Aposentadoria
INSS terá de recalcular benefícios administrativamente
A decisão liminar do juiz Federal Marcus Orione Gonçalves, titular da 1ª vara Federal Previdenciária em SP, tem validade em todo o território nacional e deve ser cumprida no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária no valor R$ 500 mil. Foi determinado, ainda, o pagamento dos valores atrasados sem quaisquer parcelamentos.
Em seu pedido, o MPF ressaltou que o INSS insiste em protelar o andamento dos feitos, bem como procrastinar os pagamentos dos benefícios e revisões determinados, "ocasionando irreparáveis prejuízos e aflição em milhares de segurados, na maioria idosos".
A situação dos segurados do INSS, segundo o MPF, torna-se ainda mais grave ante a recusa da autarquia em proceder à concessão no âmbito administrativo da revisão dos benefícios previdenciários de acordo com os tetos estabelecidos pelo art. 14 da EC 20/98 e pelo art. 5º da EC 41/03, conforme decidido pelo STF.
"Mesmo depois da referida decisão do STF, o INSS tem-se negado a proceder, no âmbito administrativo, à revisão dos benefícios dos segurados que se enquadram na situação julgada. Graças a isso, milhares de segurados (estima-se em 130 mil) precisarão ajuizar as respectivas ações individuais para terem seus direitos reconhecidos", argumentou o MPF.
"Com a repercussão geral (dada pela decisão do STF), todo o Judiciário está compelido a conceder tal postulação. Não obstante, aguardar que exista a propositura de demandas, inviabilizando o adequado andamento dos demais processos, pode trazer prejuízos incomensuráveis aos trabalhos forenses e acarretar maior morosidade no processamento desses outros feitos [...]. É dever do Executivo realizar administrativamente o recálculo dos benefícios, sob pena de estar atuando de forma contrária aos princípios constantes do artigo 37, do texto constitucional", diz o juiz na decisão.
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Processo : ACP 0004911-28.2011.403.6183
Clique aqui e leia a íntegra do pedido do MPF.
Veja abaixo a íntegra da decisão.
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Sentença/Despacho/Decisão/Ato Ordinátorio
Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de tutela antecipada, em que o Ministério Público Federal e o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical pretendem que o Instituto Nacional do Seguro Social seja compelido a proceder, em âmbito nacional, ao recálculo dos benefícios atingidos pelo julgamento exarado pelo Excelso Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n.º 564.354, bem como proceder ao pagamento dos valores retroativos. Em sua inicial, os autores alegam estarem presentes os requisitos ensejadores da concessão, pelo que pleiteiam o seu deferimento.Relatado, decido.A verossimilhança da alegação resta comprovada por meio da decisão, com repercussão geral, proferida pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n.º 564.354:
EMENTA: DIREITOS CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ALTERAÇÃO NO TETO DOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. REFLEXOS NOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DA ALTERAÇÃO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS N. 20/1998 E 41/2003. DIREITO INTERTEMPORAL: ATO JURÍDICO PERFEITO. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DA LEI INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Há pelo menos duas situações jurídicas em que a atuação do Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição da República demanda interpretação da legislação infraconstitucional: a primeira respeita ao exercício do controle de constitucionalidade das normas, pois não se declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei sem antes entendê-la; a segunda, que se dá na espécie, decorre da garantia constitucional da proteção ao ato jurídico perfeito contra lei superveniente, pois a solução de controvérsia sob essa perspectiva pressupõe sejam interpretadas as leis postas em conflito e determinados os seus alcances para se dizer da existência ou ausência da retroatividade constitucionalmente vedada.
2. Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional n. 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados ao teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional.
