedimento administrativo Impossibilidade Inteligência dos artigos 90 e 91 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (LC 709/1993) Impossibilidade de restrição infralegal de direito constitucionalmente assegurado Apelação provida.
Vistos.
Apelação tempestiva interposta por José Jacinto de Oliveira contra r. sentença do digno Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital (fls 197/202), que julgou improcedente ação anulatória ajuizada contra a Fazenda Pública do Estado de São Paulo. Demanda cujo objeto consistia na anulação de decisões proferidas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo nos autos do processo TC nº 003206/026/05, por cerceamento de defesa.
Recurso fundado, em síntese, nestas teses: a) ausência de respeito ao devido processo legal e ao contraditório no procedimento administrativo; b) o apelante não foi notificado das decisões do Relatório de Auditoria; c) a publicação no diário oficial não tem o condão de conferir ciência ao interessado acerca do relatório de auditoria; d) aplicabilidade da Súmula Vinculante nº 3 (fls 208/223).
Apelo respondido, com a preliminar de carência de ação diante da ausência de caráter sancionatório da decisão do Tribunal de Contas.
É o relatório.
Ação anulatória ajuizada por José Jacinto de Oliveira contra a Fazenda Paulista, pleiteando a anulação das decisões proferidas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo nos autos do Processo TC nº 3206/026/05, para tomada de contas da Empresa de Transporte Coletivo de Diadema (ETCD), relativas ao exercício de 2005.
Insurgência autoral que tem seu lastro na ofensa ao devido processo legal, em razão do descumprimento das normas estabelecidas na Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (Lei Complementar Estadual nº 709/1993), em especial, a notificação/intimação pessoal prescrita no artigo 91 desta Lei, a despeito do disposto no Ofício nº 83/2006-GDF, remetido ao autor (fls 32).
Discute-se, enfim, a validade de uma notificação pessoal inicial que supra a necessidade intimações pessoais futuras, bastando para tanto a publicação dos atos e decisões em diário oficial como preconiza o Estado de São Paulo. Contudo, semelhante entendimento não deve vigorar, pois restritivo de direitos, e desconforme com os preceitos constitucionais e legais.
De início, é necessário trazer à colação os ensinamentos de Pedro Roberto Decomain, segundo o qual sempre que no exercício de suas funções os Tribunais ou Conselhos de Contas vislumbrarem a possibilidade de que alguém possa tê-las rejeitadas, ou possa vir a ser passível da determinação de que restitua recursos ao Erário público, podendo também vir a sofrer penalidade administrativa, consoante lhes permite aplicá-las o inciso VIII, do art. 71, da CRFB/88, devem primeiramente facultar a manifestação do responsável pelos atos que estejam submetidos à apreciação do Tribunal ou Conselho, para que referido interessado possa, querendo, defender-se. Apenas depois de facultada a sua manifestação é que cumpre proferir o Tribunal ou Conselho o seu parecer prévio ou sua decisão acerca do assunto. A não se proceder desse modo, poderá a decisão tornar-se passível de anulação por defeito formal, em decorrência de cerceamento do direito de defesa, assegurado constitucionalmente a todo aquele que esteja diante da possibilidade de sofrer sanção, inclusive administrativa, como decorrência direta e imediata do procedimento em que se acha envolvido (Tribunais de Contas no Brasil, página 145, Dialética, 2006).
Analisando a Lei Orgânica do Tribunal de Contas, sobressalta aos olhos, para o deslinde da causa, as normas inseridas nos artigos 90 e 91:
Artigo 90 - A intimação dos atos e decisões do Tribunal de Contas presume-se perfeita com a publicação no Diário Oficial, salvo as exceções previstas em lei;
Artigo 91 - A notificação, em processo de tomada de contas, convidando o responsável, sob as penas da lei, a prestar informações, a exibir documentos novos ou a defender-se, bem como a intimação de que foi condenado em alcance ou multa serão feitas:
I - pessoalmente;
II - com hora certa;
III - por via postal ou telegráfica;
IV - por edital
A exegese dos artigos permite concluir que o artigo 91 contém norma especial, e nestas ocasiões determina a intimação pessoal. Não há possibilidade de mitigação deste comando por decisão do Administrador, considerando-se não escrita qualquer tentativa de se desvencilhar do dever que a lei impõe.
Ora, a considerar de outro modo, estaríamos permitindo a inversão dos ônus e deveres das partes no processo administrativo de tomada de contas, em prejuízo do requerido. Ou seja, impõe-se a ele um dever que o legislador não impôs. A praticidade da citação por edital deve ceder lugar à legalidade da intimação pessoal imposta pela lei.
Ademais, esta Corte não tem admitido flexibilizações formais em ofensa ao artigo 91 da Lei Complementar nº 709/93.
AÇÃO ANULATÓRIA Decisão proferida pelo TCE/SP, que julgou irregular a licitação e o contrato administrativo formalizados pelo Prefeito Municipal Alegada violação ao princípio da ampla defesa e do contraditório Cabimento Ausência de notificação pessoal do Alcaide, na forma do art. 91 da Lei Complementar nº 709/93 Não é válida a intimação genérica pelo Diário Oficial a fim de atingir parte interessada no julgamento Inobservância do disposto no artigo 5º, LV, da CF Precedentes Súmula vinculante nº 3 do STF Ação julgada improcedente na 1ª Instância Sentença reformada Recurso provido (Apelação Cível nº 0039467-12.2009.8.26.0053, 6ª Câmara de Direito Público, relator Desembargador Leme de Campos, j. 23/05/2011).
Assim, não tem valor a advertência inicial em processo administrativo de tomada de contas que subverte e mitiga o direito ao exercício da ampla defesa.
Por meu voto, dou provimento à apelação.
FERMINO MAGNANI FILHO
Desembargador Relator