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TJ/SP confirma sentença reconhecendo imunidade tributária aos leitores de e-books

A 11ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou provimento ao recurso da Fazenda do Estado de SP e manteve sentença que reconhecia a aplicação da imunidade tributária dos livros convencionais aos leitores de livros digitais (e-books).

1/6/2011


E-book

TJ/SP confirma sentença reconhecendo imunidade tributária aos leitores de e-books

A 11ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou provimento ao recurso da Fazenda do Estado de SP e manteve sentença que reconhecia a aplicação da imunidade tributária dos livros convencionais aos leitores de livros digitais (e-books).

Uma empresa ajuizou ação pretendendo a imunidade tributária, estabelecida no art. 150 da CF/88 (clique aqui), com relação aos leitores dos livros digitais. O juiz de Direito Rafael Tocantins Maltez concedeu a segurança para determinar que o Estado de SP não exija o ICMS da empresa sobre bens importados.

Inconformada, a Fazenda do Estado apelou. Aliende Ribeiro, relator do processo na 11ª câmara, entendeu que a sentença apelada deu correta solução à lide. "A questão pertinente à imunidade dos leitores de livros digitais é um tema novo, que foi abordado com profundidade e adequação na decisão atacada", disse o relator.

O juiz Rafael Tocantins Maltez defendeu na sentença que admitir que apenas o livro de papel é imune "resultaria em admitir que o constituinte brasileiro seria um saudosista ou ignorante, pois estaria garantindo, com a imunidade de impostos, apenas 'livros, jornais e periódicos' elaborados com a utilização da técnica passada." "Qualquer avanço tecnológico estaria desincentivado em razão da tributação. Quem quisesse ficar no passado, comunicando-se como no início do século, seria estimulado pela imunidade. Quem quisesse evoluir seria punido, estando o Brasil destinado, quanto aos meios de comunicação, a tomar-se peça de museu, afastando-se qualquer possibilidade de estímulo ao progresso", completa.

Entendendo que a CF/88 "assegura a veiculação de cultura e informações; portanto, livros editados em papel ou em leitores de livros digitais têm o mesmo objetivo, conteúdo e finalidade, ou seja, levar a informação e o conhecimento ao seu usuário.", o juiz de Direito Rafael Maltez isentou a empresa do pagamento de ICMS.

O escritório Da Veiga Ciccone, Nakatani e Estivalete Advogados Associados atuou pela empresa.

Veja abaixo a íntegra da decisão.

_________

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

PODER JUDICIÁRIO

São Paulo

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº , da Comarca de Guarulhos, em que é apelante FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO sendo apelado X.

ACORDAM, em 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento aos recursos. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores PIRES DE ARAÚJO (Presidente sem voto), FRANCISCO VICENTE ROSSI E OSCILD DE LIMA JÚNIOR.

São Paulo, 16 de maio de 2011.

ALIENDE RIBEIRO

RELATOR

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº

APELAÇÃO Nº GUARULHOS

APELANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO

APELADO: X

INTERESSADO: DELEGADO DA FAZENDA DO ESTADO DE SAO PAULO

Juiz de 1ª Instância: Rafael Tocantins Maltez

Mandado de Segurança – Pedido de reconhecimento da imunidade tributária referente ao ICMS com relação aos leitores de livros digitais (Artigo 150, inciso VI, alínea “d” da Constituição Federal) – Possibilidade – A imunidade dos livros, jornais, periódicos e respectivo papel objetiva proteger a divulgação de idéias, conhecimentos e a livre expressão do pensamento, visando à difusão da cultura – A Constituição Federal assegura a veiculação de cultura e informações, assim, livros editados em papel ou em leitores de livros digitais têm o mesmo objetivo, conteúdo e finalidade que é levar a informação e conhecimento ao seu usuário – A desoneração de impostos, torna mais fácil a confecção e sua distribuição, pouco interessando o seu formato – Sentença mantida e ratificada, nos termos do art. 252 do Regimento Interno desta E. Corte – Recursos não providos.

Vistos.