3. Negado provimento ao recurso extraordinário. (STF, Relatora Ministra Carmen Lúcia, Plenário, 08.09.2010, Publicado em 15 de fevereiro de 2011).Verifique-se, ainda, que, com a repercussão geral, todo o Judiciário está compelido a conceder tal postulação. Não obstante, aguardar que exista a propositura de demandas, inviabilizando o adequado andamento dos demais processos, pode trazer prejuízos incomensuráveis aos trabalhos forenses e acarretar maior morosidade no processamento desses outros feitos (o que conspira, ainda que por via indireta, contra o artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal).Outrossim, já que se trata de decisão pacífica do Judiciário, com repercussão geral, é dever do Executivo realizar administrativamente o recálculo dos benefícios, sob pena de estar atuando de forma contrária aos princípios constantes do artigo 37, "caput", do texto constitucional.O risco de dano de difícil reparação também é verificado no presente caso, em vista da natureza alimentar dos benefícios previdenciários.
No que diz respeito à extensão da decisão, há que se observar o seguinte.Aqui, faz-se indispensável a análise à luz das alterações promovidas pelo Código de Defesa do Consumidor - Lei n.º 8.078, de 1.990 - no que pertine à questão da coisa julgada e seus efeitos.O grande dilema enfrentado pelas ações coletivas concerne a equacionar o problema de que a sentença, nestas demandas, tem certo caráter normativo - especialmente quanto à sua extensão - e o fato de que, tradicionalmente, a coisa julgada é intra partes (restringindo-se objetiva e subjetivamente ao pedido inicial). Portanto, busca-se a solução para uma sentença que atinja o maior número possível de pessoas, ao mesmo tempo em que se pretende possibilitar, de forma mais efetiva possível, o contraditório no processo.
Inicialmente, deve-se frisar que o Código de Defesa do Consumidor, nesta linha de raciocínio, concebeu três formas de coisa julgada, completamente distintas umas das outras.Em se tratando de interesses difusos, a coisa julgada se estenderá a um número indeterminado de pessoas, que circunstancialmente se encontram ligadas, com efeito erga omnes.No caso dos direitos coletivos, a coisa julgada limita-se aos integrantes de certo grupo, inicialmente identificáveis, possuindo efeito ultra partes.Há, ainda, a coisa julgada erga omnes e in utibulus, para as ações coletivas que envolvam defesa de interesses individuais homogêneos. Aqui, mesmo diante de sentença desfavorável, a pessoa poderá ingressar, futuramente, com ação individual.Frise-se que esta disciplina, por disposição do próprio Código de Defesa do Consumidor, é extensiva a toda e qualquer ação de defesa de direitos coletivos - inclusive as ações civis públicas.
Considerando-se, como dito, que os direitos coletivos em sentido lato (coletivos em sentido estrito e difusos) e os individuais homogêneos podem ser objeto de ação civil pública, as três formas acima de eficácia da coisa julgada têm cabimento nesta espécie de ação.Por outro lado, segundo o art. 16 da lei 7.853 de 1989 (referente à ação civil pública), com redação dada pela lei n.º 9.494 de 1997, "a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova".
Este dispositivo vem sofrendo várias críticas, com as quais concordamos.Conforme Ada Pellegrini Grinover - analisando a Medida Provisória 1570/97, que deu ensejo à lei n.º 9.494 de 1997:"O Executivo foi duplamente infeliz.Em primeiro lugar, pecou pela intenção. Limitar a abrangência da coisa julgada nas ações civis públicas significa multiplicar demandas, o que, de um lado, contraria toda a filosofia dos processos coletivos, destinados justamente a resolver molecularmente o conflitos de interesses, ao invés de atomizá-los e pulverizá-los (...)Em segundo lugar, pecou pela incompetência. Desconhecendo a interação entre a Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor, assim, como muitos dos dispositivos deste, acreditou que seria suficiente modificar o art. 16 da Lei nº 7.347/85 para resolver o problema. No que se enganou redondamente.
