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Cobrança de dívidas condominiais prescreve em cinco anos

Entendimento é da 3ª turma do STJ.

8/9/2011

A cobrança de cotas condominiais prescreve em cinco anos, a partir do vencimento de cada parcela. Esse foi o entendimento da 3ª turma do STJ, ao considerar que os débitos condominiais são dívida líquida constante de instrumento particular e o prazo prescricional aplicável é o estabelecido pelo artigo 206, parágrafo 5º, inciso I do CC/02 (clique aqui).

Um condomínio carioca ajuizou ação de cobrança contra um morador, requerendo o pagamento das cotas condominiais devidas desde junho de 2001. O juízo de primeiro grau rejeitou a preliminar de prescrição, por considerar que, na ação de cobrança de cotas condominiais, incide a prescrição de dez anos, prevista no art. 205 do CC/02. O condômino apelou, mas o TJ/RJ manteve a sentença, por entender não haver regra específica para a hipótese.

No REsp interposto no STJ, o morador sustentou que o valor das despesas condominiais encontra-se prescrito, nos termos do art. 206, parágrafo 5º, inciso I do CC, que estabelece que a pretensão à cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular prescreve em cinco anos.

Requisitos

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, observou que são necessários dois requisitos para que a pretensão se submeta ao prazo prescricional de cinco anos: dívida líquida e definida em instrumento privado ou público. "A expressão 'dívida líquida' deve ser compreendida como obrigação certa, com prestação determinada", argumentou a ministra. Já o conceito de "instrumento" deve ser interpretado como "documento formado para registrar um dever jurídico de prestação".

Nancy Andrighi destacou que alguns doutrinadores defendem que o prazo prescricional de cinco anos não se aplica às cotas condominiais, pois tais despesas não são devidas por força de declaração de vontade expressa em documento, mas em virtude da aquisição de um direito real. Entretanto, a ministra apontou que a previsão do art. 206 não se limita às obrigações em que a fonte seja um negócio jurídico.

Desse modo, o dispositivo incide nas hipóteses de obrigações líquidas – independentemente do fato jurídico que deu origem à relação obrigacional –, definidas em instrumento público ou particular. Tendo em vista que a pretensão de cobrança do débito condominial é lastreada em documentos, avaliou a ministra, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos.

"Isso porque, apenas quando o condomínio define o valor das cotas condominiais, à luz da convenção (artigos 1.333 e 1.334 do CC) e das deliberações das assembleias (artigos 1.350 e 1.341 do CC), é que o crédito passa a ser líquido, tendo o condômino todos os elementos necessários para cumprir a obrigação a ele imposta", concluiu a relatora.

No caso julgado, a ministra Nancy Andrighi constatou que a ação de cobrança foi ajuizada em 19/12/03, mas o condômino foi citado somente em 15/4/08, tendo transcorrido, entre a entrada em vigor do novo CC e a citação, intervalo superior a cinco anos.

A relatora lembrou que, conforme jurisprudência do STJ, a citação válida interrompe a prescrição, que retroage à data de propositura da ação quando a demora na citação do executado se deve a outros fatores, não à negligência do credor. "Assim, para a solução da controvérsia, é imprescindível descobrir se a demora na citação ocorreu por motivos inerentes ao mecanismo da justiça ou em virtude da omissão/inércia do autor", frisou.

Como a análise de fatos e provas em REsp é vedada pela súmula 7/STJ, a ministra Nancy Andrighi deu parcial provimento ao recurso para corrigir a aplicação da regra de prescrição e determinar a remessa dos autos ao TJ/RJ, a fim de que verifique a ocorrência de eventual prescrição. A decisão foi unânime.

Veja abaixo a íntegra do acórdão.

__________

RECURSO ESPECIAL Nº 1.139.030 - RJ (2009/0086844-6)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : J.L.R.C.

ADVOGADO : DAVID ALFREDO NIGRI E OUTRO(S)

RECORRIDO : CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUIZ CARDOSO

ADVOGADO : MARCONDES DE SOUZA CASTRO

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE COBRANÇA DE QUOTAS CONDOMINIAIS. INCIDÊNCIA DO 206, § 5º, I DO CC/02.

1. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração.

2. Na vigência do CC/16, o crédito condominial prescrevia em vinte anos, nos termos do seu art. 177.

3. Com a entrada em vigor do novo Código Civil, o prazo prescricional aplicável à pretensão de cobrança das quotas condominiais passou a ser de cinco anos, nos termos do art. 206, § 5º, I, do CC/02, observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/02.

4. Recurso especial parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Brasília (DF), 18 de agosto de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso especial interposto por J.L.R.C., com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional.

Ação: de cobrança, ajuizada pelo CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUIZ CARDOSO, em face do recorrente, na qual requer o pagamento das cotas condominiais devidas desde o mês de junho de 2001.

Sentença: julgou procedente o pedido. O juízo de primeiro grau rejeitou a preliminar de prescrição, sob o fundamento de que na ação de cobrança de cotas condominiais incide a prescrição decenal, prevista no art. 205 do CC/02.