Trata-se de ação mandamental impetrada por X contra ato do Delegado da Fazenda do Estado de São Paulo, com intuito de ver reconhecida a imunidade tributária, estabelecida no artigo 150, inciso VI, alínea “d” da Constituição Federal, com relação aos leitores de livros digitais, denominados Story, relacionados no “” nº de 22/04/2010, bem como no “". Deferida a liminar no sentido de que não seja exigido da impetrante no momento do desembaraço aduaneiro o ICMS, mas sem o depósito do valor por parte da impetrante (f. 44/47), decisão objeto dos Agravos de Instrumento nºs. e , sendo que no primeiro não houve pedido de efeito suspensivo ou antecipação da tutela recursal, e ao segundo foi negado o pedido de efeito suspensivo, com a ressalva de que o MM. Juiz da causa deveria diligenciar para a manutenção do depósito efetuado nos autos pela empresa.

A sentença de f. 147/153 concedeu a segurança para determinar que a autoridade impetrada não exija da impetrante o ICMS sobre os bens importados descritos no “” nº de 22/04/2010 e “”.

Inconformada apela a vencida, Fazendo do Estado, insistindo nos argumentos trazidos na contestação.

Recurso recebido e processado, com contrarrazões. Acompanham este processo, para julgamento conjunto, os Agravos de Instrumento n°s. e , com os votos n° e, respectivamente.

É o relatório.

Concedida a segurança, é o caso de reexame necessário, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009.

Trata-se de recurso de apelação interposto em face de sentença que concedeu a segurança e autoridade impetrada não exija da impetrante o ICMS sobre os bens importados descritos no “” nº de 22/04/2010 e “” .

Estabelece o artigo 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça que:

“Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la".

Não há qualquer óbice na manutenção da sentença recorrida por seus próprios fundamentos, desde que, como no caso presente, ela esteja corretamente fundamentada e não exija reparos ou correções.

Neste sentido o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO. FUNDAMENTAÇÃO. INSPIRAÇÃO. DECISÃO. ANTERIOR. POSSIBILIDADE. OMISSÃO.

1. A Corte a quo manifestou-se pela confirmação integral da sentença monocrática, ratificando todos os seus fundamentos, de modo que restou absorvido pelo aresto o fundamento de que a anterioridade deve ser observada a partir da Medida Provisória 368/93.2. Não se configura desprovido de fundamentação, tampouco omisso, o julgado que repete fundamentos adotados pela sentença, com sua transcrição no corpo do acórdão. Precedentes.

3. Recurso especial improvido. (REsp 641.963-ES, Rel. Min. Castro Meira, j. 8/11/2005, DJ 21/11/2005)

PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO PROFERIDO EM EMBARGOS DECLARATÓRIOS. RATIFICAÇÃO DA SENTENÇA. VIABILIDADE. OMISSÃO INEXISTENTE. ART. 535, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO.

1. Revela-se improcedente suposta ofensa ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem, ainda que não aprecie todos os argumentos expendidos pela parte recorrente, atém-se aos contornos da lide e fundamenta sua decisão em base jurídica adequada e suficiente ao desate da questão controvertida.

2. É predominante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em reconhecer a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-o no acórdão, sem que tal medida encerre omissão ou ausência de fundamentação no decisum.

3. Recurso especial não-provido. (REsp 662.272-RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 4/9/2007, DJ 27/9/2007)

Verifico que a sentença apelada deu correta solução à lide.

Em razão disso, adota-se a fundamentação nela expressa como razão de decidir do presente recurso, com fulcro no artigo 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça.

A questão pertinente à imunidade dos leitores de livros digitais é um tema novo, que foi abordado com profundidade e adequação na decisão atacada, proferida pelo Dr. Rafael Tocantins Maltez e que considerou, fundado em autorizada doutrina, a necessidade de que o meio eletrônico seja equiparado ao papel para a definição da imunidade prevista no artigo 150, VI, “d” da Constituição Federal.

Constata-se que todas as questões trazidas no presente recurso foram suficiente e adequadamente enfrentadas pelo MM. Juízo a quo, que o fez por meio de pronunciamento devidamente motivado, e cuja argumentação transcrevo:

“Existe o interesse processual, já que presente o binômio necessidade adequaçâo. O Mandado de Segurança é meio adequado para a violação de direito líquido e certo perpetrado por autoridade, que é a afirmação contida na inicial.

Não se trata de Mandado de Segurança contra lei em tese, mas de discussão sobre efetiva importação de bens sobre os quais o impetrado entende não haver imunidade tributária.

O mais é matéria de mérito.

A imunidade dos livros, jornais, periódicos e respectivo papel objetiva proteger a divulgação de idéias, conhecimentos, a livre expressão do pensamento, veiculados por estes instrumentos, traduzindo procedimento peculiar a um autêntico regime democrático. Visa a facilitar a difusão da cultura.

