Saúde
TJ/SP - Seguradora é condenada a reembolsar cliente por gastos com medicamento
De acordo com prescrição médica, a mulher, portadora de tumor nos ovários e útero, precisava tomar o remédio em razão de grave evolução da doença, mesmo após cirurgia. A Lincx alegava que o medicamento não era indicado para o caso, conforme informações da bula, e que, com base no contrato, poderia recusar a cobertura se a prescrição fosse considerada experimental.
Segundo voto do relator da apelação, desembargador Carlos Teixeira Leite, a decisão quanto ao tratamento utilizado cabe ao médico responsável pela paciente. Além disso, o remédio já está registrado na Anvisa e as disposições da bula não podem prevalecer sobre a necessidade ante o estado de saúde. "A indicação médica é suficiente para autorizar esse procedimento, e ainda que assim não fosse, a perícia se mostrou favorável a esse tratamento", afirma Teixeira Leite.
Para a advogada Renata Vilhena Silva, sócia-fundadora do escritório Vilhena Silva Sociedade de Advogados, que atuou no caso em defesa da cliente do plano, decisões como essa colaboram para aceleração da aprovação de medicamentos importados no Brasil, facilitando o tratamento de milhares de pacientes e melhorando a qualidade de vida com mais rapidez.
O julgamento, ocorrido no último dia 10, teve votação unânime e também contou os votos dos desembargadores Fábio Quadros e Natan Zelinschi de Arruda.
Confira abaixo a íntegra da decisão.
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0117856- 10.2008.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é apelante LINCX SERVIÇOS DE SAUDE S C LTDA sendo apelados M.B.P. (INVTE) e H.V.C.P.
ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U. ", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores FÁBIO QUADROS (Presidente) e NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA.
São Paulo, 10 de março de 2011.
Teixeira Leite
RELATOR
PLANO DE SAÚDE. Fornecimento de medicamento recusado pela seguradora, sob o fundamento de ser experimental. Abusividade. Decisão que cabe ao médico responsável pela segurada. Ademais, já registrado na Anvisa. Disposições da bula médica que não podem prevalecer sobre a concreta necessidade ante o estado de saúde da paciente. Honorários reduzidos. Recurso desprovido.
Trata-se de recurso de apelação da r. sentença (fls. 665/670), que sob o argumento do contrato e sua natureza, além da perícia, comprovando a necessidade do remédio, julgou procedente ação cominatória proposta por H.V.C.P. contra Lincx Serviços de Saúde S/C Ltda, condenando-a a reembolsar as despesas com o medicamento Avastin e, ainda, custear a continuidade do tratamento quimioterápico.
A seguradora, inconformada, em suas razões de apelação (fls. 675/694), primeiramente, pede o provimento de seu agravo retido para se reforme decisão que determinou que as partes se manifestassem sobre a prova pericial em alegações finais, porquanto esta encerra a fase probatória daí cerceando o direito de requerer eventual esclarecimento ou complementação do laudo. Por esse motivo, pede a anulação da r. sentença. No mérito, sustenta que o medicamento requerido não é indicado para o caso da apelada, conforme explica a bula. Assim, e com base em cláusula contratual, pode recusar a cobertura se a indicação for considerada off label (experimental). No mais, pede seja a verba honraria reduzida.
Contra-razões às fls. 710/749.
É o relatório.
Sem razão à apelante.
Primeiramente, nega-se provimento ao agravo retido porquanto, além de a perícia se mostrar suficiente para o deslinde da causa, este relator adota o entendimento de que o médico responsável pela paciente é que deve decidir o melhor tratamento a ser seguido. Nesse caso, prosseguir com indagações técnicas seria inócuo.
No caso, o contrato, na modalidade de assistência médica, foi celebrado em 1997, portanto antes da vigência da Lei 9.656/98, razão pela qual não se aplicam suas normas.
Entretanto, deve ser examinado à luz das normas do Código de Defesa do Consumidor, cuja aplicabilidade, hoje, não mais se discute.
A apelada, portadora de tumor nos ovários e útero, após realizar intervenção cirúrgica para retirada destes órgãos constatou grave evolução dessa doença, necessitando se submeter a nova cirurgia e, ainda, à administração do remédio denominado Avastin, tudo, conforme prescrição médica, mas, cujo fornecimento foi recusado pela seguradora, que, assim agiu com fundamento em cláusula contratual que prevê que não serão cobertos os medicamentos experimentais. Nesse sentido, isto transfere o exame desta questão para a legalidade dessa exclusão.
Observe-se que a mera inserção de cláusulas excludentes ou limitativas de cobertura de determinados procedimentos médicos e cirúrgicos nos contratos de plano e seguro saúde, ou, no caso, no estatuto, não deve, por si só, ser considerada prática abusiva, porquanto busca amoldar os serviços oferecidos ao prêmio a ser pago pelo conveniado ou segurado, visando a dar equilíbrio ao contrato.
Nesse compasso, em regra, esta Câmara tende a não reconhecer a abusividade da cláusula contratual que exclui de cobertura ou reembolso algumas despesas, como, por exemplo, próteses externas, porquanto seu custo normalmente é elevado e não se coaduna com a contraprestação paga pelo segurado.
Contudo, esse entendimento não se aplica ao caso, porquanto o médico que acompanha o paciente é que deve decidir qual o melhor tratamento. Assim, não é razoável essa recusa com base nas disposições da bula, porquanto necessário, como salientado, analisar a situação concreta do estado de saúde da segurada.
Portanto, a indicação médica é suficiente para autorizar esse procedimento, e ainda que assim não fosse, a perícia se mostrou favorável a esse tratamento.
É o que explica o Desembargador Ênio Zuliani, que compõe esta 4ª Câmara de Direito Privado em caso semelhante:
"A argüição de que o medicamento é indicado para o tratamento de linfoma não-Hodgkin de células B, conforme informação do fabricante, Laboratório Roche e que não há comprovação de eficácia no caso em tela, não retira a licitude da aplicação do medicamento MABTHERA, visto ser notório que muitos medicamentos, embora indicados para cura de doenças específicas, surtem resultados benéficos dentro de outros campos da medicina e nem por isso se tornam "medicamentos experimentais”, como quer fazer crer a apelante, sendo irrelevante que a ANS não tenha catalogado o medicamento ou o tratamento ministrado ao paciente pelo médico que o assiste." (Apelação Cível nº 482.067-4/6-00). (gn)
No mais e no que concerne à verba honorária, o melhor é reduzi-la, para fixá-la em R$ 2.000,00, com base no artigo 20, §4º do CPC.
Portanto, e por bem decidida a questão, a r. sentença deve ser mantida.
Ante o exposto, voto pelo desprovimento do recurso.
TEIXEIRA LEITE
Relator
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