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TJ/PR reduz indenização a ser paga a parentes de homem que faleceu por falta de atendimento médico

Acórdão da 10ª câmara Cìvel do TJ/PR decide pela redução da indenização por morte porque o valor inicial consignado, corrigido durante os anos de tramitação do processo, superava os parâmetros jurisprudenciais fixados pela Corte.

23/8/2011


Indenização

TJ/PR reduz indenização a ser paga a parentes de homem que faleceu por falta de atendimento médico

A 10ª câmara Cível do TJ/PR reduziu o valor de uma indenização a ser recebida por filha e mulher de um homem que faleceu após ter atendimento médico negado. O valor fixado na sentença inicial era de R$ 80 mil, mas corrigido nos sete anos de tramitação do processo chegou a R$ 150 mil.

Quantia, que no entendimento do desembargador Luiz Lopes, é "destoante dos julgados dessa Câmara, para situações desse jaez". A decisão determinou que cada uma das autoras seja indenizada no valor de R$ 20 mil.

Veja abaixo a íntegra do acórdão.

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 677.378-4 12ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA APELANTE: SOCIEDADE BIO- MÉDICA HOSPITALAR LTDA.

APELADAS: JUCIMARA DA VEIGA MULLER e OUTRA RELATOR DESIGNADO: DES. LUIZ LOPES

RESPONSABILIDADE CIVIL - SERVIÇO DE ATENDIMENTO MÉDICO DE EMERGÊNCIA "VIDA EMERGÊNCIAS MÉDICAS" - AGRAVOS RETIDOS - RELAÇÃO DE CONSUMO, RESPONSABILIDADE OBJETIVA E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA ANTE A PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS - INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA - CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO - PACIENTE IDOSO QUE RECEBE ATENDIMENTO DOMICILIAR, TENDO SIDO DIAGNOSTICADO COM QUADRO DE INSUFICIÊNCIA ARTERIAL AGUDA E 2 ANGINA PECTORIS, E NÃO É TRANSFERIDO IMEDIATAMENTE AO HOSPITAL, VINDO A FALECER HORAS DEPOIS, DE INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO - DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL CONFIGURADO - FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS CARACTERIZADA - INDENIZAÇÃO DEVIDA - DANOS MORAIS - FIXAÇÃO EQUITATIVA - REDUÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MANUTENÇÃO. AGRAVOS RETIDOS DESPROVIDOS. RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO.

1 - Caracterizada a relação de consumo, com a conseqüente incidência da legislação consumerista, correta a decisão que, diante dos pressupostos autorizadores, determina a inversão do ônus probatório, notadamente em razão da hipossuficiência das autoras.

2 - O reconhecimento da responsabilidade objetiva pela 3 decisão agravada não gera qualquer prejuízo à parte, se a controvérsia é dirimida, também, mediante a investigação de culpa, sob a ótica da responsabilidade subjetiva.

3 - Revela-se de todo impertinente a oitiva de testemunha cujo depoimento em nada poderia interferir no resultado do julgamento, não havendo que se falar, portanto, em cerceamento de defesa.

4 - Patenteado está o descumprimento contratual pela ré que, a despeito do quadro clínico apresentado por paciente, com 82 anos de idade e dor torácica persistente, se limita a ministrar- lhe medicamentos via oral, deixando de efetuar o traslado imediato ao hospital, dada a relevância dos sintomas, vindo o paciente a falecer, horas depois, de infarto agudo do miocárdio.

5 - Além do descumprimento 4 contratual, resulta evidente, ainda, a falha na prestação dos serviços, que conduz à responsabilização, na forma objetiva, frente às disposições do Código de Defesa do Consumidor.

6 - Indiscutível o cabimento de indenização por danos morais na espécie, em razão da morte do esposo e pai das autoras.

7 - A fixação do montante devido a título de indenização por danos morais fica ao prudente arbítrio do Julgador, devendo pesar nestas circunstâncias, a gravidade e duração da lesão, a possibilidade de quem deve reparar o dano, e as condições do ofendido, cumprindo levar em conta que a reparação não deve gerar o enriquecimento ilícito, constituindo, ainda, sanção apta a coibir atos da mesma espécie.

8 - Considerando que o feito demandou a produção de provas em 5 audiência, bem como o trabalho desenvolvido pelos doutos causídicos, não há suporte para a pretendida redução da verba honorária, que resta mantida, portanto, em 20% sobre o valor da condenação.

VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº 677.378-4, da 12ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de CURITIBA, em que é apelante SOCIEDADE BIO-MÉDICA HOSPITALAR LTDA. e apeladas JUCIMARA DA VEIGA MULLER e OUTRA.

Trata a espécie de pretensão indenizatória por danos morais, constando da inicial que no dia 07.12.01, a segunda autora, Teresa da Veiga Muller, aderiu ao contrato de prestação de serviços de medicina de emergência, disponibilizado pela ré, na modalidade "plano 2" que inclui atendimento com UTI'S móveis no local, com acompanhamento por médico e paramédico, e remoção do paciente para determinado estabelecimento hospitalar, se necessário.

Narram que no dia 21.02.04, por volta das 20h00min, o marido da segunda autora, Venâncio da Veiga Oliveira, começou a reclamar de dores fortes no peito e formigamento nas mãos, as quais se tornaram insuportáveis, daí porque resolveram chamar o atendimento de emergência da requerida, cuja central lhes atendeu tão somente após uma hora de incessantes tentativas.

Por volta das 22h00min, quando a equipe de emergência chegou ao local, o paciente já havia perdido o sentido das pernas e, mesmo diante desse quadro, a equipe médica se limitou a medicá-lo com um comprimido de ácido acetilsalicílico, instruindo-o a continuar com o uso dos medicamentos já utilizados para o controle da pressão alta.

Apesar da insistência das suplicantes, a equipe médica da UTI nº 57, negou-se a remover o paciente para um hospital, sob alegação de que seu plano não cobria esse serviço. Partiu daí que as demandantes acabaram por encontrar um meio de removê- lo, inicialmente para o pronto socorro do Hospital Universitário Cajuru, onde não havia leito disponível para atendimento cardíaco, e depois para a unidade de dor torácica da Irmandade de Misericórdia Santa Casa de Curitiba, onde deu entrada às 02h58min do dia 22.02.04, vindo a falecer, algumas horas depois, em decorrência de infarto agudo do miocárdio. Invocando o descumprimento contratual e a falha grave na prestação dos serviços, em virtude da conduta da ré que se negou a prestar ao paciente o serviço expressamente coberto pelo contrato, qual seja, remoção para um estabelecimento hospitalar melhor aparelhado, a fim de dar continuidade do tratamento de emergência iniciado no âmbito da residência, buscam as suplicantes, mãe e filha, indenização por danos morais.

O feito seguiu seus trâmites normais, com produção de prova documental e oral, sobrevindo sentença de procedência do pedido para condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais, na quantia de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), para cada autora, corrigida monetariamente pela média aritmética entre o INPC e o IGP/DI, a partir da data da publicação da sentença, com juros de mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso, condenando-a, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação.

Insatisfeita, apela a ré a este Tribunal, pugnando, preliminarmente, pelo conhecimento dos agravos retidos interpostos, aduzindo que o tipo de serviço contratado entre as partes, é de emergência médica, assim entendida a situação de quadro clínico agudo que possa gerar risco de vida iminente, de modo que não presta serviços de atendimento domiciliar e transporte de paciente; a responsabilidade na hipótese vertente é subjetiva, conforme o disposto no artigo 14, § 4º, do CDC; não cabe inversão do ônus da prova, uma vez que a responsabilidade do médico deve ser apurada mediante comprovação da culpa.

Ainda, deve ser reformada a decisão que indeferiu a oitiva do médico oftalmologista, uma vez que esse determinou a suspensão da medicação para pressão alta, em virtude da realização de uma cirurgia de catarata, o que pode ter contribuído para a evolução do quadro clínico.

Quanto ao mérito, tece arrazoado acerca da ordem cronológica dos fatos ocorridos nos dias 21 e 22 de fevereiro de 2.004, argumentando que no momento do atendimento não foi diagnosticado o quadro de infarto. De outro lado, diz que tem como ramo de atividade a prestação de serviços de atendimento de emergências médicas, a qual se caracteriza por uma situação de quadro clínico agudo que implique em risco de vida iminente ou sofrimento intenso, que se diferencia de atendimento de urgência médica, aduzindo, ainda, que no momento do atendimento, não havia que se falar em emergência, pois não estava configurado o quadro clínico de infarto, ou qualquer outra enfermidade que pudesse gerar algum risco de vida iminente, de modo a justificar a remoção do paciente.