Mediante a desoneração de impostos, torna-se mais facilitada a confecção e sua distribuição, pouco interessando o seu formato. Embora muitas vezes seja fácil identificar a figura de um livro, nem sempre é possível caracterizá-lo, de forma precisa, o mesmo ocorrendo com os periódicos, tendo em vista as diferenciadas situações que se apresentam.

A questão cinge-se em saber se a imunidade concedida pela Constituição Federal aos livros (artigo 150, VI, "d"), é reconhecida também para leitores de livros digitais, cuja única e exclusiva função é a leitura de livros, revistas, gibis, jornais e outros periódicos digitais.

Para Roque Antonio Carrazza, “devem ser equiparados ao livro, para fins de imunidade, os veículos de idéias, que hoje lhe fazem as vezes (livros eletrônicos) ou, até, o substituem” (Curso de Direito Constitucional Tributário, 10ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 419. No caso vertente, não há dúvida que o leitor eletrônico trata-se de veículo de idéias que faz as vezes o livro em seu conceito corriqueiro.

Prossegue Carrazza: “segundo estamos convencidos, a palavra livros está empregada no Texto Constitucional não no sentido restrito de conjunto de folhas de papel impressas, encadernadas e com capa, mas, sim, no de veículo de pensamento, isto é, de meios de difusão da cultura. Já não estamos na Idade Média, quando a cultura só podia ser difundida por intermédio de livros. Hoje temos os sucedâneos dos livros, que mais dia, menos dia, acabarão por substituí-los totalmente. Tal é o caso dos CD-Roms e dos demais artigos da espécie, que reproduzem, em seu interior, os textos constantes dos livros em sua forma tradicional” (ob. cit. p. 419). Assim, o leitor eletrônico em questão, que se destina exclusivamente a leitura de livros, periódicos, gibis etc., que reproduz os textos constantes dos livros em sua forma tradicional.

Carrazza traz interessante reflexão: “com a devastação das florestas e com os progressos da Informática, muito em breve na haverá mais livros do tipo convencional, isto é, feitos de papel. Por razões ecológicas (o papel é extraído das árvores) e por uma questão de espaço [...], muito em breve as bibliotecas serão totalmente informatizadas. O livro, tal qual estamos ainda habituados a manusear, será peça de museu” (ob. cit. p. 419). E conclui:

“Portanto, é o fim a que se destina o livro não a sua forma que o imuniza a impostos [...] Basta que consideremos livro o veículo de difusão da cultura.

Pouco importa se ele tem cinqüenta, cem ou quinhentas páginas; se está impresso em Braille ou em tipos convencionais; se tem a forma usual de livro, ou se se apresenta sob a forma de disquete ou CD-Rom; se propicia entretenimentos adicionais aos que dele se aproximam; etc.” (ob. cit. p. 421 e 422).

Portanto, livro é o meio de difusão de conhecimento e cultura. “É livro, para fins de imunidade, qualquer objeto que transmita conhecimento (idéias, informações, comentários, narrações reais ou fictícias etc.), pouco importando se isto se faz por caracteres alfabéticos, por imagens, por sons, por signos Braille, por impulsos magnéticos etc.” (ob. cit. p. 423)

Para José Eduardo Soares, pouco interessa o formato de livro ou o processo tecnológico para a elaboração dos livros. Para ele, “Não se poderia conceber a existência de livros imunes (se elaborados com papel), e livros tributados (se elaborados por meios eletrônicos”. (Curso de Direito Tributário, 8ª ed., São Paulo: Dialética, 2008, p. 173/174).

O assunto também é tratado pelo doutrinador Hugo Brito Machado, in verbis:

"Questão das mais relevantes consiste em saber se a imunidade dos livros, jornais e periódicos, e do papel destinado a sua impressão, abrange os produtos da moderna tecnologia, como os CD-roms e os disquetes para computadores.

A melhor interpretação das normas da Constituição é aquela capaz de lhes garantir a máxima efetividade. Toda imunidade tem por fim a realização de um princípio que o constituinte considerou importante para a nação. A imunidade dos livros, jornais e periódicos tem por fim assegurar a liberdade de expressão do pensamento e a disseminação da cultura. Como é inegável que os meios magnéticos, produtos da moderna tecnologia, são hoje de fundamental importância para a realização desse mesmo objetivo, a resposta afirmativa se impõe. O entendimento contrário, por mais respeitáveis que sejam, e são, os seus defensores, leva a norma imunizante a uma forma de esclerose precoce, inteiramente incompatível com a doutrina do moderno constitucionalismo, especialmente no que concerne à interpretação especificamente constitucional" ("Curso de Direito Tributário" - 12ª edição - Malheiros - 1997 - pág. 199).