Acórdão: negou provimento à apelação interposta pelo recorrente, asseverando que o crédito condominial prescreve em dez anos, nos termos do art. 205 do CC/02, incidindo o lapso prescricional a partir da vigência do Novo Código, conforme inteligência do art. 2.028 do CC/02. Confira-se a ementa (e-STJ fl. 207):

SUMÁRIA. AÇÃO DE COBRANÇA DE COTAS CONDOMINIAIS. INEXISTINDO NOS AUTOS PROVA DO PAGAMENTO DAS COTAS CONDOMINIAIS RECLAMADAS, EXIBE-SE INCENSURÁVEL A SENTENÇA QUE CONDENOU O CONDÔMINO A SOLVÊ-LAS. É DESNECESSÁRIA A JUNTADA DA ATA DE ASSEMBLÉIA SE HÁ NOS AUTOS OUTROS MEIOS DE COMPROVAR O DÉBITO E A PREVISÃO DE RATEIO DAS DESPESAS, COMO DE FATO É A CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO E OS BOLETOS DE PAGAMENTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. UNÂNIME.

Embargos de declaração: interpostos pelo recorrente, foram rejeitados.

Recurso especial: alega violação dos arts. 535 do CPC; 205 e 206, § 5º, do CC/02. Sustenta que: i) o TJ/RJ, ao rejeitar os embargos declaratórios, teria deixado de se manifestar acerca de suposta omissão contida no acórdão recorrido; ii) valor devido em virtude de despesas condominiais encontra-se prescrito, nos termos do art. 206, § 5º, do CC/02, o qual estabelece que a pretensão à cobrança “de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular” prescreve em cincos anos.

Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/RJ admitiu o recurso especial (e-STJ fls. 16/17), determinando a subida dos autos ao STJ.

É o relatório.

VOTO

I – Da delimitação da controvérsia

Cinge-se a controvérsia a determinar se o prazo prescricional aplicável às dívidas condominiais é o estabelecido pelo art. 205 do CC/02 – por inexistir prazo específico definido em lei – ou o previsto no art. 206, § 5º, I, do CC/02.

II- Da violação do art. 535 do CPC

O recorrente alega que houve negativa de prestação jurisdicional, pois o TJ/RJ deixou se manifestar sobre questões suscitadas nos autos e relevantes para o julgamento do processo

Constata-se, entretanto, que o Tribunal de origem se pronunciou de maneira a abordar a discussão de todos os aspectos fundamentais do julgado, dentro dos limites que lhe são impostos por lei, tanto que integram o objeto do próprio recurso especial e serão enfrentados logo adiante, inexistindo, por conseguinte, qualquer violação do art. 535 do CPC.

III- Do prazo prescricional aplicável à pretensão de cobrança das cotas condominiais

O TJ/RJ – considerando o prazo prescricional ordinário de vinte anos previsto pelo Código Civil de 1916 e observando a regra de transição prevista no art. 2.028 do CC/02 – determinou que, na hipótese, a prescrição deveria ser regulada pelo novo Código Civil, já que não havia transcorrido mais da metade do tempo estabelecido pelo Código revogado.

Assim, o Tribunal de origem entendeu que, à luz do Código Civil de 2002, o prazo prescricional da pretensão de cobrança das contribuições condominiais passou a ser de 10 anos (art. 205 do CC/02), por não haver regra específica para a hipótese.

O recorrente, contudo, alega que, sob a égide do Novo Código Civil, o prazo prescricional para a cobrança das cotas condominiais é de 5 anos – aplicando-se o art. 206, § 5º, I do CC/02 – , por considerar que o referido débito é dívida líquida constantes de instrumento particular.

Importa lembrar, à guisa de considerações iniciais, que o Código Civil de 1916 estabelecia dois prazos prescricionais ordinários, distinguindo as ações fundadas em direitos reais e pessoais. Assim – na vigência do Código anterior – a prescrição da pretensão de cobrança de encargos condominiais, tendo em vista a natureza pessoal da ação, era vintenária, consoante previsão do art. 177 do CC/16. Esse, inclusive, era o entendimento adotado pelo STJ. Confira-se: AgRg no Ag 305.718/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 16/10/2000; AgRg no Ag 135.435/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 25/08/1997; REsp 88.885/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ 17/02/1997.

O novo Código Civil não adotou essa diferenciação de prazos para as ações pessoais e as reais, estabelecendo o prazo prescricional ordinário único de 10 anos – aplicável a todas as pretensões para as quais a lei não estabeleceu prazo menor.

Além disso, as hipóteses de incidência do prazo ordinário de prescrição foram reduzidas diante das novas disposições trazidas pelo Código Civil de 2002, entre elas, a regra do art. 206, § 5º, inciso I, de que trata do prazo para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.

Feitas essas considerações, deve ser analisado se a nova regra contida no art. 206, § 5º, I, do CC/02 é aplicável às despesas de condomínio.