Discorre acerca da prova produzida, em especial a que diz respeito ao atendimento do Hospital Cajuru, sustentando que a negativa de remoção não se deu pelo fato da necessidade da AIH (autorização de internamento hospitalar), mas sim em razão do paciente não apresentar quadro clínico de infarto no momento do atendimento, a justificar sua remoção, até porque estão excluídos do contrato os serviços de remoção de pacientes, que não estejam em quadro clínico agudo ou que resulte em risco de vida abrupto, finalizando no sentido de que não houve falha na prestação dos serviços, a justificar o pleito indenizatório. Acaso assim não se entenda, busca a redução do valor da indenização, bem como a alteração do termo inicial dos juros de mora, que devem incidir da data da citação, reduzindo-se, de igual forma, o percentual de honorários advocatícios.

Em contrarrazões, as apeladas pugnam pela manutenção da decisão recorrida.

É o relatório.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

DOS AGRAVOS RETIDOS Impõe conhecer, preliminarmente, dos agravos retidos interpostos das decisões de fls. 215/216 e 274.

A primeira reconheceu que a relação estabelecida entre as partes é de consumo; bem como que a responsabilidade seria objetiva, invertendo o ônus da prova em razão da hipossuficiência das autoras.

O reconhecimento da responsabilidade objetiva pela decisão agravada não gera qualquer prejuízo à parte, se a controvérsia é dirimida, também, mediante a investigação de culpa, sob a ótica da responsabilidade subjetiva, como adiante se verá.

Outrossim, constatada a presença dos pressupostos autorizadores, notadamente diante da hipossuficiência das autoras, correta a decisão que determina a inversão do ônus probatório.

A questão alusiva ao tipo de prestação de serviço contratado diz respeito ao mérito da discussão, estando sua análise prejudicada em sede de agravo retido.

A segunda decisão agravada indeferiu a oitiva do oftalmologista da vítima e, pelas razões nela contidas, deve ser mantida in totum.

A oitiva do referido profissional era de todo impertinente, pois a discussão travada no presente refere-se ao alegado descumprimento do contrato pela ré, donde pouco importa a causa do infarto, se decorrente ou não da suspensão da medicação para hipertensão, que segundo a suplicada, teria sido indicada pelo oftalmologista.

No mais, o arcabouço probatório se mostrou suficiente para a convicção do Julgador, que tão somente lançou mão do princípio do livre convencimento e da livre apreciação da prova, não restando configurado o alegado cerceamento de defesa.

Impõe, portanto, desprover os agravos retidos.

DO RECURSO DE APELAÇÃO Cinge-se a controvérsia em investigar se houve descumprimento contratual pela ré e falha nos serviços por ela prestados, ao se recusar a transportar a vítima à uma unidade hospitalar, ensejando ou contribuindo, com sua conduta, para a evolução do quadro clínico do paciente, que veio a falecer.

Consta dos autos que as partes firmaram, em 07.12.01, contrato de prestação de serviços de medicina de emergência e, segundo as suplicantes, no dia 21.02.04, por volta das 20h00min, a ré, ao ser acionada para prestar os serviços de atendimento emergencial ao paciente Venâncio da Veiga Oliveira, foi desidiosa, tanto porque demorou para proceder ao atendimento, mas também porque se recusou a encaminhá-lo para um hospital, sob a alegação de que inexistia previsão contratual, além de ter se limitado a ministrar "AAS" ao paciente, em que pese o evidente quadro de infarto do miocárdio.

A versão da ré, ao contrário, é no sentido de que o paciente não apresentava alteração dos sinais vitais e, como através dos exames realizados, foi constatada a ocorrência de "sopro sistólico pré-existente" e "insuficiência arterial aguda", ministrou a seguinte medicação: "AAS 500 mg, Isordil sublingual e Captropil 25 mg via oral", dando ênfase ao fato de que o Sr. Venâncio tinha idade avançada e histórico de doença cardiovascular, e que por ter interrompido a medicação para controle da pressão arterial, a pedido de seu oftalmologista, que intentava submetê-lo à cirurgia de catarata, sua saúde se encontrava mais fragilizada.

Segue, afirmando, ainda, que as condições do paciente não indicavam internação hospitalar imediata, a qual, aliás, somente poderia ser feita após o paciente ser submetido a atendimento em uma unidade do SUS.

