Contrato
PL obriga seguradoras a especificar agravantes de riscos
Atualmente, o CC (clique aqui) faculta ao segurador "resolver o contrato" (extinguir o seguro) em caso de agravamento do risco. Já o projeto autoriza a seguradora a resolver o contrato apenas se houver culpa do segurado na agravação do risco.
O deputador Arnaldo Faria de Sá, autor do PL, afirma que, em caso de seguros de vida, é natural que a saúde dos contratantes "entre em declínio" com o passar dos anos, situação previsível para as duas partes. "A única hipótese justificável seria o agravamento provocado pelo próprio segurado, com o exercício de atividades de risco, como esportes radicais", argumenta.
Alteração nos contratos
Segundo o projeto, não poderá haver alteração unilateral dos contratos de seguro de vida. A proposta exige que a renovação das apólices tenha as mesmas condições previstas no contrato originário. Permite-se apenas a revisão do prêmio em razão da mudança de faixa de etária do segurado.
Para Faria de Sá, quem procura um seguro de vida não pensa em realizar o contrato pelo prazo de meses ou um ano. "Objetiva-se segurança, previsão, estabilidade e, principalmente, manutenção das condições pactuadas por prazo indeterminado, até a ocorrência de sinistro ou da morte do contratante."
Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Defesa do Consumidor; de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Íntegra da proposta
Projeto de Lei n.º de 2010
(do Sr. Arnaldo Faria de Sá)
"Princípio da Continuidade do Seguro de Vida, alterando os arts. 774,769 e 801 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil) e dá outras providências".
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1.º - Os arts. 769. 774 e 801 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2.002 (Código Civil), passam a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 769 – O segurado é obrigado a comunicar ao segurador , logo que saiba, todo incidente suscetível de agravar consideravelmente o risco coberto, sob pena de perder o direito á garantia, se provar que silenciou de má-fé.
§1.º O segurador, desde que o faça nos quinze dias seguintes ao recebimento do aviso de agravação do risco sem culpa do segurado, poderá dar-lhe ciência, por escrito, de sua decisão de cobrar prêmio adicional, fundamentado atuarialmente.
§2.º Na hipótese de haver culpa do segurado na agravação do risco, é facultado ao segurador resolver o contrato, mediante comunicação por escrito, com eficácia após trinta dias, hipótese em que será obrigado a devolver a diferença de prêmio segundo a fórmula pro-rata-temporis.
§3.º - Sob pena de nulidade, somente poderá haver cobrança de prêmio adicional, prevista no parágrafo 1.º, se a apólice contiver de forma clara e taxativa, todas as situações consideradas agravantes. "
"Art. 774 – A recondução tácita do contrato pelo mesmo prazo, mediante expressa cláusula contratual, não poderá operar mais de uma vez, ficando vedada a resolução unilateral do contrato.
Parágrafo Único – As disposições do caput deste artigo não se aplicam ao seguro de pessoas."
"Art. 801 – A renovação das apólices de seguro de pessoas far-se-á nas mesmas condições estipuladas na apólice originária, mediante expressa manifestação do segurado á seguradora, ressalvando-se as alterações do prêmio em razão da mudança de faixa etária do segurado. "
J U S T I F I C A T I V A
Sugerimos as alterações dos parágrafos 1.º, 2.º e inclusão do 3.º no art. 769, por entendermos que a seguradora deve discriminar nas condições gerais do contrato de seguro, quais são as causas de agravamento do risco, visando esclarecer ao segurado quanto as situações em que é obrigado a comunicar o segurador, com o fim de evitar-se a resolução unilateral do contrato.
No seguro de vida, cujo contrato é de natureza sucessiva por definição, a aplicação literal do artigo 769 contraria o que dispõe o CDC. Em seu artigo 51:
"São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade.
XII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;"
Ao contratar um seguro de vida, pretende o segurado garantir-se em caso de invalidez ou o futuro de sua família, após o falecimento, portanto, não se trata de uma contratação temporária, mas por toda uma existência.
Com o passar dos anos, é natural que a saúde entre em declínio, situação perfeitamente previsível para as partes e, por ser previsível, não pode a Seguradora ter a opção de resolver o contrato unilateralmente, ou majorar o prêmio de forma aleatória ao ponto de onerar excessivamente o segurado.
O Novo Código Civil em seu Art. 421 trata a cerca do aspecto social dos contratos, segundo o qual "a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato", o que deve inclusive ocorrer no seguro de pessoas, posto que o que se pretende com o contrato é garantir segurança e tranqüilidade a família em caso de sinistro.