III.1) Da aplicação do art. 206, §5º, inciso I do CC/02 às dívidas relacionadas às despesas do condomínio

A redação do inciso I do § 5º do art. 206 do CC/02 estabelece que prescreve em 5 anos "a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular".

Observa-se, assim, que, para que a pretensão submeta-se ao prazo prescricional de cinco anos, é necessário dois requisitos: a) dívida líquida; e b) definida em instrumento privado ou público.

A expressão “dívida líquida” deve ser compreendida como obrigação certa, com prestação determinada.

No que tange ao conceito de “instrumento”, vale registrar a lição de Marinoni (MARINONI. Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 534), que o define como documento formado com o fim específico de servir para comprovar o fato jurídico nele representado.

Assim, considerando-se o texto do dispositivo legal, a palavra “instrumento” deve ser interpretada como documento formado para registrar um dever jurídico de prestação.

Cumpre ressaltar que alguns doutrinadores (entre eles, ANGÉLICO, Américo Izidoro. Condomínio no novo código civil. São Paulo : J. de Oliveira, 2005, p. 81) defendem que o prazo prescricional de cinco anos não se aplica às cotas condominiais, porque essas despesas não são devidas por força de uma declaração de vontade expressa em um documento, mas em virtude da aquisição de um direito real. Todavia, a previsão do art. 206, §5º, I, do CC/02 não se limita às obrigações em que a fonte seja um negócio jurídico.

Assim, na linha dessa perspectiva hermenêutica, o art. 206, §5º, I, do CC/02 incide nas hipóteses de obrigações líquidas – independentemente do fato jurídico que deu origem à relação obrigacional –, definidas em instrumento público ou particular.

Dessa forma, tendo em vista que a pretensão de cobrança do débito condominial é lastreada em documentos aplica-se o prazo prescricional de 5 anos, conforme estabelece o art. 206, § 5º, I do CC/02.

Isso porque apenas quando o condomínio define o valor das cotas condominiais, à luz da convenção (art. 1.333 e 1.334 do CC/02) e das deliberações das assembleias (art. 1.350 e 1.341 do CC/02), é que o crédito passa a ser líquido, tendo o condômino todos os elementos necessários para cumprir a obrigação a ele imposta.

Corroborando com essa ideia, Arnaldo Rizzardo (Condomínio edilício e incorporação imobiliária . Rio de Janeiro : Forense, 2011, p. 131) afirma:

No tocante à ação de cobrança das despesas, pensa-se que incide a regra do artigo 206, § 5º, I do Código Civil, prevendo a prescrição em cinco anos para a “pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular”. Realmente, as dívidas decorrentes de despesas condominiais estão lastreadas em documentos, pois correspondem a compras de mercadorias, ao pagamento de empregados e prestadores de serviço, e de toda sorte de despesas havidas no edifício. Ademais encontra amparo na convenção e em assembléias e, são calculadas em função da quantidade de condôminos existentes, já que divididas entre todos, em função da área de titularidade de cada um.

A pretensão de cobrança das cotas condominiais prescreve, portanto, em cinco anos, a partir do vencimento de cada parcela condominial.

Definido o prazo prescricional, falta analisar se, na hipótese, houve a prescrição da pretensão do condomínio.

Constata-se, da análise dos autos, que a cota condominial mais antiga cobrada pelo recorrido refere-se a junho de 2001 (e-STJ fl. 2). Considerando o prazo vintenário previsto pelo CC/16, bem como a regra de transição do art. 2.028 do CC/02, o prazo prescricional aplicável na espécie é o do art. 206, § 5º, I do CC/02, iniciando-se a contagem do novo prazo prescricional – em relação às parcelas cujo inadimplemento ocorreu antes da vigência do atual Código Civil – a partir da vigência do CC/02.

Observa-se, contudo, que a ação de cobrança foi ajuizada em 19.12.03 (e-STJ fl. 02) e o recorrente somente foi intimado em 15.04.2008 (e-STJ fl. 133), tendo transcorrido entre a entrada em vigor do novo código civil e a citação lapso temporal superior a 5 anos.

Cumpre ressaltar que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que, nos termos do art. 219, § 1º, do CPC, a citação válida interrompe a prescrição, que “retroagirá à data de propositura da ação” quando a demora na citação do executado se deve a outros fatores, e não à desídia do credor. Nesse sentido: AgRg na MC 17.261/AP, 3ª Turma, de minha relatoria, DJe 12/11/2010; EREsp 620.218/GO, 2º Seção, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 11/10/2007.

Assim, para a solução da controvérsia é imprescindível descobrir se a demora na citação ocorreu por motivos inerentes ao mecanismo da justiça ou em virtude da omissão/inércia do autor.

Contudo, a apreciação da referida questão demanda a análise do conjunto fático-probatório, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7/STJ. Dessa forma, os autos devem retornar à origem para essa finalidade.

Forte nessas razões, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso especial, para alterar a regra de incidência da prescrição nos termos expostos no voto e, consequentemente, determinar a remessa dos autos ao TJ/RJ para que verifique a ocorrência de eventual prescrição.

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