As partes não controvertem quanto ao efetivo atendimento emergencial prestado ao Sr. Venâncio, sendo certo que constou do documento de fl.79, elaborado pela ré, que o mesmo foi atendido no dia 21.02.04, às 22h00min, em razão de apresentar dor torácica, e na ocasião foi diagnosticado com insuficiência arterial aguda, e o resumo clínico assim foi relatado: "paciente apresentou dor torácica tipo queimação incessante"; "orientado a procurar serviço médico com rapidez".

O mesmo sintoma relatado quando do atendimento prestado pela ré, qual seja, "dor torácica tipo queimação", constou do prontuário de entrada do paciente no Hospital Universitário Cajuru, às 23h03min, sendo certo que ele não permaneceu naquela unidade hospitalar em razão da falta de leito no setor cardíaco, tendo sido encaminhado para a Santa Casa de Misericórdia, onde recebeu atendimento às 02h59min.

Observe-se que entre o atendimento emergencial prestado pela suplicada, que se iniciou às 22h00min, e a entrada no Hospital Cajuru, às 23h03min, transcorreu uma hora e três minutos.

Quando de sua admissão na Santa Casa, às 02h59min, o Sr. Venâncio foi submetido a exames complementares, tendo seu quadro clinico sido resumido à fl. 88, nos seguintes termos:

"Paciente deu entrada nesta unidade veio da VDT de cadeira de rodas consciente comunicativo, foi monitorizado, medica pois PA 180/80. Respiração espontânea meio úmida. As 4:10 fez parada respiratória (...), foi ad adrenalina (...) puncionado subclávia (...) não progrediu (...) massagem cardíaca das 5:30 as 7:40 foi encaminhado p/hemodinâmica ainda em parada (...) obs. Paciente entrou em óbito na hemodinâmica (...) realizados procedimentos (...)".

Diante desse panorama fático pergunta-se: a conduta adotada pela requerida, de não promover o traslado ao nosocômio, de paciente com 82 anos, apresentando dor torácica persistente, com quadro clínico de insuficiência arterial aguda, conforme a própria ré constatara, foi a mais correta? E a resposta, inevitavelmente, é negativa.

O histórico do Sr. Venâncio, aliado aos sintomas que apresentava "dor torácica tipo queimação", estavam a exigir cautela redobrada dos prepostos da requerida que procederam ao atendimento emergencial, cautela que não foi adotada, porque se limitaram a ministrar-lhe medicamentos, orientando-o, apenas, a procurar o serviço médico com rapidez, deixando-o aos cuidados dos familiares.

Diga-se, a propósito que tanto a ré não dispensou ao caso a atenção necessária que o caso exigia, que chega a confessar, na peça contestatória (fl. 135), que "em virtude de sua experiência de milhares de atendimentos já realizados, inclusive a paciente do Sistema Único de Saúde, a Requerida sabia perfeitamente que, diante do quadro clínico apresentado, de nada adiantaria deslocar o mesmo para um Hospital para a realização de exames, pois os mesmos nunca seriam realizados em virtude das regras do SUS. Isto porquê, repita-se uma vez mais, os Hospitais apenas realizaram referidos exames ou até mesmo o internamento do paciente depois de uma prévia consulta em postos de saúde e da apresentação da guia da AIH - Autorização de Internamento Hospitalar".

Diante de tal confissão, se observa, nitidamente, que a requerida, invocando a "experiência que tinha em milhares de atendimentos já realizados", deixou de cumprir a obrigação contratual que lhe incumbia, no sentido de estender o atendimento emergencial, porque a relevância dos sintomas assim exigia, até o estabelecimento hospitalar, prestando-o durante e até o efetivo internamento do paciente.

Isso é o que se depreende, de forma clara, da cláusula 1ª do contrato (fls. 45/48), nos seguintes termos:

O objetivo do presente contrato é prestar aos usuários inscritos pela CONTRATANTE, serviços de medicina de emergência, através de UTIs móveis, médicos e paramédicos, 24 (vinte e quatro) horas do dia, inclusive sábados, domingos e feriados, dando atendimento pré-hospitalar no local chamado, a todas as situações de quadro clínico agudo que possam gerar risco de vida iminente e, estendendo se necessário for, até o estabelecimento hospitalar designado e durante até o efetivo internamento do paciente.