Ives Gandra da Silva Martins deu importante contribuição para o debate:

“A IMUNIDADE DO LIVRO ELETRÔNICO

Questão que se tem colocado na atualidade é saber se a imunidade tributária, que o artigo 150, inciso VI, letra "d", da Constituição estabelece para jornais, livros e periódicos, abrangeria também o livro eletrônico e a informação veiculada por computador, por meio de CDs ou pela Internet. Ou, ainda, se o livro eletrônico, idêntico ao livro de papel em seu conteúdo, estaria por ela abrangido.

O artigo 150, inciso VI, letra "d", da Lei Suprema possui a seguinte dicção:

"Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios: (...) VI. instituir impostos sobre: (...) d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão."

Argumentam alguns que essa interpretação deve ser restritiva, razão pela qual se o livro, o jornal ou o periódico não forem de papel não gozam da imunidade.

Outros entendem que a interpretação há de ser extensiva e, qualquer que seja o livro, o jornal ou mesmo o periódico, ele é imune, além do papel, quando esses veículos forem confeccionados desse material, por ter acrescentado à imunidade das publicações uma quarta desoneração constitucional, contemplando-o expressamente.

O Supremo Tribunal Federal estendeu a interpretação da imunidade das publicações à "publicidade" dos jornais, apesar de não prevista no texto, com o argumento de que sem ela os jornais não sobreviveriam.

Considerou, também, imune a lista telefônica, por entender que se trata de periódico e tem formato de livro, sobre ofertar informações necessárias ao mundo moderno. Por fim, assegurou a imunidade do papel fotográfico, que permite a reprodução das fotografias que ilustram os jornais, indispensável à mais moderna tecnologia de impressão gráfica. Não permitiu, todavia, que outros insumos, como tintas, por exemplo, fossem beneficiados pela imunidade.

Apresenta-se, agora, a discussão sobre se o livro eletrônico que tem o mesmo conteúdo do livro de papel seria imune. A Enciclopédia Britânica pode ser adquirida em 30 volumes ou num CD-ROM com o mesmo texto, as mesmas características e a vantagem de poder transmitir informações sonoras e ser acessada com maior rapidez.

Tenho para mim que o "livro eletrônico", o "Jornal eletrônico", a "informação eletrônica" são imunes. Não só à luz da interpretação extensiva, já para esse tipo de imunidade adotada pelo Supremo Tribunal Federal, mas à luz de um argumento novo que não tem sido enfrentado na discussão sobre o tema.

O argumento reside no fato de que o texto, que foi reproduzido na Constituição federal, vem de textos constitucionais anteriores, elaborados quando o livro eletrônico inexistia. Nem mesmo se pode dizer que em 1988, quando da promulgação da Constituição atual, houvesse a informação eletrônica como ocorre nos dias de hoje. A época, aliás, nem nascera a Internet e os CD-ROMs representavam apenas "opção acadêmica" de investigação, para eventual utilização futura.

Ora, um texto constitucional não pode ser interpretado como se tivesse sido elaborado para que a Nação não evoluísse. A denominada interpretação "conforme a Constituição" admite que, pelo espectro do Texto Supremo, se retirem as diretrizes exegéticas necessárias para que a perenidade da norma maior permaneça nas gerações futuras. Uma Constituição não é feita para amarrar o país à época de sua edição, mas para orientar o presente e o futuro da nação, dentro de princípios considerados fundamentais para o bem da pátria e da sociedade. A Constituição americana, com sete artigos e pouco mais de uma dezena de emendas em 211 anos, tem sido reinterpretada pela Suprema Corte dos Estados Unidos para que seus princípios permaneçam e atravessem os tempos, sem cair na obsolescência. Sua perpetuidade reside na "construction" do Direito americano, que a torna adaptável a todas as conjunturas, pelo papel estabilizador do tribunal maior do país.