Na verdade, o acréscimo introduzido ao art. 16 da LACP é ineficaz.(...)Mas o dispositivo há de ser lido em conjunto com os três incisos do art. 103 (do Código de Defesa do Consumidor), que permaneceram inalterados.Percebe-se, pela análise conjunta dos mencionados dispositivos, que o art. 16 da LACP só diz respeito ao regime da coisa julgada com relação aos interesses difusos (e, quando muito, coletivos), pois a regra permissiva do non liquet, por insuficiência de provas, é limitada aos incisos I e II do art. 103, relativos exatamente aos interesses transindividuais supra apontados.
Na verdade, a regra do art. 16 da LACP só coaduna perfeitamente com o inciso I do art. 103, que utiliza expressão erga omnes, enquanto o inc. II se refere à coisa julgada ultra partes. Assim sendo, a nova disposição adapta-se exclusivamente, em tudo e por tudo, à hipótese de interesses difusos (art. 103, I), já indicando a necessidade de operação analógica para que também o art. 103, II (interesses coletivos) se entenda modificado. Mas aqui a analogia pode ser aplicada, uma vez que não há diferenças entre o regime da coisa julgada nos interesses difusos e coletivos.No entanto, completamente diverso é o regime da coisa julgada nos interesses individuais homogêneos (inc. III do art. 103), em que o legislador adotou sistema próprio, revelado pela redação totalmente distinta do dispositivo: a uma, porque a coisa julgada erga omnes só atua em caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores; a duas porque para esse grupo de interesses o legislador adotou a técnica da inexistência de coisa julgada para sentença de improcedência por insuficiência de provas".2 Conforme Rodolfo de Camargo Mancuso, a maioria dos doutrinadores se posta de forma contrária à inovação trazida ao art. 16 da lei de ação civil pública, alertando para a confusão entre o conceito dos efeitos da coisa julgada e regras de competência. E conclui 3:"Com efeito, a questão de saber quais as pessoas atingidas pela imutabilidade do comando judicial deve ser tratada, naturalmente, sob a rubrica dos limites subjetivos desse instituto processual dito 'coisa julgada e não sob a óptica de categorias outras como a jurisdição, a competência, a organização judiciária. Aqueles limites, quando se trata das lides intersubjetivas, no plano da jurisdição singular, atuam perante as partes, 'não beneficiando, nem prejudicando terceiros (CPC, art. 472), mas, no âmbito das ações de tipo coletivo - justamente porque aí se obrigam sujeitos indeterminados, concernentes a um objeto indivisível - o critério deve ser outro, porque impende atentar para a projeção social do interesse metaindividual de que se trata. Tudo assim reflui para que a resposta judiciária, no âmbito da jurisdição coletiva, desde que promanada de juiz competente, deve ter eficácia até onde se revele a incidência do interesse objetivado, e por modo a se estender a todos os sujeitos concernentes, e isso, mesmo em face do caráter unitário desse tipo de interesse, a exigir uniformidade do pronunciamento judicial" .
Acolhida a postulação nos moldes acima, o provimento aqui concedido deve se estender para todo o território nacional - até porque seria de se estranhar que os segurados que percebam seus benefícios na extensão territorial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região sejam contemplados de forma distinta em relação aos segurados que também fazem jus ao recálculo. Ante o exposto, DEFIRO O PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, determinando que o réu proceda ao recálculo de todos os benefícios atingidos pelo julgamento do RE 564.354. Determino, ainda, o pagamento dos valores atrasados sem quaisquer parcelamentos. Decisão válida para todo o território nacional, devendo ser cumprida no prazo máximo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), a ser revertida para o Fundo constante do artigo 13 da Lei 7.347/85.
Oficie-se o Instituto Nacional do Seguro Social, para que tome ciência da presente decisão, bem como providencie os atos necessários à sua efetivação. Oficie-se, ainda, os Diretores de todas as Seções Judiciárias dos Tribunais Regionais Federais, com cópia da presente decisão, para que possam promover sua divulgação. Defiro os benefícios da justiça gratuita.Intime-se o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical para que, no prazo de 10 (dez) dias, regularize sua representação processual, sob pena de sua exclusão do pólo ativo.Oficie-se. Intime-se. São Paulo, 11 de maio de 2011.
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