Obviamente não se poderia exigir da suplicada que se responsabilizasse pelos procedimentos burocráticos para a efetivação da internação, mas tal circunstância não a eximia do dever que assumiu, por força do contrato, de providenciar a imediata remoção do paciente à unidade hospitalar, diante do quadro emergencial apresentado, e que estava colocando em risco a vida do paciente, tanto que ele veio a óbito horas depois.

Tal responsabilidade vem elencada de forma clara, nas cláusulas 6.1 e 6.6.1, nos seguintes termos:

A VIDA EMERGÊNCIAS MÉDICAS dará cobertura exclusivamente aos serviços médicos de emergência pré- hospitalar, no local do chamado, podendo estender-se até o estabelecimento hospitalar previamente citado, em situações desencadeadas por quadro clínico agudo ou que resulte em risco de vida abrupto, e que o mesmo não ocorra em locais de assistência médica que tenham serviços próprios como hospitais, clínicas, centro e postos de saúde, consultórios médicos, ambulatórios e outros congêneres.

...

Nas situações em que houver necessidade hospitalar, a fim de dar continuidade ao tratamento de emergência, o paciente será removido ao hospital citado e escolhido na assinatura da Solicitação de Filiação e nos casos em que não puder ser internado neste estabelecimento hospitalar, poderá ser internado em outro hospital, em comum acordo com o usuário, familiares, acompanhante, responsável ou médico assistente.

E tanto resulta evidenciada a desídia da requerida, que o médico que atendeu o Sr.Venâncio, na sua residência, constatou que ele apresentava quadro clínico de insuficiência arterial aguda + angina pectoris e, não obstante, no campo destinado a "local do internamento", consignou "procurar um serviço médico com rapidez" (fl. 79).

A falta do atendimento oportuno e adequado foi o que agravou o estado clínico do paciente, estando suficientemente demonstrado o desdobramento do nexo causal, que culminou com o desfecho mórbido.

A prova oral produzida somente vem a corroborar a culpa da requerida pelo evento, senão vejamos.

O médico Hélcio Giffhorn, arrolado pela ré, declarou o seguinte:

"que o Sr. Venâncio chegou a Santa Casa encaminhado pelo Hospital Cajuru porque as emergências cardiológicas do hospital cajuru são transferidas para a Santa Casa; que o paciente chegou em situação de emergência porque foi internado na UTI; que apresentava como sintoma cardíaco dor no peito, tendo tido uma parada cardíaca às 5:30 da manhã, uma hora depois de ter sido internado; que um paciente que é atendido em sua residência reclamando de dores no peito e sem condições de caminhar deve ser feito um histórico clínico e um eletrocardiograma, não sendo possibilitado naquele local a realização deste exame o paciente deve ser encaminhado para um local em que esse exame possa ser realizado;...que um atendimento rápido aumentam as chances de sobrevivência." (fl. 455).

O também médico Lázaro Claudovino Garcia, ouvido à fl. 454, sobre o atendimento a ser dispensado em sintomas como aqueles apresentados pelo falecido, assim esclareceu:

"que um médico que examine um paciente nas condições do Sr. Venâncio, apenas com um aparelho de pressão e a informação de fortes dores no peito e dormência nas pernas pode suspeitar de insuficiência coronariana, devendo perceber outros sinais clínicos como sudorese, hipotensão, extremidades frias, devendo de pronto submeter de pronto o paciente a um eletrocardiograma; que não dispondo deste exame no momento, o paciente deve ser encaminhado imediatamente ao hospital; que o exame clínico nessas condições, independente do eletro, enseja o encaminhamento imediato do paciente ao hospital; que quanto mais rápido o atendimento maiores as chances de recuperação e menores as seqüelas; que nas condições em que o Sr. Venâncio chegou a Santa Casa e foi submetido ao exame com o depoente, suas chances de sobreviver eram pequenas; que o atendimento num espaço de tempo entre 30 minutos e três horas, mesmo em um paciente com o quadro clínico do Sr. Venâncio, possibilita maiores chances no atendimento; ...; que em uma situação emergencial que o paciente procura a emergência do hospital, não é necessário que retorne ao posto de saúde para que seja autorizado o internamento, sendo o paciente atendido prontamente no hospital, pelo SUS, mesmo que chegue em ambulância particular; ...que o AAS é indicado para problemas coronários; que no contexto como o do Sr. Venâncio o médico já estava antecipando a indicação desde medicamento que seria posteriormente ministrado ao paciente, em razão de já vislumbrar se tratar de uma insuficiência coronariana grave."