Nesse sentido é o entendimento proferido pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em 11 a 13/09/2002 na Jornada de Direito Civil, em seus enunciados 22 e 23.
Afinal, durante anos lucrou o segurador com o recebimento dos prêmios sem a existência de sinistro, devendo ser-lhe vedada a possibilidade de excluir o segurado caso ocorra um agravamento natural de risco.
A única hipótese justificável seria o agravamento provocado pelo próprio segurado, com o exercício de atividade de risco (prática de esportes radicais, ex.: rapel, páraquedismo, etc.), sendo de sua responsabilidade zelar pela própria saúde, evitando gravames desnecessários. Porém, problemas inerentes da idade avançada, ou da aquisição de moléstias graves, onde não houve a concorrência do segurado, devem ser absorvidos pela Seguradora como risco previsível, (jurisprudência em anexo).
Pelas razões expostas, deve a Seguradora esclarecer, de forma inequívoca, quais são as situações que agravam o risco e devem ser comunicadas pelo segurado, de forma a equilibrar o contrato.
Sugerimos a alteração do caput do artigo 774, bem como a inclusão de um parágrafo único por entendermos que no seguro de pessoas existe o princípio da continuidade e da sucessão do contrato, posto que enquanto houver a vida haverá a necessidade de se segurá-la.
O contrato de seguro de vida objetiva garantir indenização ao segurado e sua família em relação a situações que impeçam a continuidade de atividade laboral, como invalidez permanente e morte.
É relação contratual que deve ser tratada e vista de modo especial. Isso devido à sua importante função social, na medida em que protege não apenas interesse individual do segurado, mas, principalmente, de sua família.
A forma de contratação e a finalidade que se tem o seguro de vida tem uma expectativa de continuidade dos serviços decorrentes do contrato. Essa legítima expectativa possui especial proteção nas relações de consumo, em face do princípio da boa-fé objetiva (arts. 4.º, 6.º, 30, 31, 48, 51, do CDC e art. 765 do Código Civil).
Quem procura um seguro de vida não pensa em realizar o contrato pelo prazo de seus meses ou um ano. Ao contrário, objetiva-se segurança, previsão, estabilidade e, principalmente, manutenção das condições pactuadas por prazo indeterminado: até a ocorrência do sinistro, doença ou morte do contratante. No momento da contratação, o consumidor não é avisado de que a apólice pode, a qualquer momento, ser extinta. Ao contrário, toda a atmosfera conduz ao entendimento no sentido de que o contrato é por prazo indeterminado. Levando em consideração tal característica, entre outras, é que o consumidor realiza a opção em celebrar o negócio.
Ao aderir a um plano de seguro de vida o consumidor tem a expectativa de permanecer vinculado ao plano até a própria morte ou ocorrência de enfermidade que o impeça de continuar trabalhando. Não é à toa que se procuram empresas com solidez econômica e tradição, pois se sabe que a indenização ocorrerá, em regra, após longos anos da data da contratação.
Não é admissível que as Seguradoras possam proceder qualquer alteração unilateral do contrato, inclusive no tocante ao preço (prêmio) a ser pago pelos consumidores, utilizando-se como roupagem a extinção de um contrato e oferecimento de um novo contrato.
Agindo assim, já nítida afronta ao princípio da boa-fé objetiva, norteador, como já ressaltado, das relações de consumo. As cláusulas inseridas nos instrumentos contratuais que violam a expectativa de continuidade do contrato por prazo indeterminado, bem como de impossibilidade de alteração unilateral do contrato são nulas de pleno direito. O artigo 51, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor) é expresso nesse sentido, verbis:
"Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(....)
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
(....)
X – permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;
(.....)
XIII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;
XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;
(....)
§1.º presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que:
I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
§ 2.º A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes."
Embora formalmente o contrato seja por prazo determinado, com previsão de não prorrogação, não é essa a expectativa que se passa ao consumidor no momento da celebração do contrato. Ao contrário, a idéia presente é justamente no sentido de que o seguro de vida terá vigência, nas condições pactuadas, até a ocorrência do sinistro (no caso, morte ou invalidez permanente causada por doença).
Assim, considerando as tratativas pré-contratuais, as legítimas expectativas do consumidor em relação ao contrato de seguro de vida, vedam-se os cancelamentos unilaterais das condições contratuais, bem como a alteração do conteúdo do contrato, principalmente das cláusulas relativas ao prêmio e coberturas previstas. Eventual disposição contratual em sentido contrário não tem qualquer validade jurídica, é nula de pleno direito (art. 51, IV, c/c o respectivo §do CDC).
