Direito de ficar em silêncio
Juiz, ao proferir sentença, diz que silêncio do réu no auto de flagrante denunciava a culpa
O acusado foi flagrado por policiais guardando em sacolas objetos que o laudo pericial constatou servirem para embalar entorpecentes ilícitos. Ao proferir a sentença, o juiz disse que "surpreendentemente", o réu confessou a autoria do ato ilícito em juízo.
-
Processo : 405.01.2010.021899-0
Veja abaixo a íntegra da decisão.
______
Vistos, etc...
A.A.S., já qualificado, foi denunciado por violação ao artigo 34 da Lei nº 11.343/06, porque no dia, hora, local e modo mencionados na acusação de fls. 01D/03D, foi flagrado por policiais guardando para fins de tráfico os objetos que o laudo pericial de fls. 86/87 constatou servirem para embalar entorpecentes ilícitos.
Seu Advogado o defendeu previamente a fls. 163/168 e a denúncia foi recebida a fls. 179. Na audiência de instrução de fls. 213/215 o réu foi interrogado e colheu-se a prova oral somente acusatória seguindo memoriais, renovando o Ministério Público a pretensão condenatória ao passo que a Defesa postulou a absolvição alegando insuficiência de provas.
É o relatório.
DECIDO.
Procede a acusação.
O réu silenciou no auto de flagrante(embora inocentes nunca se calem) mas em juízo, surpreendentemente, confessou a autoria nos seguintes termos:
“...realmente guardava em sua residência os flaconetes plásticos mostrados na foto de fls. 45 os quais alega ter encontrado no lixo e guardado para revender(...) policiais estiveram em sua residência à procura do outro réu e acabaram encontrando aqueles objetos(...)até então não conhecia o outro acusado; admite que os flaconetes estavam em sua posse a quase uma semana e perguntado porque não os vendeu desde logo, diz ‘eu queria ajuntar mais’”.
A inusitada confissão foi plenamente ratificada pelos policiais sob contraditório, que abordaram o réu em razão de denúncia anônima:
“...depararam com o acusado A. em frente ao portão da casa carregando duas sacolas que continham diversos flaconetes normalmente utilizados para embalar entorpecentes, os quais estavam acondicionados em sacos plásticos tal qual é mostrado na foto de fls. 45; Alberto disse que trabalhava para Antonio Carlos e que estava levando os flaconetes para ele embalar drogas (...) em momento algum ele disse aos policiais ter encontrado os flaconetes no lixo e se apossado deles para revender, dizendo unicamente a versão acima registrada, qual seja, de que serviriam para embalar entorpecentes(...) os flaconetes eram novos e sem uso(...) ao flaconetes não são vendidos no comércio regular justamente porque se destinam para embalar entorpecentes”.
Nenhum elemento dos autos revela predisposição dos policiais contra o acusado cuja prisão, frise-se, foi casual porque decorrente de delação velada, o que explica ele não lhes ter feito qualquer objeção quando indagado a respeito na oitiva judicial, invertendo-se contra o réu o onus probandi fixado no art. 156 do CPP, que não foi desincumbido, ficando claro que a denúncia anônima tinha total pertinência.
Os aludidos flaconetes(popularmente chamados de pinos eppendoff) constituem material sabidamente empregado para embalar entorpecentes, em especial a cocaína dada sua volatilidade, como se colhe da verificação pericial: “...rotineiramente utilizado por traficantes no acondicionamento de porções de entorpecentes pulverizados do tipo cocaína, destinadas à venda para usuários”.
Outrossim, é irrelevante a circunstância de os investigadores não terem localizado narcóticos na residência do acusado, a um lado porque o delito aqui não de tráfico; a outro porque o não encontro droga no local do fato autoriza concluir que o embalamento ocorria, de fato, noutro lugar conforme ele admitiu aos investigadores.
Destarte, a condenação é impositiva.
Balizando as punições, compenso a confissão judicial (não fundamental na espécie) com as recidivas noticiadas às fls. 236(específica) e 244, que revelam ser o réu dotado de personalidade delinqüente e refratária aos esperados efeitos didáticos da lei repressora, para aplicar as penas mínimas agravadas em 2/3(dois terços): 05(cinco) anos de reclusão e 2.000(dois mil) dias-multa.
Fica estimada a diária no patamar básico legal ante sua modesta condição econômica, enquanto o desconto da privação da liberdade começará no regime fechado porque a reiteração criminosa assim o recomenda para a maior eficácia do caráter retributivo, bem como para melhor resguardo da saúde pública.
Frente ao exposto e contido nos autos, JULGO PROCEDENTE a ação condenar A.A.S., filho de O.S. e T.A.S., às penas de 05(cinco) anos de reclusão e 2.000(dois mil) dias-multa por infração ao artigo 34 Lei nº 11.343/06.
A pecuniária fica arbitrada no piso mínimo legal e sobre ela incidirá atualização monetária desde o fato até a quitação plena, enquanto a privação da liberdade será cumprida inicialmente no regime fechado a teor do art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90, com a redação que lhe deu a Lei nº 11.464/07, e do art. 59 do Código Penal.
Estando preso flagrante e sendo incompatível o regime adotado com a liberdade provisória, além do plausível risco de fuga para furtar-se a aplicação da lei, permanecerá encarcerado para poder apelar.
Expeça-se mandado de prisão.
Passada esta em julgado, inscreva-se o nome do condenado no Livro dos Culpados.
Sendo beneficiário da assistência judiciária gratuita, suspendo a exigibilidade do pagamento da taxa judiciária nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
P. R. I.
Osasco, 26 de maio de 2.011
JOSÉ FERNANDO AZEVEDO MINHOTO
JUIZ DE DIREITO
_________
______
-
15/4/11 - Juiz dá bronca em homem que pretendia indenização por ser impedido de entrar em agência bancária - clique aqui.
-
18/11/10 - Juiz chama a atenção de servidores do cartório pela demora de juntar documentos aos autos - clique aqui.
-
19/3/10 - Em decisão, juiz dá uma verdadeira aula de informática - clique aqui.
-
3/7/09 - Desembargador mineiro faz interessante comentário em seu despacho acerca de medicamento - clique aqui.
-
22/4/09 - Em polêmica sentença, juiz de SC julga improcedente pedido de jogador que se sentiu ofendido em jogo virtual - clique aqui.
-
23/3/09 - Filha de conselheiro do TCM/SP aprovada na USP é elogiada no Diário Oficial - clique aqui.
-
5/2/09 - Convite para churrasco vai parar em processo no RS - clique aqui.
-
3/2/09 - "Futebol sem deboche não dá !" - clique aqui.
-
30/1/09 - Em tempos de Big Brother, Juiz entende que televisão é um bem essencial – clique aqui.
-
15/5/08 - Funcionário apontado como o responsável por forjar um bate-papo no MSN e publicá-lo no Diário Oficial deve perder o emprego - clique aqui.
-
31/10/07 - Justiça pede demissão de funcionário que forjou bate-papo no Diário Oficial - clique aqui.
-
2/7/07 - Juiz diz que bate-papo no MSN entre funcionários da Justiça publicado no "Diário Oficial" foi inventado por um servidor - clique aqui.
-
13/4/07 - Briga de galo. Decisão de magistrada do TJ/RJ seria cômica se não fosse trágica para o Direito brasileiro – clique aqui
__________________