Observe-se que referida testemunha, ao contrário do que defendeu exaustivamente a ré, asseverou que em uma situação emergencial o paciente é atendido prontamente pelo SUS, mesmo que chegue em ambulância particular, não sendo necessário que retorne ao posto de saúde para que o internamento seja autorizado.

Pode-se invocar, em favor das autoras, ainda, a aplicação da teoria da perda da chance, porque o ato ilícito subtraiu do de cujus a possibilidade de reverter o quadro que se instalara e, com isso, a probabilidade de salvaguarda de sua vida.

O douto Sergio Cavalieri Filho, sobre o tema, assim discorre:

A teoria da perda de uma chance (perte d'une chance) guarda certa relação com o lucro cessante uma vez que a doutrina francesa, onde a teoria teve origem na década de 60 do século passado, dela se utiliza nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor. Caracteriza-se essa perda de uma chance quando, em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um benefício futuro para a vítima, como progredir na carreira artística ou militar, arrumar um melhor emprego, deixar de recorrer de uma sentença desfavorável pela falha do advogado, e assim por diante.

...

Aplicada à atividade médica, a teoria ficou conhecida como teoria da perda de uma chance de cura ou de sobrevivência, em que o elemento que determina a indenização é a perda de uma chance de resultado favorável no tratamento. O que se perde, repita-se, é a chance de cura e não a continuidade da vida. A falta, destarte, reside em não se dar ao paciente todas as chances de cura ou de sobrevivência.

A Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Rio de Janeiro, no julgamento da Apelação Cível nº 8.137/2006 (relator Des. Roberto de Abreu e Silva), fez magistral aplicação dessa teoria. A clínica de olhos foi condenada a indenizar o paciente, que sofreu descolamento de retina, não pela cegueira em si, mas pela perda de uma chance de salvar a sua visão, uma vez que, quando procurada, deixou de realizar a cirurgia necessária pela falta de médico profissional disponível na ocasião, cirurgia essa que só foi realizada depois de ultrapassado o período da situação emergencial, quando a lesão da mácula na retina da vista já havia se consolidado. (in Programa de Responsabilidade Civil, 7ª edição, revista e ampliada, jurídico atlas, pág. 74/75).

E não bastasse o inadimplemento contratual, há que se ter em mira, na espécie, ainda, a falha na prestação dos serviços, a ser encarada, agora, sob a ótica da responsabilidade objetiva, donde incumbe ao consumidor a prova do dano e do nexo de causalidade, ante a presunção de defeito do serviço ou do produto que milita contra o fornecedor, incumbindo a este a prova das excludentes de responsabilidade, consistentes na prova da inexistência do defeito, ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Acerca da distribuição do ônus probatório nos casos de acidente de consumo, vale citar o excerto doutrinário extraído do Acórdão nº 20935, do eminente Juiz Substituto de 2º Grau, Albino Guérios:

Os acidentes de consumo supõem, como um prius, a manifestação de um defeito do produto ou do serviço, e como um posterius, um evento danoso. O defeito do produto ou serviço é um dos pressupostos da responsabilidade por danos nas relações de consumo. Se o produto não ostentar vício de qualidade ocorre a ruptura da relação causal que determina o dano, ficando afastadas a responsabilidade do fornecedor... (in DENARI, Zelmo, Código Brasileito de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, p. 153).

Também:

Se o produto ou serviço não é defeituoso, e o ônus dessa prova é do fornecedor, não haverá também relação de causalidade entre o dano e atividade do fornecedor. O dano terá decorrido de outra causa não imputável ao fabricante do produto ou ao prestador do serviço. Há, igualmente, aqui, uma presunção que milita contra o fornecedor, ao qual caberá ilidi-la. (CAVALIERI FILHO, Sérgio, ob. c. p. 431).

In casu, o nexo causal entre o dano, ou seja, a morte do paciente, e o atendimento a ele prestado, que foi aquém do devido, aniquilando as chances de sobrevida, está suficientemente demonstrado pelos fundamentos atrás aduzidos.

Destarte, seja sob a ótica da responsabilidade subjetiva, ou objetiva, o dever de indenizar se revelou inarredável.