Ora, admitir que apenas o "livro de papel" - não aquele confeccionado com outros materiais, como, por exemplo, pano, plástico, etc., mas só de papel, em estrita interpretação é imune resultaria em admitir que o constituinte brasileiro seria um saudosista ou um ignorante, pois estaria garantindo, com a imunidade de impostos, apenas "livros, jornais e periódicos" elaborados com a utilização de técnica passada. Qualquer avanço tecnológico estaria desincentivado em razão da tributação. O País estaria, assim, sendo proibido de evoluir, desestimulado de adotar técnicas modernas de comunicação, pois, se assim o fizesse, seria punido. Quem quisesse ficar no passado, comunicandose como no início do século, seria estimulado pela imunidade. Quem quisesse evoluir seria punido, estando o Brasil destinado, quanto aos meios de comunicação, a tomar-se peça de museu, afastando-se qualquer possibilidade de estímulo ao progresso.

Como homenagem à inteligência dos constituintes, não posso admitir tal interpretação degradante, pela qual apenas quem estivesse disposto a não evoluir seria beneficiado e quem quisesse evoluir, no sistema de comunicações, seria punido com a incidência de diversos impostos.

Não creio - nego-me a crer - que assim tenha agido o constituinte, razão pela qual só posso admitir que o "livro eletrônico", o "jornal eletrônico", o "periódico eletrônico" são imunes, pois a imunidade garante o mesmo tipo de veículo, seja ele confeccionado a partir de qualquer material prestante às suas finalidades, tais como papel, tecido, papiro, pergaminho ou por meio eletrônico.

E a interpretação, a meu ver, está rigorosamente representada no texto da lei, desde que se entenda que qualquer tipo de jornal, livro ou periódico (de papel ou eletrônico) é imune, acrescentando que o papel também o é, sempre que destinado à impressão de livros, jornais e periódicos. Dessa forma, o constituinte teria cuidado de quatro imunidades, três delas amplas (livros, jornais e periódicos de papel, eletrônico, etc.), e uma específica para papel, voltada para aqueles veículos, que dele necessitassem.

E, de resto, a interpretação que, em diversos artigos, o professor Edvaldo Brito, secretário dos Negócios Jurídicos da Prefeitura de São Paulo, hospedou.

A matéria é relevante e merece solução definitiva da Suprema Corte brasileira, para que a evolução dos meios de comunicação não seja prejudicada no País por acanhada interpretação, que não honraria a figura dos parlamentares brasileiros”. (Artigo publicado no Jornal O Estado de São Paulo em 14.09.98).

Em face das explanações acima, conclui-se que a Constituição Federal assegura a veiculação de cultura e informações; portanto, livros editados em papel ou em leitores de livros digitais têm o mesmo objetivo, conteúdo e finalidade, ou seja, levar a informação e conhecimento ao seu usuário.

Ressalte-se, ainda, que a norma inserta no Texto Maior não tem o condão de proteger o papel, instrumento de materialização e meio de veiculação; seu objetivo maior é o conteúdo, visando proporcionar a divulgação dos textos.

Destarte, irrelevante a forma de edição da obra, pois qualquer livro, jornal ou periódico impresso em papel não perderá sua característica principal se for veiculado em leitores de livros digitais ou mesmo editado em CD-rom ou disquetes para computadores.

Portanto, não há dúvida que “Leitores de Livros Digitais”, cuja única e exclusiva função é a leitura de livros, revistas, gibis, jornais e outros periódicos digitais, são imunes à tributação. Parafraseando a ilustre Lucia Valle Figueiredo, quando Juíza da 16ª Vara Federal, em Sô Paulo, ao decidir interessante caso de importação de livros-piano, isto é, livros infantis com teclado, que, percutido sob a orientação de um texto, permite que a criança desperte para a música, é uma lástima que um meio mais eficaz de difusão da cultura e do conhecimento possa provocar celeuma e, sobretudo, se queira cobrar elevadíssimos impostos, o que tornará, claramente, os leitores de livros digitais, bem somente para os mais abastados, pois só a estes passará a ser acessível”.

A esta fundamentação acrescento que não há distinção entre o importador pessoa física e a empresa pessoa jurídica importadora. O que importa é a definição referente à imunidade dos bens ou materiais importados, o que se reconhece no caso presente.

No mais, mantenho a decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº no sentido de permanência do depósito efetuado pela apelada até o trânsito em julgado da decisão.

O caso, assim, é de negar provimento ao reexame necessário e ao recurso interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo nos autos da ação impetrada por X (proc. 2ª Vara de Fazenda Pública de Guarulhos, SP), mantida a sentença recorrida por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Consigne-se, para fins de eventual pré-questionamento, inexistir ofensa aos artigos de lei mencionados nas razões e contrarrazões recursais.

Resultado do Julgamento: nego provimento ao reexame necessário e ao recurso da Fazenda.

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