Boa-fé
Acordo em cheque pré-datado não vincula terceiros que o sacaram antes do prazo
O emitente deu o cheque pré-datado para um mercado, ficando acertado que o depósito só ocorreria em janeiro de 2004. O mercado repassou o documento para um posto de gasolina, que o depositou antes do prazo, em dezembro de 2003. Como não havia fundos, o cheque foi devolvido, causando o bloqueio da conta corrente e a negativação do nome do emitente. Ele entrou com ação de indenização por danos morais contra o posto.
A indenização foi concedida em primeira instância, no valor de R$ 4 mil, e o posto recorreu ao TJ/SC, afirmando não ser parte legítima para figurar como réu no processo. O Tribunal catarinense afirmou, entretanto, que o abalo moral estava configurado e que a empresa tinha, sim, legitimidade passiva. Observou que o cheque conteria claramente a data em que deveria ser descontado, portanto haveria conhecimento prévio do prazo acertado para a compensação.
No recurso ao STJ, a defesa do posto de combustíveis afirmou que não se demonstrou a inequívoca ciência de que o cheque deveria ser descontado posteriormente. Também sustentou que, quando o cheque volta a circular, readquire sua qualidade de ordem de pagamento à vista. Também haveria ofensa aos artigos quarto da lei de Introdução ao CC e 126 do CPC (clique aqui), que autorizam que o juiz julgue por analogia em casos de omissão. No caso, seria aplicável a lei 7.357/85 (clique aqui).
Para o ministro Luis Felipe Salomão, é incontroverso que o cheque circulou e que não consta como data de emissão aquela supostamente pactuada, mas a data em que foi efetivamente emitido. "O cheque é ordem de pagamento à vista e submete-se aos princípios da literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé", explicou.
Os cheques podem circular, independentemente das causas de sua emissão e, sendo um título de crédito, dão aos terceiros plena garantia na sua aquisição. O relator também apontou que o artigo 32 da lei do cheque é claro em defini-lo como pagável à vista, considerando-se não escrita qualquer ordem contrária. "Não se desconhece o costume relativo à emissão de cheque pós-datado, todavia é prática expressamente inadmitida pela lei que cuida da matéria", destacou.
Além disso, continuou o ministro, aplica-se na situação o princípio da relatividade dos efeitos do contrato, que determina que o pacto gera obrigações para as partes, mas não vincula ou cria obrigações para terceiros. O ministro observou que, apesar de a súmula 370 do próprio STJ orientar que há dano moral na apresentação antecipada do cheque pós-datado, essa regra se aplica aos pactuantes e não a terceiros, como o posto de gasolina. O restante da 4ª turma acompanhou integralmente o voto do ministro Salomão.
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Processo Relacionado : REsp 884.346 - clique aqui.
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