Pugnam as suplicantes apenas pelo recebimento de indenização por danos morais, à toda evidência, cabíveis na espécie, em decorrência da morte do pai e esposo.

Convém ressaltar que o dano moral é eminentemente subjetivo e independe do prejuízo patrimonial, caracterizando-se no sofrimento, dor, angústia que as autoras tiveram que suportar pela perda do ente querido.

Destaco, por oportuno, ensinamento do Professor Antonio Chaves, mencionado pelo eminente jurista Clayton Reis, em obra sobre o assunto:

Dano moral é a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado sem repercussão patrimonial. Seja a dor física - dor-sensação como denomina Carpenter -, nascida de uma lesão material; seja a dor moral - dor-sentimento - de causa material. (in Dano Moral, 1ª ed. Forense, Rio de Janeiro, 1991, p. 05).

A par disso, é de se salientar que a fixação do montante fica ao prudente arbítrio do Julgador, devendo pesar nestas circunstâncias a gravidade e duração da lesão, a possibilidade de quem deve reparar o dano e as condições do ofendido, cumprindo levar em conta que a reparação não deve gerar o enriquecimento ilícito, constituindo, ainda, sanção apta a coibir atos da mesma espécie.

A respeito dos parâmetros para fixação do dano moral, veja-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

III - A indenização por danos morais deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem causa, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve ela contribuir para desestimular o ofensor a repetir o ato, inibindo sua conduta antijurídica. (STJ - 4ª Turma, RESP 265133/RJ, relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira).

Não há nos autos elementos concretos através dos quais se possa aferir a capacidade econômica da ré. O contrato social data do ano de 1.993, de sorte que o capital social ali retratado não se presta para aferir a condição financeira atual.

Certo é, contudo, que ela mesma confessa, na peça contestatória que se trata de tradicional empresa do ramo de prestação de serviços de emergência na área médica, atendendo uma parcela considerável da população de Curitiba, donde se presume possuir bons recursos econômicos.

Quanto às autoras, ditam os elementos dos autos que possuem parcos recursos econômicos, pois inobstante terem celebrado o pacto com a ré, para prestação de atendimento de emergência, são usuária do SUS e estão litigando sob o pálio da gratuidade.

Todavia, se por um lado, a indenização deve ser fixada levando-se em conta o caráter pedagógico que lhe é ínsito, por outro, não deve causar enriquecimento indevido.

Observe-se que na sentença, a indenização foi fixada no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), para cada suplicante, com incidência de correção monetária a partir da publicação da decisão, que se deu em 17.12.09, e juros de mora a partir do evento danoso, em 21.02.04.

Se considerarmos o valor nominal de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), e sobre ele fizermos incidir a taxa de juros de 1% ao mês, a partir do evento danoso, o valor da indenização importaria, hoje, em, aproximadamente, R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), destoante dos julgados dessa Câmara, para situações desse jaez.

Diante de tais considerandos, entendo que a indenização deve ser reduzida para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), para cada suplicante, quantia esse que se mostra mais consentânea com os parâmetros atrás referendados e com as particularidades do caso.

Sobre tal valor deverá incidir correção monetária pelos índices legais e juros de mora de 1% ao mês, a partir da data deste acórdão.

Por fim, considerando que o feito demandou a produção de provas em audiência, bem como o trabalho desenvolvido pelos doutos causídicos, não há suporte para a pretendida redução da verba honorária, que resta mantida, portanto, em 20% sobre o valor da condenação.

Ex positis, o voto é no sentido de negar provimento aos agravos retidos e dar provimento parcial ao recurso de apelação, para reduzir o valor da indenização para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), para cada autora, com incidência de correção monetária e juros de mora de 1% ao mês, a partir da data deste acórdão.

27

ACORDAM OS DESEMBARGADORES INTEGRANTES DA DÉCIMA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM NEGAR PROVIMENTO AOS AGRAVOS RETIDOS E, POR MAIORIA DE VOTOS, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DE APELAÇÃO, RESTANDO VENCIDO O ILUSTRE DESEMBARGADOR ARQUELAU ARAÚJO RIBAS, QUE DÁ PROVIMENTO AO RECURSO.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores ARQUELAU ARAÚJO RIBAS e NILSON MIZUTA.

Curitiba, 16 de junho de 2.011.

LUIZ LOPES Relator Designado

ARQUELAU ARAÚJO RIBAS Vencido

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