A propósito, têm pertinência os ensinamentos de Cláudia Lima Marques (in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4ª ed., São Paulo, RT, p. 175-181) referindo-se ao princípio da boa-fé objetiva. Inicialmente, esclarece a renomada doutrinadora que, em face da nova concepção do contrato, delineada pelo CDC e, também, pelo novo Código Civil, a lei passa a proteger os interesses, sociais, valorizando a confiança e expectativas depositadas no vínculo. Em seguida, apresente os elementos delineadores da boa-fé:
"Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação "refletida", uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações:
"DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SEGURO.
Não pode a seguradora modificar unilateralmente cláusula contratual. Inaplicável, por injurídica, modificação posterior de estipulação do contrato de novo manual de instruções que, em verdade, extingue direito contratualmente deferido ao segurado." (APC n.º 2525691/DF, relator o E. Desembargador Jeronymo de Souza. DJU, 24/11/1993)
Nesse sentido, atende-se ainda para os ensinamentos de Arnaldo Rizzardo relativos aos seguros de saúde que, por envolverem aspectos, interesses e expectativas semelhantes ao contrato de seguro de vida, aplicam se analogicamente à presente situação:
"(...) O prazo de vigência da apólice é de doze meses, contados da data de sua emissão, renovável automaticamente, se não houver manifestação expressa em contrário. A seguradora ou o segurado, mediante aviso prévio, ou por escrito de, no mínimo, trinta dias do término de vigência da apólice, poderá deixar de renová-la.
Ora, a prevalecer a faculdade constante nas cláusulas acima, nada impede que se forme o seguinte quadro: o segurado renova ininterruptamente o contrato por vários anos, e quando atingir uma idade de maior fragilidade, ver simplesmente manifestada a recusa, ou ficar surpreendido com a comunicação de não mais interessar a renovação.
[Nesse caso] há incompatibilidade com a boa-fé e a equidade (art. 51, inc. IV, da Lei n.º 8.078, de 1990), visto que o seguro se torna mais necessário no estágio da vida em que se encontra o segurado. Ao mesmo tempo, está ínsita uma autorização para o fornecedor rescindir a apólice (art. 51, inc. XII, do CDC), eis que viabiliza a alteração unilateral." (grifou-se)
Registre-se, ainda, opinião de Arnoldo Wald específica ao aspecto da alteração do percentual de reajuste por faixa etária:
"Outra cláusula que nos aprece abusiva: a que eleva o prêmio em função da idade do segurado, após longos anos de pagamento do prêmio. O segurado ainda jovem contrata o seguro-saúde. Jamais o utiliza. Vinte anos depois, já maduro, começa a frequentar médicos. Deve elevar os prêmios. E os anos que pagou sem precisar? Outro ponto, que já foi objeto de julgamento de ação civil pública: - a elevação unilateral dos prêmios, a tal ponto que a maioria se vê levada a cessar o contrato" (grifou-se)
Ainda em amparo às alterações ora propostas segue o Estatuto do Idoso, Lei n.º 10.741/2003, estabelecendo que:
"Art. 4.º - Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos por ação ou omissão será punido por lei". (grifos nossos).
Art. 15 – É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.
§ 3.º - É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade. (grifamos)
A combater atitudes discriminatórias, inclusive tipificando-as como crime, preceituam os artigos 43, inciso III, e 96, "caput", todos do mesmo Diploma Legal:
"Art. 43 – As medidas de proteção ao idoso são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
III – Em razão de sua condição pessoal".
"Art. 96 – Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transportes, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:
Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa". (grifamos)
Outro aspecto a ser analisado é que no contrato de seguro, a definição do valor do prêmio, envolve cálculos atuariais de modo a garantir a possibilidade de indenização do sinistro, bem como a obtenção de lucro.
As empresas de seguro fixam seus preços com base em cálculos atuariais que considera o valor médio pago pelos segurados da carteira e o tempo médio de pagamento de prêmios mensais, o que ocorre durante muitos anos e até mesmo décadas.
Posto isto, não há que se falar na possibilidade, nem permissibilidade de as Seguradores poderem alterar as condições unilateralmente de um contrato que tem caráter sucessivo, tampouco de rescindi-lo.
Razão pela qual a aplicação do artigo 801 – A do NCC nos contratos de seguro de visa se faz necessária para que, em caso de não recondução automática das apólices, as seguradores não possam alterar as condições anteriormente pactuadas, levando o consumidor a perdas e supressão de direitos anteriormente pactuados.
O presente Projeto de Lei é de iniciativa da Univida Seguro de Pessoas Litda, através de seu departamento jurídico.
Sala das Sessões, em 24 de novembro de 2010.
Arnaldo Faria de Sá
Deputado Federal – São Paulo
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